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Luiz Gonzaga Esteves Vieira

Coordenador do Laboratório de Biotecnologia Vegetal do Instituto Agronômico do Paraná

Op-AA-17

Biotecnologia na cultura da cana: oportunidades e desafios

Nos últimos anos, grandes transformações foram observadas nos sistemas de produção na agricultura. O surgimento de blocos comerciais e a queda de barreiras protecionistas criaram novas demandas. Além das atribuições que já recaem sobre a agricultura – produção de alimentos e de matérias-primas – foram adicionadas a redução de danos ambientais e o desenvolvimento de novos produtos.

Estima-se que em 2020 a população atinja 8 bilhões de habitantes. Aumentar a produção para atender à demanda por alimentos, fibras e energia, é, portanto, uma necessidade. Mudanças nos padrões do clima global e alterações no uso da terra ampliarão os problemas regionais de produção. A perspectiva do Brasil consolidar-se como o principal supridor mundial de combustíveis renováveis, principalmente advindos da cana-de-açúcar, é viável graças à sua dimensão continental, seus abundantes recursos naturais, e um aproveitamento mais racional de suas imensas áreas.

A produção da cana é influenciada por um grande número de fatores ambientais. A busca por altos rendimentos a baixos custos implica em conhecer mais detalhadamente a fisiologia e a genética da cultura, com o objetivo de racionalizar as relações entre os diferentes fatores de produção. O sucesso do setor está baseado em cultivares adaptados às condições ambientais de cada região produtora. O melhoramento genético convencional tem obtido sucesso, aumentando e estabilizando a produtividade.

Entretanto, ainda persistem fortes perdas de colheitas, devido a influências bióticas (pragas e doenças) e abióticas (deficiência hídrica, solos com baixa fertilidade, etc). Com o decréscimo da diversidade genética, diminuíram as opções disponíveis para enfrentar problemas, através das técnicas tradicionais, apesar de que essas técnicas continuarão essenciais no futuro.

Oportunidades e desafios: A moderna biotecnologia surge, potencialmente, como um importante fator que permite ganhos de produtividade e aumento de oferta de produtos agrícolas, ao mesmo tempo em que pode reduzir o ritmo de exploração de novas áreas agricultáveis, gerando, com isto, externalidades positivas para o meio ambiente e para a sociedade. O domínio destas técnicas é crucial para que o Brasil não perca uma de suas maiores conquistas: capacitação em melhoramento genético.

A engenharia genética que produz organismos geneticamente modificados, que permitem a rápida incorporação de características desejáveis às variedades-elites de cana, é apenas mais uma das ferramentas da moderna biotecnologia, esta sim, uma vastíssima área do conhecimento, com imensas aplicações práticas, e peça fundamental para o avanço do conhecimento.

Conhecer e controlar fenômenos biológicos, visando obter produtos biotecnológicos, é um desafio permanente, sendo que um dos requisitos primordiais para isto é a identificação de genes que poderão ser utilizados nestes processos. Assim, através de trabalhos basilares como o Genoma Cana, financiado pela Fapesp, foram identificados genes envolvidos com o desenvolvimento, a produção e o teor de açúcar da planta, na resistência a doenças e com condições adversas de clima e solo.

Para utilizar toda essa informação já gerada é preciso trabalhos em genômica funcional, visando determinar a função dos genes, estudar a interação entre genes associados aos diferentes processos biológicos e verificar quais os genes que poderão ser usados no desenvolvimento de tecnologias de interesse do setor sucroalcooleiro.

Felizmente, iniciativas recentes, como o Programa de Pesquisa em Bioenergia – BIOEN, têm apoiado pesquisas biotecnológicas, para avançar no conhecimento sobre a utilização da cana na produção de biocombustíveis, em bases sustentáveis. Atores e interesses na pesquisa biotecnológica: A biotecnologia tem potencial para contribuir no aperfeiçoamento dos sistemas de produção da cana, além dos atuais paradigmas.

A maneira pela qual a biotecnologia afetará este setor dependerá, fundamentalmente, das instituições e dos atores sociais envolvidos no seu desenvolvimento. No cenário internacional, estas conquistas científicas têm levado ao rápido crescimento nos investimentos em pesquisa e desenvolvimento tecnológico e no número de instituições científicas e empresas de biotecnologia.

Com isto, a questão da propriedade intelectual é crítica. Se por um lado, os mecanismos de apropriabilidade contribuem para a redução dos riscos do processo de inovação, dos custos de P&D e da exploração comercial, a corrida atualmente em curso no mundo para o domínio das biotecnologias também traz novas ameaças.

Com a liberação de plantas transgênicas, foi retomada a questão dos direitos de apropriação intelectual dos produtos, que determinam quem possui e controla essas tecnologias. Essa preocupação vem dos usuários diretos de insumos, produtos e serviços, que têm observado uma grande concentração de direitos de propriedade da indústria de insumos agrícolas.

Portanto, para defender os interesses da indústria sucroalcooleira é essencial o fortalecimento da tecnologia nacional de produção de cana e de seus subprodutos, através da biotecnologia. O desenvolvimento de produtos biotecnológicos depende de grandes esforços de pesquisa. A vantagem competitiva dos países líderes em biotecnologia deve-se, em grande parte, à compreensão da necessidade de promover a capacidade local de desenvolver esta tecnologia.

É imprescindível que o Brasil não seja deixado em posição de desvantagem na sua capacidade de pesquisar, desenvolver, adaptar e utilizar biotecnologia para o setor sucroalcooleiro, para que possa trilhar seu próprio caminho, sem depender de tecnologias desenvolvidas em outros países, mas sim se tornando um fornecedor de tecnologia.

É preciso que todos os envolvidos neste tema tomem parte de discussões de maneira formal, pois se em certos aspectos a introdução de produtos biotecnológicos na cadeia agroindustrial da cana é uma questão técnica, a gama de implicações de sua utilização faz com que as decisões sobre os vários aspectos da produção, comercialização e consumo sejam de caráter socioeconômico e político.