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Roberto Luis Troster

Economista

Op-AA-57

Uma proposta de renovação
A competitividade do setor sucroenergético é relativa e depende de como seus preços internacionais (câmbio) e produtividade evoluem em relação aos concorrentes. Se forem mais eficazes que os demais, aumentam sua rentabilidade, ganham mercados e atraem investimentos. Dessa forma, criam num círculo virtuoso de mais investimentos, mais competitividade e mais mercados.
 
A produtividade do setor, da porteira para dentro do Brasil, é das melhores do mundo; já do lado de fora, é medíocre, tem uma infraestrutura física e institucional capenga. Um componente é a estrutura do câmbio que é antiquada e faz com que o real seja uma das moedas mais voláteis do mundo.
 
Um câmbio desvalorizado ajuda a determinados agentes em situações diversas; quando valorizado, beneficia a outros. Volátil, como o real, prejudica a todos. O lucro do setor, que é dado pela diferença de preços na compra de insumos e de venda da safra, vira uma loteria, que depende do humor do setor cambial. 
 
O motivo é um só: a obsolescência do mercado de divisas no Brasil. O decreto que dispõe sobre as operações de câmbio no Brasil é de 1933, assinado por Getúlio Vargas e Osvaldo Euclides de Sousa Aranha (!). Sua concepção é de uma época em que havia restrições crônicas de divisas, e a economia era fechada. A realidade é outra, entretanto as transações financeiras de exportações e de compra de bilhetes e para turismo continuam burocráticas, demoradas e minuciosamente reguladas há décadas.

Já o mercado futuro de divisas brasileiro está entre os mais sofisticados e dinâmicos do mundo. Enquanto os volumes no mercado à vista são medidos em milhões de reais/dólares por dia, na B3 (BM&F), registram-se bilhões. O primeiro é travado e burocrático, e o segundo é ágil e eficiente. A consequência lógica é que a cotação do dólar fica refém da dinâmica do humor dos investidores internacionais, que é mais volátil e incerta do que os fundamentos econômicos do mercado cambial.
 
Agravando o quadro, o Brasil adota uma política de reservas mercantilista. É cara, custa cerca de 1% do PIB por ano, e é perversa. Quanto maior for o volume de divisas acumuladas, mais o custo aumenta por conta do diferencial de juros com o exterior, e o risco país cai pelo caixa alto em dólar. Mais segurança atrai mais recursos do resto do mundo, pressiona o câmbio, deteriora o déficit fiscal e segura o crescimento da economia.
 
Agravando o quadro, a volatilidade da taxa cambial e a indefinição sobre o patamar em que se deve estabilizar a moeda norte americana geram incertezas para empresários, que postergam decisões de investir e produzir. Outro impacto adverso é que a desvalorização brusca do real fez com que as dívidas em dólares de empresas brasileiras aumentassem consideravelmente, fragilizando-as, dessa forma.
 
Mais um efeito é na credibilidade da equipe de governo. Como o preço do dólar é um termômetro imperfeito do desempenho da gestão econômica, a alta rápida e a exacerbação da volatilidade alimentam inseguranças sobre os rumos na condução do País. O ponto é que a cotação da divisa norte-americana é um problemão, e continuará a ser, se não mudarem a forma de gerir o câmbio.
 
Depende de fatores externos, como as taxas de juros nos Estados Unidos e os preços das commodities, sobre os quais o governo brasileiro não tem nenhum controle de condicionantes internos, a evolução das contas públicas e a produtividade das empresas, onde a condução econômica do País tem alguma influência e da política cambial brasileira, que é totalmente controlada pelo Banco Central do Brasil.
 
A atuação da autoridade monetária no câmbio se dá em três frentes: mantendo o volume de reservas elevado, usando operações de swaps cambiais para influenciar a cotação do dólar, sem uma estratégia conhecida publicamente, e conservando imaculada a legislação cambial.
 
O custo de carregar as reservas internacionais é astronômico: são US$ 380 bilhões, a R$ 3,8/US$ com um diferencial de taxas de 5%, totalizando R$ 72 bilhões por ano. É um disparate, assim como é a organização institucional das negociações com moeda estrangeira no Brasil.
 
As transações com divisas estão estruturadas em dois compartimentos comunicantes: um é o das operações à vista, o pronto, que negocia algumas centenas de milhões por dia, e o outro é o futuro, em que são transacionadas dezenas de bilhões diariamente. Três correções são necessárias para melhorar esse quadro, diminuindo a volatilidade cambial e reduzindo as despesas para manter o estoque de dólares elevado. A primeira, a mais urgente e a mais importante é mudar o paradigma cambial. A visão neomercantilista de gestão do câmbio apavora analistas preocupados com o futuro do Brasil.
 
A segunda é desburocratizar o mercado à vista e permitir contas em dólar em todos os bancos brasileiros. A medida reduziria o custo de carregar reservas (o ativo do Banco Central teria como passivo contas em divisas de empresas e cidadãos), permitiria um hedge mais barato para empresas brasileiras, alargaria o volume de transações spot, e, dependendo de como for implantada, pode até aumentar o volume de divisas internacionais no País.
 
A criminalização do câmbio vem da época em que a escassez de divisas era crônica no Brasil, quando a economia era mais fechada e o sistema financeiro, mais rudimentar. Não é mais o caso. Os bancos brasileiros têm todas as condições de operar contas em dólar para residentes, que atualmente podem operar em instituições no exterior, mas não no próprio país. A liberação da posse e uso de divisas no País acabaria com um anacronismo de décadas, elevaria a demanda interna de moeda estrangeira, tiraria parte do custo das reservas do Banco Central do Brasil e diminuiria o risco sistêmico.
 
A terceira medida é que o Banco Central estabilize o câmbio explicitamente, fixando diariamente uma banda de, digamos 0,2% (para cima e para baixo), operando no mercado à vista. Dessa forma, conseguirá resultados mais palpáveis, utilizando menos recursos. 
As três mudanças sugeridas na gestão do câmbio poderiam também ser complementadas com outras duas na condução da política monetária, que contribuiriam para estabilizar o comportamento do dólar no Brasil ainda mais.

Uma é melhorar os mecanismos de transmissão dos juros, eliminando “jabuticabas”, como os compulsórios draconianos, ativos financeiros com pouca ou nenhuma sensibilidade à Selic, o pandemônio tributário e o efeito perverso de alguns indexadores que elevam o patamar de equilíbrio das taxas de juros.

O outro é a reformulação da gestão do crédito; é óbvio que a atual não funciona. As cinco propostas acima só dependem do poder executivo, não necessitam de aprovação do Congresso Nacional, podem ser implantadas de imediato e contribuiriam positivamente para o futuro do País e do setor sucroenergético, com cotações mais estáveis, mais facilidades para exportar e importar e a possibilidade de fazer hedges de preços mais transparentes e eficientes.

É só querer.