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Marcelo Mancini Stella

Vice-presidente Comercial, Logística e Energia da Atvos

Op-AA-62

Perguntas atuais para futuras decisões de negócios
Por ser uma indústria secular, o setor sucroenergético tem o privilégio e o desafio de ter passado por transformações significativas em todos os três níveis que estruturam seu sistema agroindustrial – o cultivo dos canaviais; a produção de açúcar, etanol e energia e a comercialização desses produtos. O contexto atual aponta perspectivas concretas de novas rupturas em decorrência de uma agenda mundial em torno da mobilidade e dos combustíveis.

A mecanização reduziu o trabalho manual e trouxe ganhos sociais e produtivos inquestionáveis. Testemunhamos a extinção das queimadas, que reduziu os impactos ambientais. A transição de um modelo econômico linear para uma economia circular movimentou políticas públicas, linhas de financiamento e até mesmo redirecionou o modelo de negócio. Redução, reutilização, recuperação e reciclagem de materiais e energia definiram os indicadores que são acompanhados atualmente pelas empresas e promoveram a competitividade de forma sustentável no setor e em toda a cadeia produtiva. 
 
Presenciamos diversos ciclos de crescimento da produção do etanol, com o aumento da demanda e a sua importância no mercado nacional e internacional, diretamente relacionado à necessidade de substituição do petróleo e maior adesão aos biocombustíveis. A primeira fase de crescimento se deu a partir de 1975, com o início do Proálcool e a adoção da mistura de etanol anidro à gasolina, expandindo-se fortemente com o lançamento de veículos movidos exclusivamente a etanol hidratado a partir de 1979. Em 2003, inicia-se uma segunda fase, que coloca o Brasil na vanguarda mundial do uso de biocombustíveis, com a chegada dos veículos flex-fuel.  
 
O crescimento da demanda de combustíveis renováveis no Brasil e no mundo vem sendo cada vez mais influenciado pelas determinações de redução de emissão de gases de efeito estufa. O Protocolo de Kyoto, em 1997, e o Acordo de Paris, em 2015, são marcos que influenciaram globalmente novas regulamentações. Tais compromissos continuarão a impulsionar os países a buscar alternativas para a construção de uma matriz de combustível mais limpa, representando uma oportunidade de abertura de novos mercados para o setor sucroenergético. 
 
No mercado interno, a estruturação bem-sucedida do RenovaBio será determinante para o fortalecimento e a expansão do setor ao incentivar a produção e o uso de biocombustíveis, promovendo a descarbonização do transporte. Ao atingirmos os patamares de produtividade, sustentabilidade e competitividade projetados, assistiremos à expansão da utilização de etanol para além do equivalente ao cumprimento das metas compulsórias.

Comercialmente, o setor também foi marcado por ciclos. O primeiro, com a entrada de novos atores estrangeiros e brasileiros. Depois, com a geração de energia a partir do bagaço de cana. Hoje, há a utilização de digital e Big Data. Além da redução de custos, ganho de eficiência, maior controle das emissões de gases de efeitos estufa, as decisões comerciais também serão impactadas positivamente. 

O comportamento dos preços do etanol e açúcar é influenciado pela oferta e demanda local e global, além da qualidade, clima, política cambial, pragas, solo, doenças, logística e dezenas de outros fatores. São elementos com centenas de combinações possíveis, o que ilustra a complexidade na precificação do setor sucroenergético. Com análises feitas a partir de um banco de informações integrado e estruturado, seja intra ou interprodutores, teremos um novo aliado para definir estratégias de mercado, dar respostas mais rápidas para adequar o planejamento logístico e para definir o mix de produtos. 

Nos próximos anos, teremos uma exigência crescente por um combustível ainda mais neutro, com processos e produtos mais sustentáveis de ponta a ponta. Isso significa identificar soluções em toda a cadeia, inclusive no escoamento da produção, ampliando a utilização de modais de menor emissão. A substituição do diesel no ciclo de produção de cana e na distribuição dos produtos continua sendo uma das oportunidades para reduzir a pegada de carbono no ciclo do etanol. A resposta está no próprio processo, com o uso de biometano produzido a partir da biodigestão de vinhaça. O modelo de produção a partir da cana-de-açúcar possibilita identificar saídas dentro de sua própria estrutura. 
 
Temos que trabalhar com um cenário longínquo, mas não improvável, da extinção de emissão de gases poluentes e de efeito estufa decorrente da mobilidade humana. Mais ainda, com a premissa de que as soluções deverão passar por combustíveis renováveis. O etanol apresenta-se naturalmente como protagonista nessa trama, o que posiciona o Brasil como um candidato à liderança dessa revolução.

Em um cenário em que há prevalência de veículos com motores de combustão interna, teremos o aumento de participação do etanol na mistura de gasolina. Por ser uma estratégia exequível, relativamente simples de ser implementada e com resultados imediatos, pode ser uma opção, ainda que transitória, para regiões que caminham para a eletrificação da frota. 

Há outro quadro que se mostra promissor com o lançamento de modelos híbridos movidos por motor elétrico e abastecidos com etanol, apresentados como os “carros mais limpos do mundo” por utilizarem somente recursos renováveis. Em locais onde não há fonte limpa de geração de energia para alimentar os veículos elétricos ou onde não há infraestrutura adequada para o carregamento de baterias, esta é uma alternativa efetiva em relação aos veículos puramente elétricos.

Em um terceiro contexto, que representa o grande salto para o setor, está a utilização do etanol como fonte de hidrogênio para alimentar células a combustível. Os veículos elétricos com células a combustível têm baixíssimo impacto ambiental, sem emissão de material particulado e tendo como subproduto apenas vapor d’água. Já em estágio de desenvolvimento em várias montadoras, a propulsão por células de combustível permite que a bateria do carro elétrico seja substituída pelo tanque de etanol. 

De fato, a reinvenção de um setor, muitas vezes, não significa apenas a necessidade de se modernizar, mas de sobreviver. Inclusive para uma indústria consolidada, é fundamental buscar hoje respostas para perguntas sobre desafios que nem mesmo se concretizaram e soluções para obstáculos futuros. Como será a utilização dos biocombustíveis e da bioenergia? Que mercados prevalecerão? Como tornar os produtos e a cadeia produtiva integralmente sustentáveis? O etanol se tornará uma commodity global?