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Luiz Gustavo Junqueira Figueiredo

Presidente da Câmara Consultiva do Açúcar e Etanol na BM&F-Bovespa

Op-AA-20

A consolidação veio para ficar

Os últimos meses têm sido dramáticos para a economia mundial, e os desdobramentos da crise de crédito afetaram em cheio o setor sucroalcooleiro, muito dependente de capital de giro e sensível às cotações do petróleo e do açúcar, commodities com elevado grau de volatilidade.

Muitas empresas não previram que os investimentos em expansão poderiam demorar a gerar resultados e vários erros foram cometidos, como a contratação de executivos a peso de ouro, alavancagem com derivativos cambiais, estrutura inadequada de capital próprio versus capital de terceiros, ausência de política de hedge de longo prazo e, principalmente, excesso de confiança no crescimento do mercado externo de etanol.

Os anos onde as exportações tiveram boa demanda e altos preços, ocorreram graças à substituição do MTBE, nos Estados Unidos, em 2006, e à quebra de safra de milho, em 2008, o que levantou as cotações do etanol. Em anos sem interferências climáticas ou políticas, o mercado externo mostrou-se pouco atraente, causando um efeito perverso no mercado doméstico, que se vê obrigado a se desvalorizar, até que a paridade entre os dois mercados restabeleça-se.

Uma simulação de dívida líquida versus custo da mesma ilustra bem a situação vivida pela maior parte do setor. Um nível de endividamento, onde o serviço da dívida é maior do que a margem operacional, resulta em aumento do endividamento. Combinação que deve ser evitada pelas usinas. Supondo um custo médio de captação de 12% ao ano e uma dívida líquida de caixa e estoques de R$ 100/ton de cana moída, concluímos que a margem deve ser de, pelo menos, R$ 12/ton de cana/ano, para evitar um aumento da dívida.

Historicamente, as margens operacionais situam-se em um intervalo entre R$ 10 e R$ 20/ton de cana processada. Para uma usina dever mais de R$ 100/ton de cana e diminuir o endividamento no longo prazo, ou as margens históricas devem aumentar significativamente por um longo período, ou não resta outra alternativa senão capitalizar a empresa. Esta capitalização pode se dar por novos recursos dos atuais sócios ou pela venda de parte da empresa a terceiros.

Com o mercado acionário ainda na defensiva em relação a novas aberturas de capital, resta às empresas a opção de se capitalizar através de fusões com grupos mais sólidos, como o ocorrido recentemente entre Nova América e Cosan, ou, em casos extremos, a venda da usina. Felizmente, o setor é visto com bons olhos por investidores que desejam adquirir ativos viáveis, com boa escala e localização adequada.

Para estas empresas, o momento de entrar no setor é muito propício, já que o custo de aquisição de uma unidade existente é, atualmente, menor do que o de um greenfield, além das vantagens de se gerar receita imediatamente e de não haver necessidade de se formar um corpo técnico para tocar o negócio. Esta situação levará a um cancelamento/adiamento de novos projetos e, por sua vez, à uma situação de oferta e demanda futura mais construtiva, dando tranquilidade aos investidores de que as margens permanecerão atraentes no curto e médio prazos.

Com o cenário futuro indicando melhores margens, muitas usinas estão adiando decisões de recapitalização, pois o negócio tende a valorizar-se. Este impasse acaba chegando ao elo mais fraco da cadeia, que são os fornecedores de cana: muitos não estão sendo pagos em dia, o que vai comprometer o trato do canavial e gerar queda de produtividade, já no ciclo 2009/2010.

A situação é mais complexa do que parece e deveremos passar por uma forte consolidação do setor nos próximos anos. Unidades que hoje estão financeiramente fragilizadas podem até vir a reestruturar-se sem novas alianças, mas a confiança vai levar anos para ser restabelecida. Grupos em dificuldades não serão os primeiros a receberem recursos, quando o setor estiver saneado.

Os bancos darão prioridade aos clientes que lidaram bem com a crise, através de novas linhas de crédito ou do diferencial de custo das captações, que serão bem mais baixas para os times da “primeira divisão” do setor. Isto fatalmente levará a uma concentração ainda maior, pois apenas alguns poucos grupos irão receber recursos a custos mais competitivos.

A qualidade do management das empresas terá um peso maior na concessão de crédito, mudando o grau de risco das usinas perante os analistas de crédito. Concluímos que a consolidação veio para ficar, e com ela a necessidade de maior profissionalização do setor, e, certamente, que o excesso de alavancagem financeira, aliado a um otimismo mercadológico exagerado, foram os maiores erros cometidos pelos seus gestores, em toda sua história.