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Enrico De Beni Arrigoni

Consultor da Enrico Arrigoni Soluções em Manejo Integrado de Pragas

Op-AA-56

Problemas atuais e futuros desafios
Estamos comemorando 32 anos de operação da colheita de cana sem a queima da palha, ou cana crua. Isso ocorreu desde o início dos primeiros experimentos, conduzidos na região de Ribeirão Preto, em 1986, testando e avaliando essa nova forma de colheita, que permitiu introduzir máquinas colhedoras, substituindo a mão de obra que se ocupava do corte dos colmos.

Os estudos multidisciplinares foram conduzidos a fim de determinar quais seriam os impactos dessa modalidade de colheita para o setor, nos mais diversos aspectos. Agora, após três décadas, observamos o que foi projetado, o que foi previsto, quanto evoluímos e o que ainda não se conhece.
 
As doenças, de uma maneira geral, não se desenvolveram em ritmo diferente do que ocorria nas áreas de cana queimada, mas houve a introdução e a descoberta de algumas doenças, sendo a mais recente a ferrugem alaranjada, controlada por variedades resistentes ou mediante emprego de fungicidas, que alterou o plantel varietal e a rotina dos produtores que cultivavam variedades suscetíveis. 
 
O aumento na incidência de algumas doenças resultou mais em função do abandono das técnicas corretas de plantio de viveiros de cana-de-açúcar do que pelas alterações no ambiente ou na evolução de agentes patogênicos. Entretanto não há dúvidas de que a manutenção da palha na superfície do solo exerce influência, mas as ações equivocadas do homem são as que mais alteram o equilíbrio, aumentando as perdas e os desperdícios. 
 
Por outro lado, a técnica de multiplicação de cana, empregando mudas originadas de gemas brotadas, proveniente de plantas indexadas, permitiu evoluir na produção de material sadio e mais vigoroso para dar início ao plantio comercial, com viveiros tradicionais ou Meiosi em maior escala e em menor custo. Essas tecnologias tiveram e terão impacto positivo na redução da ocorrência de importantes doenças da cana.
 
As pragas foram diretamente afetadas pela presença da palha, e a que merece maior destaque é a cigarrinha-das-raízes, que era considerada praga esporádica quando se colhia a cana queimada. Atualmente, pode ser considerada a praga que causa maiores prejuízos à cultura canavieira, apesar de estarem disponíveis eficientes métodos de monitoramento e de controle, incluindo o químico, o microbiano e o cultural. Pode-se dizer que ocorrem problemas de redução de equipes e mau dimensionamento de equipamentos de aplicação, levando a erros no controle da primeira geração de ninfas, o que compromete a eficiência do controle nas demais gerações da praga.
 
 Aplicações aéreas e tratorizadas mal executadas ou em momentos inadequados, atraso nas operações de monitoramento e de controle, equívocos na definição de níveis e de critérios de controle, utilização de produtos e de métodos de aplicação ineficientes são alguns motivos que explicam o problema que enfrentamos hoje. Devemos acrescentar a crescente ocorrência de Colletotrichum falcatum em nossos canaviais, causando secamento das canas e, consequentemente, redução na produtividade.

Apesar de não haver consenso entre os especialistas, é possível correlacionar a ocorrência dos danos causados pelo fungo e o ataque das cigarrinhas e de outras pragas nas áreas. O fato é que há necessidade premente de constituir grupos de estudo focados na rápida definição dos principais aspectos relacionados ao problema, com recursos suficientes para agilizar os projetos e entregar respostas e soluções de controle aos produtores que têm sofrido prejuízos a cada safra. Pode-se afirmar que esse é um dos principais desafios na atualidade e que necessita de ações imediatas.
 
Outra espécie beneficiada pela presença da palha é o Sphenophorus levis, conhecido por Sphenophorus, que encontrou no sistema de colheita de cana crua a possibilidade de permanecer abrigado e diretamente em contato com o alimento, com a possibilidade de as fêmeas colocarem seus ovos nas bases de canas, sem maior exposição aos predadores e aos fatores climáticos inadequados.

A movimentação de cargas de cana, para plantio e safra, auxiliou na dispersão, e, como consequência, houve aumento de áreas infestadas e dos níveis populacionais da praga. Encontram-se disponíveis métodos químicos, microbianos e culturais para promover a redução dos níveis populacionais, mas pode-se afirmar que a dificuldade encontrada na integração desses métodos e seu correto emprego são fatores que limitam a obtenção de eficiências no controle.

O desafio em relação a essa praga está na introdução de novos métodos de controle, como nematoides entomopatogênicos, variedades Bt, métodos mais eficazes de aplicação dos produtos químicos e microbianos, entre outros. A lagarta elasmo, que foi relatada como problema em regiões sujeitas a déficits hídricos prolongados, nos períodos de brotação da cana, passou a ser considerada praga esporádica ou deixou de ser mencionada como praga na maioria das regiões, em função da proteção da palha, maior umidade na camada superficial do solo e pelas fêmeas não serem mais tão atraídas aos canaviais, como o eram na época da queima. 
 
Outro desafio, que enfrentamos hoje, é a ocorrência mais frequente de Hyponeuma taltula, ou Hyponeuma ou broca peluda, nas bases de colmos, causando consideráveis danos na produção e na quebra de colmos em sua base. Diferentemente de outras pragas, essa espécie é pouco conhecida e está se tornando uma praga primária na cana. Não se conhecem aspectos básicos de sua biologia e de comportamento no campo, índices de perdas ou preferência varietal, métodos de controle ou técnicas validadas.

Não há produtos eficientes validados e registrados para uso em seu manejo. Há um longo caminho de pesquisa básica e aplicada pela frente, e é evidente a necessidade de destinar recursos para formar grupos de estudo, na busca de respostas e de recomendações de métodos eficientes de controle.
 
Não podemos deixar de mencionar a broca comum da cana, que passou a apresentar índices um pouco mais elevados de intensidade de infestação, quando se estabeleceu a colheita da cana crua. Outros fatores podem estar associados a esse ligeiro aumento, como a menor atuação das equipes de campo, a redução de mão de obra, variedades, etc.

O fator chave para controle de populações da broca é a fase de ovo, que apresenta uma série de parasitoides e de predadores. A presença da palha prejudicou a manutenção de espécies de formigas predadoras, e o melhor exemplo foi a redução de ninhos das formigas-lava-pés (Solenopsis invicta) nessas áreas. Os métodos de monitoramento e de controle são conhecidos e adotados por uma parcela significativa de produtores. 
 
A recente inovação no controle da broca foi o lançamento de variedade de cana transgênica expressando o gene de uma toxina Bt, abrindo novas oportunidades de controle mediante o uso dessa promissora ferramenta para o setor sucroenergético. As subespécies de broca-gigante (Telchin licus) também foram favorecidas pela presença da palha, que impediu a realização de práticas de controle que eliminavam parte das larvas e das pupas presentes nos tocos após o corte.

A pesquisa e a adoção de novos produtos e, principalmente, de métodos de aplicação deverão contribuir para a redução das perdas causadas. É provável que a cana transgênica Bt possa exercer controle também dessa espécie, sendo necessários testes direcionados.
 
A espécie Migdolus fryanus, ou apenas migdolus, é conhecida há décadas, e os métodos de monitoramento e de controle já foram definidos e estão sendo adotados. Entretanto o correto entendimento da sequência de operações e os momentos ideais de aplicação ainda não foram assimilados e apresentam erros na execução. Há necessidade de aprimoramento do controle, visto que inovações a curto prazo não devem ser esperadas.

É importante lembrar e enfatizar que o manejo integrado de pragas e sua relação com doenças é um programa repleto de atividades de monitoramento, de análise de dados, de decisões, de aplicação do controle e da avaliação de resultados, com correções de rota, que necessitam de equipes técnicas muito bem treinadas e comprometidas, para que se possam evitar erros, desperdícios de recursos e perdas na produtividade.

A utilização dos recursos de informática, em softwares de gestão de MIP é uma evolução que será utilizada em maior escala nos próximos anos e auxiliará na rápida tomada de decisão e na aplicação de técnicas de controle, reduzindo falhas.