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João Eduardo Azevedo Ramos da Silva

Professor de Logística da UFSCar

Op-AA-28

Planejamento de operações agrícolas com suporte de simulação de eventos discretos

Os processos utilizados na produção da cana-de-açúcar, como preparo do solo, plantio, cultivo, colheita e transporte, são realizados por meio de equipamentos de grande porte e alto custo de aquisição. O planejamento desses processos é uma tarefa complexa dos gestores das usinas, uma vez que, além do investimento, há o risco operacional de os objetivos de produção não serem atingidos.

De maneira especial, o sistema de corte, carregamento e transporte de cana-de-açúcar – CCT, requer um planejamento minucioso, uma vez que o abastecimento contínuo de cana na safra depende do bom gerenciamento dessas operações. Em algumas empresas, as operações agrícolas sempre foram planejadas individualmente, de maneira fragmentada e sem considerar o conceito de que as capacidades dos estágios intermediários devem estar submetidas à capacidade da etapa final.

No caso específico do CCT, a moagem da usina deve estabelecer o ritmo de todas as operações precedentes, formando uma sequência de processos cadenciados. Com base nessa premissa, a visão sistêmica procura explorar as potencialidades de ganho para todo o conjunto de operações e não apenas para uma etapa isolada.

Uma regra recorrente da análise de sistemas lembra que o ótimo global não corresponde obrigatoriamente à soma dos ótimos locais. Com foco na visão sistêmica, uma das maneiras de se efetuar o planejamento operacional de sistemas produtivos é fazer uso de modelos de simulação. Tais modelos visam representar operações em computador e promover experimentações de interesse para compreender como ocorre a dinâmica dos sistemas produtivos.

A Simulação de Eventos Discretos faz parte do conjunto de conhecimentos da Pesquisa Operacional – PO, que busca a resolução de problemas de natureza operacional por meio de métodos científicos. A técnica foi aplicada originalmente em processos de manufatura, sendo, posteriormente, disseminada para outros setores produtivos, como agricultura e siderurgia, e prestadores de serviços, como hospitais e bancos.

Os modelos de simulação respeitam a variabilidade dos sistemas reais, com os tempos dos processos representados por meio de distribuições teóricas de probabilidade. A partir de dados coletados em campo, a transferência da cana de um transbordo para um veículo poderia ser representada por uma distribuição triangular com tempo mínimo de 1,5 minuto, moda de 2 minutos e tempo máximo de 3 minutos.

Na simulação desse processo, os tempos ocorreriam com maior frequência em torno dos 2 minutos, porém tempos maiores ou menores poderiam ser selecionados com menor probabilidade, dentro do limite de 1,5 a 3 minutos. A maior vantagem da simulação é a possibilidade de avaliar a operação de sistemas de interesse previamente à sua implantação, principalmente quando os diferentes equipamentos possuem relações de interdependência.

Por exemplo, um sistema de colheita mecanizada pode ser formado por três tipos de equipamentos com suas características operacionais, ou seja:

1. Colhedoras: tempo de colheita, velocidade e procedimentos de manutenção (troca de facas, lubrificação, etc.);
2. Tratores transbordo: quantidade de transbordos tracionados, tempos de deslocamento e de transferência da cana, capacidade volumétrica e procedimentos de manutenção (abastecimento, manutenção mecânica, etc.); e
3. Veículos: tipo (treminhão, rodotrem, etc.), carga transportada/viagem, velocidades, distância frente-usina e procedimentos de manutenção (abastecimento, borracharia, etc.).

Considerando as três operações, suas características operacionais e outros fatores próprios de cada sistema de jornadas, turnos de trabalho, moagem da usina, etc., é possível explorar questões do tipo:

 

  • Qual a operação gargalo que restringe as demais operações? Como superá-la?  
  • Se a distância média for aumentada em 10%, a frota manterá a usina abastecida?
  • Como o sistema reagiria frente a uma ampliação do volume dos transbordos?
  • Os pontos de descarga são suficientes para suportar um aumento do mix de cana picada?
  • Quais os motivos para filas excessivas e/ou falhas de abastecimento?

Modelos de simulação desenvolvidos para o setor sucroalcooleiro já foram utilizados no planejamento de processos de CCT, plantio mecanizado, transporte de açúcar e dimensionamento de estoques de etanol, dentre outros. Para esses processos, os estudos visavam ao dimensionamento da frota, à avaliação comparativa de equipamentos, à alteração de procedimentos de manutenção, ao estabelecimento de turnos e jornadas de trabalho, aos procedimentos de troca de operadores, ao planejamento de paradas para refeições e a outras questões operacionais.

Nas situações em que o planejamento de sistemas produtivos envolve risco operacional e demanda investimentos de grande vulto, a abordagem minuciosa dos processos é recomendada, para que as tomadas de decisões ocorram com maior precisão. Muito embora as técnicas da Pesquisa Operacional requeiram maior tempo para apontar uma recomendação em comparação com métodos tradicionais, elas permitem uma análise diferenciada, particularmente útil no caso de gestão de sistemas complexos.