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Clive Botelho

Vice-presidente de Finanças do Banco Pine

Op-AA-20

Bons ventos no horizonte

Com papel fundamental na pauta de exportações brasileiras, o agronegócio ganhou importância nesta década. A bonança internacional dos últimos cinco anos, aliada à incessante discussão de desenvolvimento das fontes de energia renováveis, trouxe a países em desenvolvimento e, em especial, ao Brasil, um volume de recursos extraordinário para o agribusiness.  

O setor sucroalcooleiro foi o maior beneficiado deste processo, através da criação de inúmeros projetos greenfield, voltados à produção de etanol e cogeração de energia limpa. Vale destacar que, além da situação de liquidez extraordinária durante o boom do setor, investidores foram atraídos pelo custo elevado de outras fontes de energia, em especial o petróleo, com preços acima de US$ 145/barril.

Este cenário intensificou as discussões sobre novas fontes de energia limpa, que tiveram seu ápice na intenção do então presidente Bush de promover uma política de substituição do petróleo. Produtores e investidores enxergaram uma oportunidade única, dadas as vantagens competitivas do Brasil, e o mercado foi inundado por novos projetos.

Dessa forma, o etanol brasileiro tornou-se a grande vedete do mercado de commodity. Fundos de Hedge, empresas e instituições financeiras, além do BNDES, fomentaram e investiram no setor, através de novas linhas de funding. Com essas mudanças, o segmento capacitou-se intelectualmente e modernizou-se, através da profissionalização da gestão.

O mercado financeiro teve papel preponderante nesse processo. Os IPOs - oferta pública de ações, realizados por algumas empresas, colocaram o setor ainda mais em evidência. Como em todo processo de profissionalização, houve uma consolidação através de aquisições e fusões, criando algumas companhias notáveis. Como consequência direta da internacionalização do setor, o mercado de açúcar e álcool listado em bolsa teve um boom em número de contratos negociados.

O desenvolvimento de produtos financeiros derivados deste mercado também foi significativo. Se, por um lado, as mega usinas trouxeram novos players e investidores ao mercado, por outro, a chegada da crise expôs a fragilidade do setor em alguns casos. Sem fundamentos técnicos, a discussão da formação de preço de commodities é pautada na relação oferta, demanda e estoques.

A crise, de proporções nunca antes vista, trouxe uma desalavancagem frenética ao mercado, exigindo uma brusca correção de preços. Dessa maneira, foram expostos aspectos que, de certa forma, eram ignorados. Em muitos casos, a necessidade de recursos para ampliação de projetos imediatos deteriorou, de forma substancial, o passivo dessas companhias.

A qualidade dos financiamentos, concentrados em moeda estrangeira e, de forma geral, no curto prazo, aliada ao empoçamento de liquidez no sistema financeiro, trouxe problemas graves ao setor, suscitando questionamentos acerca da viabilidade dos projetos e da longevidade de muitas empresas. Isso sem considerar algumas operações com derivativos, que atingiram em cheio os passivos das usinas, com grau de alavacagem desconhecido no momento da contratação.

A situação atípica provocou queda no preço do etanol em plena entressafra. Com o caixa apertado, muitas usinas tiveram que se desfazer de seus estoques estratégicos, com preços indesejados. Nem tudo são notícias ruins. Como em toda crise, além do aprendizado, surgem oportunidades. Eventualmente, haverá mais uma onda de consolidação, mas é razoável pensarmos que a recuperação será rápida, passando pela normalização do crédito ao setor.

A retomada de preços do açúcar e a queda de 30% na produção na Índia já sinalizam bons ventos no horizonte. Com a recuperação do preço do açúcar e o dólar ainda forte, as usinas devem estar atentas aos seus fluxos de caixa, efetuando, em momentos favoráveis, seus hedges, que são oferecidos pelo mercado.

Concluo observando, de maneira otimista, o desenvolvimento do agronegócio no Brasil e, em especial, do setor sucroalcooleiro. Com a execução de diversas ações conjuntas de bancos centrais para restabelecer o crédito, acredito que a liquidez voltará para os mercados emergentes, e o Brasil beneficiar-se-á desse processo, dada sua diferenciação, sobretudo sob a ótica macroeconômica. Dessa forma, deve atrair mais investimentos que seus parceiros em desenvolvimento.