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Conny Maria de Wit

Diretora Comercial da SBW do Brasil

Op-AA-41

Qual é o estado da arte da cana?

Nem sempre uma missão fácil, alguns setores são mais arrojados na adoção de novas tecnologias do que outros, e acredito que a fruticultura, em grande parte formada por empresas familiares, seja a menos tecnificada e menos aberta a novas tecnologias; a floricultura ornamental, por sua vez, é seguramente dos setores com os quais mantenho contato com a mais moderna e atualizada em termos de adoção de novas tecnologias de produção.

O setor sucroalcooleiro, por sua vez, acredito que por motivos culturais, ao longo desses anos, tem se mostrado bastante resistente à adoção de novas tecnologias de produção. Felizmente, nos últimos dois anos, venho notando um despertar do setor com relação à busca de tecnologias de produção que assegurem mudas mais sadias e campos mais produtivos.  

Quando a micropropagação de mudas de cana-de-açúcar em laboratório começou a ser desenvolvida na década de 1970, a falta de conhecimento da técnica e de seus limites acabou gerando muitos problemas de variação somaclonal, mas, com o domínio da técnica, podemos dizer que a propagação em laboratório de mudas de cana-de-açúcar, atualmente, é bastante eficiente e segura.

Algumas pessoas me questionam se as mudas de meristema têm potencial para substituir os plantios comerciais, mas, a meu ver, dois aspectos inviabilizam essa possibilidade. Primeiro, são os custos de produção: embora os investimentos em novas tecnologias os tenham reduzido, o valor unitário das mudas ainda é alto, o que inviabiliza uma aplicação em larga escala.

O segundo ponto é com relação às características dessas plantas no primeiro corte: embora a produção por meristema gere mudas mais sadias e com alta produtividade de gemas, o calibre dessas plantas, no primeiro ano, acaba não propiciando uma produtividade satisfatória para um processamento industrial, o que torna menos interessante o plantio desse tipo de mudas para fins comerciais.

Outra tecnologia de micropropagação que vem chamando a atenção de especialistas é a embriogênese somática, ou seja, a produção de mudas por meio de embriões somáticos. Uma vez formados, esses embriões podem ser encapsulados, formando sementes artificiais, e estas podem ser transportadas ao campo e plantadas da mesma forma que outras sementes, simplificando e barateando muito o processo.

Porém ainda é cedo para quaisquer conclusões: essas mudas ainda necessitam ser testadas a campo quanto à qualidade, à produtividade e à estabilidade genética. Além disso, neste momento, o que sabemos é que os custos de produção das sementes artificiais ainda é bastante elevado, portanto a tecnologia necessita ganhar escala para que possamos avaliar sua real viabilidade econômica.

Na prática, o que vem ganhando mais espaço é a muda pré-brotada (MPB), que, a meu ver, tem grande potencial para substituir boa parte dos plantios de material básico de que necessitamos para limpar os canaviais existentes. Pode-se dizer que esse modelo é uma cópia do atualmente aplicado no setor florestal: inicia-se com o estabelecimento de um matrizeiro (jardim clonal) de mudas oriundas de meristema, rejuvenescidas e certificadamente livres de doenças, e, a partir dessas matrizes, por um período de 2 a 3 anos, extrai-se o máximo de gemas possível para a produção de mudas a serem utilizadas na implementação de campos comerciais.

Extraindo-se aprendizado de outros setores, podemos tirar algumas conclusões úteis de por que investir em técnicas de propagação rápida das novas variedades que também assegurem a produção de mudas sadias:

• Introduzir mais rapidamente as novas variedades: sabemos que o melhoramento varietal responde por um incremento de cerca de 1,5% ao ano em produtividade, portanto, se a produção atual é de cerca de 80 toneladas por hectare, isso representa um incremento anual de no mínimo 1,2 ton/ha;
• A limpeza fitossanitária dos campos reduz custos com agrotóxicos e defensivos. Com base nas observações feitas em outros setores, sabemos que o incremento em produtividade pode chegar a 30%. Digamos que os ganhos no setor sucroalcooleiro sejam mais modestos, algo em torno de 10%, já representa cerca de 8 ton/ha;
• Outra vantagem inegável nesse sistema é o plantio com um adensamento muito mais exato, com espaçamento ideal entre mudas, permitindo que as plantas se desenvolvam com menos competição entre si e, dessa forma, gerem maior produtividade;
• Além de, claro, todas as outras economias que esse sistema propicia, como economia de área destinada a viveiro de mudas, redução de mais de um ano no processo de multiplicação, custos logísticos de transporte de mudas muito inferiores, entre outros.

Ou seja, vantagens não faltam, portanto a pergunta que persiste para a grande maioria é: como viabilizar a produção e o plantio dos milhões de mudas que serão necessárias para suprir a demanda das usinas, assegurando baixo uso de mão de obra e baixos custos de produção? A resposta para essa pergunta, seguramente, está nos desenvolvimentos tecnológicos já feitos em outros setores, pois estes poderão auxiliar em muito a implementação rápida dessa técnica no setor sucroalcooleiro.

Produzir 5 milhões de mudas por ano com apenas 7 funcionários? Sim, já existem tecnologias disponíveis hoje para viabilizar uma produção anual de mais de cinco milhões de mudas MPB em uma estufa altamente automatizada, com apenas 7 funcionários. Com menos automação, essa produção também é possível, mas serão necessários 20 funcionários, o que eleva significativamente os custos operacionais.

A automação das diversas etapas de produção é a única resposta para se conseguir assegurar uma produção em larga escala pelos custos que o setor está buscando. Além disso, se a produção for feita pelas próprias empresas, os custos poderão ser ainda menores, pois viabiliza ganhos em termos logísticos e flexibilidade operacional na produção e no plantio.

Pontos importantes que as empresas terão que levar em consideração:

• É essencial implementar campos de matrizes de meristema certificadas. Cada 1 hectare gera, no mínimo, 25 hectares de MPB, e esse matrizeiro pode ser utilizado por 2 a 3 anos como fonte de gemas limpas e sadias;
• A coleta das gemas ainda é um dos principais gargalos desse processo; já dispomos de equipamentos semiautomatizados, mas, em breve, será feita de forma totalmente automatizada, no próprio campo;
• Já existem máquinas que permitem que essas gemas coletadas sejam plantadas nas bandejas de forma automatizada, e, utilizando-se as bandejas adequadas, é possível automatizar várias outras etapas, como preenchimento de substrato nas bandejas; logística dentro da estufa de produção, na etapa de germinação até a fase de envio das mudas ao plantio;
• As estufas equipadas com sistemas automáticos de irrigação e adubação e, no caso, das mudas de cana-de-açúcar, inclusive um sistema automático de poda semanal, já são uma realidade;
• Para o plantio a campo, inclusive, já existem máquinas que permitem o plantio automatizado dessas mudas.

Em resumo, com base nas tecnologias existentes e disponíveis no mercado, com pequenas adaptações, é possível incorporar essa
tecnologia no processo produtivo das MPB e, assim, viabilizar não somente a produção de mais de 5 milhões de mudas por ano (suficiente para cerca de 400 ha), com apenas 7 funcionários, mas também assegurar o seu plantio por cerca de R$ 0,35.

Com esse valor, é possível se plantar um hectare com 13.400 mudas ao valor de R$ 4.690,00, altamente competitivo se comparado com os valores gastos nos plantios tradicionais atualmente utilizados. As tecnologias estão aí, disponíveis para que o setor sucroalcooleiro as incorpore e as utilize em seu sistema produtivo. O que falta, neste momento, é um pouco mais de ousadia e confiança do setor para apostar nessas técnicas e, assim, poder colher os frutos da produtividade que elas podem oferecer.