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Carlos Roberto Liboni

Diretor de Assuntos Internacionais do Ceise-Br

Op-AA-15

Incerteza e timidez inibem a cogeração

Se acaso sobram incertezas no cenário futuro da energia elétrica brasileira, igualmente não faltam dados e estudos que tentam antecipar suas grandes dificuldades. Suas identidades propõem boas reflexões. O CHP - Combined Heat and Power, como é conhecido o similar da nossa cogeração no meio acadêmico americano, foi objeto de um interessante estudo, realizado pela Frost & Sullivan, e estima a cogeração nos EUA, oferecendo 10% da potência gerada no país.

O Reino Unido não fica muito atrás, com 7%, e a Alemanha o supera com 12%. Afirma ainda que são ambiciosos os objetivos para o futuro, na maioria dos países europeus. Isto dá uma dimensão da valorização do tema. Neste report, o Brasil tem uma atenção especial. Talvez, além do brilho próprio do etanol, também pela farta generosidade de dados disponíveis.

Em um segundo estudo, um pout porri de notáveis e contraditórias visões: Greenpeace junta-se ao GEPEA - Grupo de Energia do Departamento de Engenharia Elétrica e Automação da USP, e ao ERECE - European Renewable Energy Council, para se debruçarem nos três cenários que projetam especificamente para a situação brasileira, a partir dos dados do IEA, da ONU e do EPE, órgão ligado ao Ministério de Minas e Energia brasileiro.

Baseados no crescimento populacional, no crescimento do PIB de-mandador da energia e no índice pouco discutido no Brasil, que é o da Intensidade de Energia, ou seja, o quantum de energia consumida por unidade de crescimento de PIB, contraditório entre 0,6 e 1,2 kW/PIB global, o estudo define os três cenários. Com dados-base de 2005, projetam os cenários para 2050.

Um de referência, um de revolução energética e um intermediário. Todos contando em reduzir o Índice de Intensidade de Energia e o Custo da Energia gerada. Estes tesouros são encontrados na internet e vale a pena uma navegada básica. Vou tentar contribuir, sumarizando um pouco das suas identidades, e colocá-los em uma visão mais prática analiticamente.

Todos concordam que a experiência vivida até agora no Brasil é ainda incipiente, tendo em vista o grande potencial desta atividade econômica. Tanto qualitativa, quanto quantitativamente, nossos projetos estão bem aquém do potencial. A maioria deles demonstra uma visão focada na auto-suficiência das plantas de produção de etanol. Pouquíssimas pensam na cogeração como unidade de negócios, de forma substantiva.

Provavelmente, por isto, as unidades já em operação estão, em boa parte, comprometidas com tecnologias e processos ultrapassados, cujos conteúdos comprometem o custo de sua produção. Mais de 60% das unidades tem acima de 20 anos de operação, ainda com caldeiras de baixa pressão e turbinas de baixo rendimento.

O custo para uma atualização ou mesmo para um investimento Green Field, com equipamentos mais adequados, propõe um risco de sumk cost (perdas irremediáveis), em função das incertezas de comercialização que o sistema ainda apresenta, em função de amadorismo de estado, o que parece ser o mais grave dos entraves.

A despeito de todos os esforços governamentais, tipo Proinfa, lei de 2002, o custo de comercialização do excedente não apresenta pay back satisfatório no esforço de gerá-lo, em nenhum dos cenários. Diante de contradições destes estudos, observamos duas conclusões simplistas: a primeira é de que, no futuro, não teremos como escapar desta busca de gerações alternativas, no sentido de reduzir o Índice de Intensidade Energética e o custo da geração oferecida; a segunda conclusão é de que nós, brasileiros, não estamos tratando o assunto com interesse e antecipação suficientes para atender aos requerimentos futuros que ele requer. Podemos ficar para trás.

Nossa contribuição aqui é apenas sugerir alguns pontos que podem ser debatidos em uma reflexão mais ampla, democrática e institucional-mente organizada, quem sabe pela Unica ou CTC, aproveitando aqueles pontos que os estudos já antecipam. Institucionalmente, para vencer a aparente falta de estímulo, citado pela F&S, como overall lack of benefits, o papel é do Estado.

Agendar uma matriz de políticas, que trate da demanda estável, reduzir o custo de comercialização, com a presença maior de consumidores livres. Garantir uma política mais apropriada ao investimento, buscando uma melhor distribuição de resultados ou share benefitscom as concessionárias, torna-se o ponto de partida. A propósito, um bem humorado amigo, usineiro de tradição, disse que energia para usineiro é contrário ao dinheiro do banco: “Se você precisar vai pagar o olho da cara, mas se tiver para vender, o preço é de escada abaixo”.

Pelo empreendedor, também há um grande trabalho a se desenvolver. De forma muito mais profissional do que no passado, e com visão mais unitária de negócios, estimula-se o desenvolvimento de planejamentos estratégicos de longo prazo, para antecipar os cenários. Debruçar no seu balanço energético, avaliar disponibilidade de bagaço e palha a médio e longo prazos, avaliar custo de vapor e KW gerado a partir dos equipamentos instalados e/ou equipamentos novos, mas que assegurem um bom retorno de investimento e um bom cálculo do ponto de equilíbrio, para um pay back, tipicamente, entre três e seis anos.

Enfim, muitas lições de casa, e, mais uma vez, uma feliz identificação entre o setor sucroalcooleiro e as necessidades fundamentais do país. Este processo não pode ser apenas e tão somente observado e passivamente aguardado. Ele requer uma iniciativa de profundidade que possa dar contorno e ritmo a um desenvolvimento planejado e consistente com a matriz energética brasileira do futuro. Mãos à obra. Há muito que fazer.