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Luiz Otávio Koblitz

Conselho de administração da Areva Koblitz

Op-AA-29

A hora e a vez do palhiço

A cana-de-açúcar é o vegetal de cultura extensiva que mais converte a energia solar através da fotossíntese. Podemos dividir essa energia armazenada em três partes mais ou menos iguais:

1. O caldo da cana: Esse terço sempre foi o objetivo da cultura da cana-de-açúcar. Hoje, podemos dizer que esse primeiro terço vem sendo bem extraído, e, dependendo da rota, produzimos, com cada tonelada de cana, 85 litros de etanol ou, na rota açúcar, 105 quilos de açúcar e mais 17 litros de etanol – aproveitando-se do mel residual.

2. Bagaço da cana: Na extração do caldo da cana-de-açúcar, obtemos o bagaço – um resíduo fibroso com cerca de 50% de umidade. Ele sempre foi utilizado como elemento combustível nas caldeiras para produção de vapor e acionamentos. O balanço térmico dessas fábricas no passado nunca foi feito visando à otimização energética desse combustível.

A eficiência era deixada de lado, e o principal objetivo era atender às necessidades térmicas e de acionamentos da fábrica de açúcar e etanol de forma equilibrada, a fim de que não faltasse e também não sobrasse bagaço. Dessa forma, fica claro o grande potencial existente na geração de energia elétrica, à medida que se busque uma melhor eficiência energética. O resgate da parte não utilizada desse segundo terço já está a caminho em parte das 432 usinas de cana-de-açúcar existentes.

3. Palhiço: Esse terceiro terço sempre foi integralmente desprezado, pois, para facilitar o corte da cana, as folhas, que, quando secas, chamamos de palhas, são queimadas antes do corte, e a parte superior da cana, que chamamos de ponta, por não conter sacarose, é cortada e desprezada no próprio campo. Com a proibição gradativa da queima da cana, esse palhiço será aproveitado na geração de energia.

Considerando o potencial do bagaço – ainda hoje utilizado de forma perdulária – e o do palhiço, cujo uso ainda é muito inicial, o setor sucroenergético brasileiro poderia estar fornecendo ao Sistema Interligado Nacional - SIN,  12.700 MW médios, que equivalem a 23,5% de toda a energia consumida hoje no Brasil. A potência instalada necessária é de 25.100 MW.

Considerando que, com essa nova tecnologia, pouco mais de 2.000 MW já foram ou estão sendo instalados, teremos que instalar ainda 23.000 MW. Fora o crescimento dos canaviais, cuja previsão é de, em 10 anos, aumentar mais 420 milhões de toneladas de cana, ou seja, mais 20.000 MW, totalizando, até o final da década, 43.000 MW.  

Atualmente, está em audiência pública o Plano de Decenal de Expansão de Energia (PDE 2020). No que tange à biomassa, suas previsões são muito tímidas, uma vez que considera apenas 4.667 MW a serem instalados até dezembro de 2020. Essa expectativa corresponde a apenas 20% do potencial hoje existente, ou a 11%, se considerarmos a previsão de aumento dos canaviais.

Outra evidência desse subdimensionamento poderá ser vista no próximo Leilão A-3/Reserva, previsto para o mês de agosto: nele foram inscritos 4.580 MW, distribuídos em 81 projetos, quase o previsto pelo PDE -2020 para dez anos.

A biomassa deveria ter um tratamento tarifário melhor nos leilões, respeitando-se a modicidade tarifária, porém competindo de forma separada. Para isso, é preciso que se considerem os custos evitados diretos e benefícios indiretos que essa fonte traz ao Sistema Interligado Nacional e à sociedade brasileira, como nenhuma outra.

Os principais itens que podemos apontar são: a diminuição dos investimentos em LTs e S/Es (linhas de transmissão e subestações), pois a geração está junto ao consumo; a diminuição das perdas do Sistema Interligado Nacional; a sazonalidade da geração, acontecendo no período seco; os equipamentos materiais e serviços, que são nacionais; o aumento da confiabilidade do sistema por ser geração distribuída; é uma ferramenta no planejamento devido ao pequeno tempo de implantação; produz baixos impactos ambientais e é fonte de energia limpa.

O Brasil é o país que utiliza o maior percentual de energia renovável do mundo. Considerando apenas a energia elétrica, são mais de 80%, e, se considerarmos a energia como um todo – combustível para os carros, para fazer vapor para as indústrias e inclusive a própria energia elétrica –, são 46%, contra uma média mundial de 14%, na qual apenas 7% são dos países desenvolvidos.

Dentre as principais fontes de energias renováveis, podemos destacar a hidráulica, a biomassa, a eólica e a solar. Graças à generosa hidrografia de nosso País, já instalamos quase 80 mil MW e ainda temos mais de 100 mil MW viáveis a serem instalados – embora a maior parte esteja cada vez mais distante dos grandes centros de consumo.

Para espanto da maioria dos leitores, a biomassa não é a segunda depois das hidrelétricas, e sim a primeira. Dos 46% de energia renovável, 15% são hidrelétricas, 14% cana-de-açúcar, 13% lenha de madeira e 3% de outras fontes. Logo, a biomassa corresponde a 27% de toda a energia utilizada no Brasil ou ainda quase 60% das renováveis. Para o Brasil, hoje, essa é a melhor fonte para produção de energia elétrica. Temos que priorizá-la!