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Carlos Eduardo de Siqueira Cavalcanti

Chefe do Departamento de Biocombustíveis do BNDES

Op-AA-29

Uma agenda de desafios e oportunidades

Ainda sem podermos afirmar que todos os efeitos da crise de 2008 foram devidamente superados, o setor sucroenergético tenta ensaiar, de forma tímida, uma retomada de crescimento. Na região Centro-Sul, responsável por mais de 90% da produção nacional, a moagem nos últimos três anos avançou a um ritmo anual de 3%, bem modesto se comparado aos 10% anuais do período 2003-08 e incapaz de gerar uma produção adicional de etanol que atenda, de forma confortável, o nível de crescimento “chinês” da frota flex nacional.

Observando-se as cartas-consultas e aprovações mais recentes na carteira do Bndes, os projetos indicam uma tendência de investimento superior à média histórica em cogeração de energia, fato que pode ser explicado pela busca das empresas por receitas mais estáveis neste período pós-crise.

Outro aspecto é que os contratos de longo prazo de venda de energia, normalmente sob o mercado regulado, acabam compondo parcela substancial das garantias que irão viabilizar novos financiamentos. Analisado sob a ótica de desembolsos do banco para o setor, o ano de 2010 mostrou-se excepcional, com um desembolso total que alcançou o nível recorde de R$ 7,6 bilhões, mostrando, uma vez mais, a capacidade de resposta dessa indústria.

Contribuiu decisivamente para esse desempenho a manutenção das linhas do PSI - Programa Bndes de Sustentação do Investimento para Bens de Capital, em condições competitivas ao longo de todo o ano, que proporcionaram investimentos em modernização industrial e agrícola.

Tirando um pouco o olho do retrovisor e olhando um pouco mais à frente, em ação que é própria de um banco de desenvolvimento, podemos afirmar que a agenda do Bndes para o setor, ao longo dos próximos anos, está pautada por alguns elementos fundamentais, a saber:

1. a necessidade de expansão da capacidade produtiva, sobretudo com a produção de etanol;
2. o apoio a sistemas logísticos que permitam o adequado escoamento da produção para os centros consumidores;
3. o fortalecimento da cadeia de fornecedores de equipamentos; e
4. o apoio à inovação tecnológica. O primeiro tema, relacionado ao investimento em expansão da capacidade industrial, foi e continuará sendo o carro-chefe de nossas atividades, haja vista a necessidade de garantir o abastecimento adequado da frota de veículos flex, que se mantém em seu ritmo de crescimento.

Embora ainda não se tenha clareza de quando se dará a retomada de investimentos, sobretudo em projetos greenfield, dois fatores poderão contribuir para uma tomada de decisão mais rápida pelas empresas:

1. o esgotamento do ciclo de aquisições pós-crise, no qual tivemos a troca de controle em um volume superior a 150 milhões de toneladas (ou 25% da capacidade total de moagem); e
2. a discussão do pacote fiscal norte-americano, com a provável queda do chamado VEETC (Volumetric Ethanol Excise Tax Credit), conjunto de tarifas e subsídios que favorecem o etanol de milho produzido nos EUA em detrimento do etanol brasileiro.

No apoio à logística, o banco, além de financiar algumas iniciativas de empresas do setor orientadas para o desenvolvimento de sistemas de transportes nos modais hidroviário e ferroviário, além de melhorias em infraestrutura portuária, está financiando a Logum na implantação do alcoolduto – com a primeira etapa em curso.

Trata-se de projeto emblemático para o Brasil, pois, além de permitir a colocação do etanol a custos competitivos nos principais centros, reduzirá a emissão de carbono com o desuso de parte relevante da frota de veículos pesados que consomem diesel.

Com relação ao setor de bens de capital sob encomenda, comumente apoiado pelo Bndes, existe uma clareza de entendimento de que as empresas, a exemplo das usinas, saíram muito fragilizadas da crise.

Contudo, diferentemente das usinas, nas quais houve forte movimento de consolidação com migração de controle, e consequente capitalização, as empresas do setor permanecem em situação delicada, sendo extremamente importante que elas busquem uma reestruturação antes de uma eventual retomada de investimentos do setor sucroenergético.

Ressalte-se que, do desembolso total do Bndes para o setor no ano passado, cerca de R$ 4 bilhões foram aplicados no âmbito do PSI – Bens de Capital.

Por fim, cabe destacar a ação que o Bndes tem feito para apoiar os esforços inovadores. Juntamente com a Finep, lançamos, em março deste ano, o Plano Conjunto de Apoio à Inovação Tecnológica Industrial dos Setores Sucroenergético e Sucroquímico - PAISS, que conta com recursos de R$ 1 bilhão e, baseado nas novas tecnologias industriais voltadas para o processamento da biomassa derivada da cana, atua sobre três linhas temáticas: o etanol de segunda geração, os novos produtos derivados de cana-de-açúcar a partir de rotas biotecnológicas e a rota termoquímica da gaseificação.

Muitas dessas novas tecnologias já deverão alcançar escala competitiva no curso dessa década. O Bndes tem trabalhado de forma proativa com o setor sucroenergético, tendo, inclusive, realçado esse papel no contexto da crise de 2008, ratificando o seu compromisso e visão de longo prazo. Atuando de forma a superar os desafios então enumerados, creio que estaremos contribuindo para o fortalecimento dessa indústria tão virtuosa e estratégica para o País.