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Marco Antonio Fujihara

Diretor do Instituto Totum de Sustentabilidade

Op-AA-12

A logística do agronegócio e a bioenergia

Do ponto de vista da logística, há duas realidades no país: a da porteira para dentro e a da porteira para fora. A primeira rende muitos frutos, por meio de produtividade e das variedades agrícolas, e tudo isso conseguido à custa de tecnologia para o clima tropical e da ação planejada de organismos do tipo da Embrapa e o Instituto Agronômico de Campinas. A segunda vive em problemas, desde a falta de silos e transporte, até a excessiva tributação.

O agricultor brasileiro é um herói, de muita capacidade empreendedora, e sem paternalismos do Estado. Não há subsídios em nenhum setor da economia agrícola e o crédito é insuficiente. Não existem mecanismos de crédito rural confiáveis, como nos Estados Unidos, onde a oferta de dinheiro para o agricultor é atribuição dos compradores da safra, e com a retaguarda de uma bolsa de mercadorias, integrada pelos próprios produtores.

Por que eles conseguiram um nível de sofisticação tecnológica sem igual em todo o mundo? Qualquer corretor desse centro de negócios é capaz de dizer onde e quando vai chover. Da porteira para fora é um desastre, a começar pelo sistema de comercialização, que está nas mãos de umas três ou quatro empresas. São elas que vão dizer que caminhos os grãos percorrerão.

No capítulo exportação, o país ainda está longe de alcançar um ponto de equilíbrio, principalmente porque não soube ou não pode se capitalizar, e este é um processo que atinge o âmago da cadeia produtiva. Sem capital para financiar a produção, fica impossível agregar maior valor aos itens produzidos. Por que o produtor de soja não produz também o óleo comestível? Simples, sem capital, ele está excluído da cadeia produtiva. Se existe quem transporte e venda, por que se dar ao incômodo?

Aumentar as áreas de cultivo para alcançar safras recordes desemboca em um problema terrível: o da fronteira agrícola. O Brasil de hoje funciona meio como funcionava o velho oeste americano. Alguém que cultiva dois hectares em Santa Catarina consegue 10 mil hectares no Mato Grosso e para lá vai com a idéia fixa de que tem de produzir o máximo que puder.

Dizima árvores e a fauna, sem qualquer sentimento de culpa. Isso é o que se pode chamar de “desincentivo econômico”, como o é também o Código Florestal. Há imagens de satélite do Mato Grosso que atestam os absurdos da fronteira agrícola. E o plantador de soja é culpado? Não, ele é parte do processo de destruição. A responsabilidade fica por conta da falta de uma política pública de ocupação de fronteira agrícola.

Falta ao Brasil uma política agrícola inteligente, capaz de tirar dinheiro do mercado de capitais para aplicar na agricultura, na área florestal ou no plantio de longo prazo. Dinheiro sobra por aí em fundos de investimento. Basta vontade política para tomá-lo e aplicá-lo com competência. O que não há é acesso a esse mercado de capitais.

Quantas empresas agrícolas ou de agronegócio têm capital em Bolsa? Por que o acesso a esses capitais é absolutamente restrito? Os que marcham em direção à fronteira agrícola não se organizam para obter formas alternativas de financiamento. Quando isso acontecer, o país terá dado um grande salto.

O agronegócio brasileiro tem também a vertente de ser um grande produtor de bioenergia: Na histeria de sustentabilidade, também se inserem os programas de exportação brasileira, como o do álcool por exemplo, que pode vir a ser um enorme sucesso, se conseguimos garantir as condições mínimas de contratos de longo prazo.

O álcool é uma fonte energética tipicamente nacional. O melhor para o país é criar sustentabilidade por meio da estruturação dos produtores, garantindo que a produção seja mantida em nível satisfatório, mesmo com eventuais altas na cotação do açúcar. O cenário de hoje não é o mesmo dos tempos do Proálcool, quando havia concorrência e o governo garantia alta rentabilidade.

O boom do álcool fez com que as melhores terras do Estado de São Paulo fossem destinadas à cultura da cana-de-açúcar. Na atualidade, o que vale é criar sustentabilidade, ao mesmo tempo em que se eliminam os trabalhos pouco dignos e os efeitos nocivos para o meio ambiente. O modelo brasileiro de exportação de produtos agrícolas utiliza recursos naturais para gerar divisas, à custa da sustentabilidade.

E sem limites, porque se trata de um modelo onde não há auto-regulamentação. O ideal seria um modelo onde a venda de um produto para o mercado japonês, por exemplo, pudesse gerar uma receita que retornasse ao Brasil por meio de um fundo de investimento, que seria aplicado em programas nacionais de desenvolvimento, caracterizando um círculo virtuoso.

O agronegócio está atravessando dilemas importantes para a construção de seu futuro. A realidade dos transgênicos está definitivamente posta na mesa de discussão e não vai desaparecer por um passe de mágica. Traz à lembrança o início do século, com o advento do trator. Os agricultores da época demoraram em perceber o quanto aquele implemento era superior aos seus arados, puxados a burro. A ciência ainda não tem uma resposta clara e objetiva, sobre malefícios ou benefícios dos transgênicos.

A única coisa certa é que eles são irreversíveis, a despeito da passionalidade de quem se coloca a favor ou contra a manipulação genética. Manipular um grão é muito diferente de manipular genes humanos, de brincar de Deus. Com os grãos, a preocupação é com os efeitos colaterais para os humanos; com os genes humanos, é a moralidade que está em jogo.