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Ricardo de Gusmão Dornelles

Diretor de Combustíveis Renováveis do Ministério de Minas e Energia

Op-AA-23

A internacionalização contribui para tornar o etanol uma commodity

A internacionalização da propriedade é vista, por vezes, como uma ameaça à soberania nacional e é questionada pelos mais passionais. Numa área estratégica, como o setor energético, o debate ganha mais evidência. O slogan “O petróleo é nosso”, consagrado na década de 50, não deixa dúvidas: o País não pode prescindir da soberania sobre suas riquezas.

Mas, se o debate no Brasil, muitas vezes, foi ideológico, não podemos afirmar que decisões de Estado estejam dominadas por esse viés em pleno século XXI. O conceito “segurança energética” evolui e não significa necessariamente posse, mas garantia de suprimento e diversificação das fontes.

O México é um caso emblemático. Lá, o petróleo é tema sensível para a opinião pública. O petróleo é monopólio do Estado em toda a cadeia de produção e comercialização, e há proibição expressa na Constituição a qualquer participação de empresas estrangeiras. A questão da internacionalização da propriedade, nesse caso, chega ao ponto de inviabilizar os investimentos que dariam ao México as condições para sustentar a sua independência energética no médio e longo prazo.

Em 1999, quando se completou o processo de desregulamentação do setor sucroenergético no Brasil, praticamente não havia presença estrangeira. Em 2008, essa participação era de 12% e, de acordo com o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, hoje, mais de 15% do esmagamento de cana do Brasil pertencem a empresas estrangeiras.

A internacionalização indica que as condições para o investimento, bem como o marco regulatório, se não são ideais, são, ao menos, satisfatórios na avaliação desses investidores. Esses investimentos confirmam que o País respeita contratos, tem bons fundamentos macroeconômicos e grande potencial, pois refletem confiança no próprio mercado para produtos do setor e na capacidade de o Estado aperfeiçoar o marco regulatório vigente.

É extremamente bem-vinda a possibilidade de se ter no Brasil a produção de etanol por grupos internacionais. Esses grupos, ao incorporarem as melhores práticas que já caracterizam o setor no Brasil, confirmam a sustentabilidade econômica, ambiental e social do negócio. Nesse processo, que inclui associações e fusões de empresas nacionais, como o histórico caso da Copersucar, da Cosan ou da Crystalsev, o setor profissionaliza a administração. Ao se tornarem cada vez mais empresas de energia, com apelo ambiental, ganham também a atenção dos principais players em nível global: as empresas de petróleo.

A participação da Petrobras no Proálcool, criticada por muitos, dentro e fora da empresa, foi extremamente benéfica para o País. Permitiu a implementação de um programa de substituição de derivados de petróleo em escala nacional e para a empresa, hoje dona de uma reputação invejável lá fora por sua visão estratégica. A partir do boom do setor, com o aumento das exportações e do crescimento do mercado interno, a British Petroleum foi a primeira petroleira a entrar na produção de biocombustíveis ao adquirir participações em unidade no Brasil.
 
A Petrobras Biocombustíveis também apresentou um plano de investimentos cuja estratégia passa pela construção e aquisição de participações em diversas unidades, sendo que, em 2009, efetivou a sua estreia como empresa produtora de etanol com a aquisição de 40,4% de uma unidade em Minas Gerais. Seguindo a tendência, com o olho no mercado internacional, a Shell anunciou sua parceria com a Cosan.

Ao entrarem no negócio de produção de bioenergia no Brasil, essas empresas adotam estratégias visando participar do forte mercado interno de etanol, bem como a perspectiva de exportações para o mercado externo, auferindo, assim, ganhos de imagem decorrente da produção de energia renovável. O Brasil vê a bioenergia como vetor de desenvolvimento para países em desenvolvimento, capaz de ampliar a participação das fontes renováveis na matriz energética global.

A internacionalização da propriedade das usinas brasileiras, nessa visão mais ampla, ganha importância ao contribuir para a "comoditização" do etanol.  Agregamos, assim, nossas terras, nosso sol, nossa água e nosso know-how ao capital e à tecnologia de empresas brasileiras e estrangeiras que, trabalhando juntas, poderão alcançar mais rapidamente essa "comoditização", consolidando um mercado internacional que, sozinhos, levaríamos mais tempo para tornar realidade.