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Ismael Perina Junior

Presidente do Sindicato Rural de Jaboiticabal

Op-AA-40

Passou da hora de o setor mostrar a cara

Ao fazermos uma análise bastante fria do passado recente, tenho a sensação de que ficamos anestesiados frente às atitudes do Governo Federal para com o setor. Qual o razão do descaso?

O setor tem impacto direto na economia brasileira, com grande geração de empregos diretos e indiretos, principalmente no interior deste País; produz açúcar e etanol, o primeiro, responsável por abastecer todo o mercado interno e gerar divisas importantes com sua exportação, o segundo, por abastecer toda a frota de veículos brasileiros com motores de ciclo Otto, seja utilizando-o totalmente nos tanques (etanol hidratado), ou, parcialmente, misturado à gasolina (etanol anidro), diminuindo a necessidade de importação de combustíveis e promovendo grande melhoria na qualidade das emissões provocadas pelo funcionamento dos motores.

Acredito que só esses dois últimos motivos, para as pessoas que pensam num país melhor, já seriam suficientes para, pelo menos, aceitarem, durante as conversações, as observações dos representantes do setor.

Se agregarmos toda a indústria de produção de máquinas e equipamentos para o setor, a geração de energia elétrica (que anda com grandes problemas por diminuição do estoque de água nos reservatórios ou pelo alto custo de funcionamento das termelétricas), que poderia contribuir muito para esse momento de dificuldades; o grande número de produtores agrícolas vinculados às unidades industriais (que têm um sistema produtivo de ponta e com boa produtividade e que só não é melhor porque nos falta rentabilidade); a arrecadação de impostos desses produtos; o efeito forte que esse segmento tem ao promover o desenvolvimento do interior; e tantos benefícios mais, com certeza, as atitudes desse governo não poderiam ter sido as tomadas até o presente momento.

Participando ativamente, nesses últimos anos, de vários fóruns e várias reuniões em diversos ministérios, foi possível perceber o quanto o setor é mal compreendido pela maioria dos representantes do governo nas esferas “competentes”. Chego a pensar que, certamente, há um grande resquício de má intenção por parte dos governantes.

Promover uma política suicida para os produtores de etanol e, consequentemente, para nós, produtores de cana, é algo a lamentar. As pessoas não têm ideia de como, na agricultura, um ano muito seco ou muito chuvoso interfere na nossa atividade. Seria importantíssimo que esse vazio fosse mais bem entendido por todos.

O quão é importante uma política bem elaborada de estoques, principalmente etanol, para que a tranquilidade impere nos momentos difíceis. A velha história da formiguinha que trabalha na época boa para guardar para a época difícil sempre é muito bem-vinda num setor que tem grande dependência dos fatores climáticos. E o que fizeram?

Conseguiram sempre colocar recursos para estocagem depois que o “estoque” já havia sido consumido. Uma lástima! Política de estoque é de longo prazo e para sempre. A decisão de zerar a Cide - Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico, para a gasolina, eliminando um dos únicos compromissos firmados com governos anteriores que incentivava o combustível renovável em detrimento do combustível fóssil, foi uma punhalada pelas costas no setor.

Parece-nos que os grandes feitos em benefício do ambiente são jogados no lixo. Baixar a mistura de 25% para 20% e, numa atitude de retaliação, alterar a legislação, trazendo o limite mínimo para 18% num momento em que já se demonstrava a não necessidade, pois o abastecimento estava regularizado, foi outra.

Pior, retornar para 25%, quando a oferta já estava regularizada, demorou-se mais de um ano.  O dano financeiro provocado nas empresas é algo incalculável, e, aqui, certamente, o produtor de cana foi um dos que mais sofreram. Primeiro, o fato de ter a formação dos preços, que é dependente dos preços de açúcar e etanol, bastante aviltado, abaixo do custo de produção, trouxe um alto grau de endividamento neste momento.

Segundo, que muitas unidades industriais deixaram de moer, não adquirindo as canas dos produtores ou, em outros casos, não pagando aos produtores pela matéria-prima entregue. Imaginem o que é trabalhar um ano inteiro e, na hora de vender o seu produto, não conseguir fazê-lo.

Dá pra imaginar o que se passa na cabeça de um cidadão que vivencia isso? Não tem seguro (política governamental ineficiente) e nem Seguro-desemprego que lhe dê cobertura. A saída, em muitos casos, é dura e difícil e passa por ter que vender seu patrimônio, conseguido a duras tarefas por longos períodos. Ou seja, a situação é quase insustentável.

Talvez, o único "conforto", neste momento, seja assistir a que não estamos sozinhos nesse ambiente hostil e de falta de horizontes. Com a gente, estão Petrobras, Eletrobras, indústrias de máquinas e equipamentos voltadas para a área agrícola e industrial, comércio de pequenas cidades ao quais os reflexos não chegaram ainda, mas, certamente, chegarão, prefeituras com quedas de arrecadação, principalmente nos centros produtores, e –  por que não dizer?  –, também os trabalhadores de todos esses segmentos, que correm risco de perder seu emprego, jogando fora grande esforço até agora. Nos empreendimentos que fecharam ou recorreram à recuperação judicial, isso já é um fato.

Poderia passar aqui um bom tempo tentando, talvez, explicar um pouco mais os grandes benefícios que esse setor promove. Mas vou me ater a falar um pouco sobre um tema discutido no mundo inteiro e no qual o setor mostra grande maestria, que diz respeito à questão ambiental.

O trabalho desenvolvido pelos produtores em suas propriedades agrícolas é de dar inveja. Quem conserva e planta árvore somos nós. E plantamos cana também, que é uma das culturas mais eficientes quando se fala em produção de oxigênio. O setor jogou a favor e foi o grande protagonista num processo de mudança quase secular, que foi o da eliminação da queima no processo de colheita da cana. Isso nos custou muito caro, a sociedade teve um grande benefício, e nem isso foi suficiente para convencer nossos governantes de que nosso custo aumentou e ficou muito difícil. Ganhamos a eliminação, como já disse, da Cide e de suas consequências nefastas ao ambiente.

Temos que gritar alto para a sociedade, e entendo que a hora é essa. Finalmente, depois de muito debater, alinhados com o setor industrial canavieiro e de produção de máquinas e equipamentos, vamos nos mobilizar, alinhando-nos também com os trabalhadores de todos esses segmentos, e mostrar à sociedade se, realmente, o que importa para o País é ter todo esse complexo de empresas gerando emprego e renda, ou um governo que muito tem colaborado para liquidá-las.