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Maurílio Biagi Filho

Presidente da Maubisa

Op-AA-29

Bom Dia, Etanol

Do ponto de vista mercadológico, o atual momento do etanol não podia ser melhor. Primeiro, porque a demanda interna é maior do que a capacidade de produção da agroindústria canavieira, o que mantém estáveis os preços. Segundo, porque, no front internacional, são claros os sinais de que o mercado vai se abrir para o nosso combustível alternativo.

Entretanto, não cabe comemorar, pois nem tudo se resume ao sucesso comercial. Politicamente, por exemplo, o momento é bastante negativo. O preço elevado dos derivados da cana gera alguma pressão inflacionária numa hora difícil. E, quanto à abertura externa, o lado ruim é que não temos produção para atender a esse fantástico novo mercado.   

Diante de tudo isso, alguém poderá perguntar de que adiantou o setor sucroalcooleiro ter crescido continuamente ao longo dos últimos trinta anos. Poderíamos argumentar que  contribuímos para aliviar a crise do abastecimento de combustíveis, já que, hoje, a lavoura canavieira responde por 16% da matriz energética brasileira, oito vezes mais do que na época da criação do Proálcool, em 1975.   

No entanto, ainda que seja positivo o balanço da nossa evolução, precisamos olhar para a frente e reconhecer que a única forma de sair do impasse atual é investir no aumento da produção, como aconteceu ao longo da última década, quando a expansão da cadeia do etanol superou o crescimento de quaisquer outros ramos da agricultura.

Foi um sucesso tão extraordinário, que se tornou interessante para o Brasil colocar o etanol na vitrine como uma prova da nossa capacidade de oferecer soluções contra as crises ambiental e energética. Na maior parte dos seus oito anos de governo, o presidente Lula usou o glamour do etanol em favor da imagem brasileira no exterior. Foi bom para todos, mas o clima mudou.  

Embalado na onda de grandes investimentos em expansão agrícola e industrial, o setor saiu exaurido da crise financeira de 2008, tanto que muitas usinas mudaram de mãos, passando ao controle de grupos multinacionais. Chegamos a um momento rico, em que o setor desfruta de estabilidade produtiva, mas não dispõe de recursos para dar o salto que interessa ao País.  

Uma das sequelas da crise é que, tanto na opinião pública como dentro do governo, sedimentou-se o conceito de que o setor sucroenergético não merece receber tratamento diferenciado porque não é confiável. Não cabe discutir se essa visão é justa ou razoável; queiramos ou não, a imagem não é favorável.   

Reconheçamos, o problema é antigo. Mais de 50 anos depois, ainda hoje colhemos os frutos da nossa soberba. Por conta de dissidências não resolvidas, até hoje muitos membros da agroindústria canavieira cultivam sentimentos de desconfiança mútua, o que resulta no quadro de baixa representatividade que nos caracteriza.

A fragmentação da liderança é uma das marcas do setor sucroenergético. Embora seja uma entidade moderna, bem dirigida por Marcos Jank, a Unica - União da Indústria Canavieira, conta com um baixo índice de adesão dos empresários do ramo.

Infelizmente, a disputa de egos impede que uma única pessoa seja reconhecida como a voz de um setor cuja maior contradição interna é, paradoxalmente, decidir o que fazer com o caldo de cana – se mais açúcar ou mais etanol. Mais lamentável ainda é o caso do CTC - Centro de Tecnologia Canavieira, um primor técnico mantido por poucos para o desfrute de todos.   

Desde 2008, nós sabíamos que não teríamos etanol para sustentar a dupla demanda interna e externa, mas não resistimos à aposta do presidente Lula de que teríamos cacife para disputar simultaneamente o campeonato nacional e a copa mundial dos combustíveis renováveis. Pior, cometemos o equívoco de dar mais atenção a Washington do que a Brasília.

Se foi imprudência, ingenuidade ou irresponsabilidade, não importa; o importante é que precisamos adotar uma postura menos imediatista. Pés no chão, cabeça fria, vistas para o longo prazo: para sair da atual sinuca, o setor precisa de recursos de longo prazo, com taxas adequadas para sustentar investimentos típicos de infraestrutura.

A saída não é setorial, mas global. Há aí um problema de política energética que há muito tempo devia ter sido equacionado. É que o “tabelamento” do preço da gasolina limita o etanol. Em nome do futuro, seria bom que a relação etanol-gasolina fosse resolvida o quanto antes.

Se quisermos garantir o futuro da biomassa como fonte de combustíveis, precisamos não só aumentar a produção, mas também montar parcerias empresariais e fazer acordos com outros países, tomando cuidado para avaliar corretamente as oportunidades existentes, pois o mercado internacional de commodities agrícolas está sujeito a grandes distorções.