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Eduardo Pereira de Carvalho

Diretor da Expressão

Op-AA-25

Da euforia à ressaca

Ufa! Passou a tempestade! Os últimos anos confirmaram, mais uma vez, que o setor sucroalcooleiro (ou, como querem os moderninhos, sucroenergético) não é para qualquer um, salvo os mais fortes. Enorme volatilidade. Quedas vertiginosas. Subidas aceleradas. Emoções à flor da pele. Tudo começa, nesta década, com a descoberta de um novo mercado para o nosso etanol: os carros flex.

E, por causa do fantástico crescimento dessa nova frota de veículos, surge novo ciclo de expansão da indústria. Números para espantar qualquer um: mais de 80 projetos efetivamente implementados, novinhos em folha, de gigantescas dimensões. Qualquer número abaixo de 3 ou 4 milhões de toneladas anuais de cana esmagada era (ou é) considerado fraco.

Dos 60 ou 70 dólares de investimento inicialmente projetados por tonelada de cana moída aos 100 a 120 efetivamente gastos. De certo desprezo pelo velho açúcar ao brilho da nova energia, agora enriquecida pelo novo paradigma da cogeração. Como pagar a conta, dada a conhecida escassez de recursos próprios dos usineiros tradicionais?

Aparece o sistema financeiro, cheio de liquidez, ávido por emprestar recursos: bancos, tradings, fundos de variadas nomenclaturas, todos fortemente engajados no financiamento desse processo. Como não há bem que sempre dure, veio o setembro negro, com a maior tromba de água fria jamais vista desde os anos 1930. Percorremos, em curto espaço de tempo, a estrada da plena euforia à mais completa ressaca.

Haja cabeça inchada! Muitas lições apreendidas. Muitas, ainda, a apreender. Milhares de páginas a serem escritas para descrever esse penoso processo. Qual o balanço, fora as quebras já contabilizadas? Como também não há mal que nunca acabe, o açúcar veio, mais uma vez, demonstrar sua pujança, ao lado da continuada expansão do mercado interno de etanol.

Isso tudo com um ambiente regulatório ainda incerto para a cogeração, especialmente nos retrofits, sem falar da inexistência de mercados externos firmes para etanol combustível; do brutal crescimento dos custos de investimento e produção; da extraordinária  apreciação cambial; das difíceis reestruturações financeiras.

Com isso (ou apesar disso..., como queiram) assistimos a um dos mais rápidos, violentos e consistentes processos de consolidação setorial até hoje vistos no país, em uma indústria até ontem das mais pulverizadas, tradicionais e familiares. Hoje, difícil não reagirmos com certa ironia às perspectivas otimistas de curto e médio prazo. Não há como escapar dos prognósticos de falta de produtos.

No mercado açucareiro, apesar do aumento na próxima safra indiana, o Brasil não será capaz de colocar toda a quantidade necessária para atender a demanda. As reformas  do setor açucareiro na União Europeia, previstas para 2013, trarão mais uma forte redução de sua produção.

Os rumores – tidos como certos por especialistas no setor – do inicio de processo de desregulamentação dessa indústria na Índia trará, igualmente, forte impacto negativo na disponibilidade de cana, pela retirada (ou diminuição) dos preços de sustentação, quer federais, quer estaduais. Na ausência de novos projetos no Brasil, fora aqueles poucos em processo de implantação, difícil escapar das perspectivas bullish para o produto.

No etanol, assistimos a situação inusitada: aumento de preços no mercado interno em pleno pico de safra. Tais preços, no entanto, estão a reduzir, de forma significativa, a proporção de carros flex que estão efetivamente consumindo o produto: talvez não mais do que uns sessenta por cento. Lembramos que as exportações de etanol, neste ano, estão extremamente baixas, perto dos 1,5 milhão de metros cúbicos, sem nenhuma esperança de retomada no curto prazo.

Claras as mudanças na atuação comercial que a recente consolidação criou. Não podemos esquecer, todavia, que os preços internos de gasolina estão em patamares bastante altos, quando comparados com os internacionais, o que nos dá, no momento, excelente guarda-chuva para o etanol. Quando é que voltaremos a novo ciclo de expansão? 

Há, em primeiro lugar, necessidade fundamental em reduzir nossos custos. Num cenário de 120 ou 140 dólares a tonelada de cana moída anualmente como parâmetro para os novos investimentos, os preços de açúcar e álcool necessários para viabilizar tais projetos são sonho de uma noite de verão. Nossos custos de produção perderam igualmente grande parte da propagada vantagem competitiva que tínhamos no passado.

Mas o problema é mais grave: passamos a acreditar no nosso próprio discurso de que a expansão da produção das duas commodities só pode se dar no Brasil. Isso não é verdade: os norte-americanos produzem hoje o dobro de nossa produção de etanol, a custos mais baratos que os nossos. Os indianos podem expandir sua produção de açúcar a preços menores que aqueles necessários para viabilizarmos nossas expansões. E, no mundo competitivo das commodities, há uma só grande verdade quanto ao processo de formação de preços: eles tendem a se igualar aos custos marginais de sua produção. E agora, José?

No passado – e falo das décadas de 1970 e 1980 –, apenas um enorme esforço conjunto, do governo e do setor produtivo foi capaz de modernizar e tornar competitivo nosso parque produtor. E o nome do jogo foi tecnologia. Estamos fazendo muito pouco, mas muito pouco mesmo, nesse sentido. Mas sabemos quanto está se fazendo lá fora. Oxalá exista tempo ainda para nos recuperar e readquirir nossa liderança e competitividade!