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Luiz Custódio Cotta Martins

Presidente do Siamig e do Sindaçúcar - Minas Gerais

Op-AA-25

A preparação para um novo ciclo

A safra 2010/11 do setor sucroenergético brasileiro tem tudo para ser uma safra de recuperação. Um fôlego para as empresas, duramente atingidas pela crise financeira de 2008 no meio de um forte ciclo de investimento ocorrido nos anos anteriores. Depois de um período conturbado, o mercado voltou a dar sustentação para o início de um novo período de crescimento.

Contudo, tal decisão virá em outro contexto, diferente daquele que impulsionou o último ciclo, marcado por uma estrutura produtiva mais madura, com um nível de profissionalização grande garantindo um melhor planejamento das decisões. O último ciclo de investimentos deixou alguns traumas e, principalmente, lições para o futuro.

Para entendê-los, voltemos um pouco ao passado, analisando os fundamentos e as consequências que as decisões empresariais provocaram na estrutura produtiva do setor no Brasil durante esse período. Esse ciclo propiciou ao setor mais que dobrar a produção de cana nos últimos 10 anos e foi baseado em três fundamentos:

1. preço do petróleo com a busca de uma opção ao óleo caro;
2. mercado interno de etanol a partir do lançamento e aceitação pelo consumidor dos veículos flex, e
3. preocupação com as mudanças climáticas e a busca de um combustível renovável e limpo.

Com base nesses pilares, todas as usinas do Brasil realizaram algum tipo de expansão. Acreditava-se que o País manteria sua participação no mercado mundial de açúcar, aumentaria fortemente as vendas de etanol no mercado interno e haveria uma forte abertura para o etanol no mercado externo. O setor brasileiro era caracterizado pela forte presença da gestão familiar e uma participação muito tímida do capital estrangeiro. A mudança dessa estrutura deixou um grande trauma para o setor.

Diversas empresas administradas por famílias, muitas delas sendo responsáveis pelo status quo da nossa atual produção, tiveram que vender seus negócios. Os fundos de investimentos que entraram no Brasil com grande apetite, as multinacionais que entraram no setor pagando altos valores pelos ativos, além de outros grupos nacionais que viam no setor uma forma de diversificação de seus investimentos, também foram prejudicados. Para os gloriosos sobreviventes, restaram diversas lições que precisam ser mais discutidas pelas empresas:

1. a necessidade de uma maior profissionalização;
2. a diversificação da produção como redução do risco;
3. necessidade de redução de custos com a maximização da produção e o aumento da eficiência, e
4. aceitar que é preciso preparar a estrutura da empresa para um sócio estratégico.
Baseado nessas lições, o setor caminha para um novo ciclo de investimento.

Os grupos empresariais estão muito mais maduros, cautelosos e com maior disciplina. Planejamento é a palavra de ordem e, para tal, é preciso se ater a alguns pontos importantes no atual ambiente empresarial desse setor. Primeiro, é necessário que o empresário veja a importância da representação institucional valorizando as entidades de classe existentes. Sobre isso, coloco três importantes temas a serem trabalhados nos próximos anos:

1. redução da insegurança jurídica nos temas relacionados à área ambiental (código florestal e burocracia no licenciamento ambiental) e à área trabalhista (terceirização de atividades, ponto eletrônico e trabalho rural);
2. busca de uma maior competitividade econômica do nosso produto, com foco na redução das barreiras tarifárias e dos subsídios em outros países, a unificação das alíquotas de ICMS do etanol em todo o País, privilegiando o combustível renovável em detrimento do combustível fóssil, além do monitoramento das decisões relativas ao preço da gasolina no Brasil, e
3. intensificar as ações institucionais de marketing, conscientizando a população sobre nosso produto renovável, esclarecendo e desmitificando o setor no Brasil e no mundo.

O segundo ponto refere-se à estrutura comercial do etanol no Brasil, que atualmente é perversa com o produtor, pois são mais de 200 grupos econômicos vendendo para poucos compradores. É necessário criar musculatura para negociar e, talvez, um modelo associativo na comercialização dos produtos seja uma maneira de sobreviver nesse mercado.

O terceiro ponto está muito ligado com o segundo. É a logística, que hoje leva boa parte das margens de lucro dos negócios. A produção está cada vez mais distante dos portos e dos grandes centros consumidores. Investir em terminais ferroviários e em estruturas de dutos pode trazer uma importante contribuição para os resultados das empresas.

Em quarto, cito a necessidade fundamental de qualificação dos trabalhadores das usinas no novo contexto do setor automatizado e mecanizado. Por último, não podemos nos esquecer das possibilidades de novos negócios. Em um mundo competitivo, a inovação representa um grande diferencial para as empresas. Diversos players, grandes parceiros estão aparecendo com oportunidades em diversos nichos de mercado, como a alcoolquímica.

O Brasil é o único país do mundo capaz de suprir a necessidade mundial de açúcar; a bioeletricidade virou necessidade para a saúde financeira do negócio, da mesma forma que a diversificação da produção. Com mais de 3 milhões de veículos flex novos por ano, o potencial do mercado interno de etanol é muito grande. Acredito que um novo ciclo está vindo. A crença nos nossos produtos ainda continua, contudo vimos que o caminho é um pouco mais longo do que parecia. Novidades virão, mas não podemos esquecer as lições do passado para um bom planejamento do futuro.