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Guilherme Campos e Nicolás Vergara

Superintendente e Consultor de Riscos do Banco Santander

Op-AA-23

A internacionalização da propriedade das usinas: um "bem necessário"

O Brasil é um país que sempre se destacou pelo seu elevado potencial agrícola, característica explicada pelo clima favorável, disponibilidade de terras e pelos bons indicadores de produtividade atingidos ao longo dos últimos anos. O segmento sucroalcooleiro não ficou de fora, e o País se tornou o principal produtor e exportador de açúcar do mundo, além de atingir posição de destaque na utilização de etanol como combustível.

Apesar do posicionamento favorável, nos últimos anos, grupos importantes do setor sofreram os impactos dos preços baixos praticados, associados ao incremento de alavancagem decorrente de maiores níveis de investimento e potencializados pela falta de liquidez por conta da crise financeira que afetou o mundo.

Esse cenário que, por um lado, ajuda a deteriorar o valor dos ativos, por outro, torna-os ainda mais atrativos aos olhos de potenciais investidores, já que as perspectivas de longo prazo se mantêm positivas, e o Brasil segue sendo protagonista na produção de açúcar e etanol de cana, o mais competitivo do mercado. Esse processo de entrada de capital novo no setor pode ser analisado em dois momentos distintos.

O primeiro é caracterizado pela oportunidade proporcionada pela necessidade iminente de manter os ativos operando, solucionando os problemas de curto prazo (fornecedores, governo, financiadores, etc), para garantir a existência das companhias e colocá-las novamente nos trilhos. O segundo momento, no qual deveremos entrar ainda em 2010, será caracterizado pela retomada dos investimentos, agora financiados com recursos adequados, consolidação dos grandes grupos no setor, readequação de estrutura de balanço e o reencontro com o mercado de capitais.

A crise vivida pelas usinas mostrou também a importância da profissionalização da administração. Diante da necessidade de complexas reestruturações financeiras, o que se observa é uma grande dificuldade em concluir os processos, principalmente quando se trata de gestão familiar, algumas com elevado número de integrantes, nas quais a morosidade na tomada de decisões relevantes pesa contra as próprias companhias e agrava a situação de curto prazo.

Por esse prisma, a entrada de capital externo no setor mostra-se como um “bem necessário”, na medida em que, além dos recursos financeiros, traz em sua bagagem a tão almejada profissionalização da gestão, maior foco na questão da sustentabilidade e a credibilidade necessária para melhorar a imagem da indústria sucroalcooleira brasileira no exterior, que ainda é erroneamente estigmatizada como problemática do ponto de vista socioambiental.

Isso não quer dizer que o capital nacional não possa fazer parte desse processo, o que poderia ocorrer por meio de grandes grupos econômicos (não necessariamente do setor), quer dizer apenas que grandes multinacionais poderiam, com maior velocidade, dar maior visibilidade ao setor, formando o arcabouço necessário para desenvolver o mercado de etanol de maneira consistente, viabilizando seu crescimento em nível internacional.

Nesse sentido, quem tem maior condição para assumir o papel de consolidador são grandes conglomerados internacionais envolvidos na cadeia, destacando-se:

1. as tradings, que se beneficiam de sua expertise na comercialização de commodities e do acesso a mercados internacionais e,
2. as petrolíferas, buscando diversificar suas fontes de combustíveis com foco em energias renováveis, o que também implicaria um maior esforço para desenvolver os mercados internacionais de etanol.

Os entrantes devem prestar especial atenção à gestão agrícola, considerando que tem grande importância para o sucesso do negócio, ponto este em que os tradicionais proprietários de usinas possuem conhecimento desenvolvido, tornando as associações um caminho bastante interessante. Não podemos ignorar a existência de grupos nacionais com boa situação financeira durante e após a crise.

No entanto, com o processo de consolidação e o surgimento de grandes grupos que passam a ter participação relevante no mercado, aqueles que inicialmente ficaram fora deverão sentir maior pressão para formar novos clusters de produtores, no sentindo de amenizar as adversidades inerentes à dinâmica cíclica da atividade frente aos novos competidores.

A entrada de grandes grupos internacionais, a consolidação e o consequente fortalecimento do mercado são fundamentais para a retomada da credibilidade junto ao mercado bancário, afetada pelo colapso financeiro vivido pelo setor. Destaca-se aqui o grande interesse das instituições financeiras num setor de importância reconhecida para o País e com elevado potencial para colaborar para a mudança na matriz energética mundial.