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Evandro Gussi

Presidente da Unica, União da Indústria de Cana-de-Açúcar

Op-AA-67

Etanol: combustível do presente e do futuro
O Brasil tem uma mobilidade que já é uma das mais sustentáveis do mundo com o uso do etanol e pode tirar vantagem dessa posição no processo de eletrificação. A sociedade moderna busca por eficiência ambiental e energética, possibilitando que seus deslocamentos tenham menor contribuição para o aquecimento global e a poluição nas cidades. Esse objetivo comum, no entanto, não encontrará soluções únicas, mas dependerá de uma pluralidade de rotas que, ao lado da descarbonização, leve em conta questões sociais e econômicas em um mundo tão diverso. 

O Brasil começou sua lição de casa há algumas décadas, pois, apesar de não ter nascido para isso, o etanol, cuja competência de utilização eficiente dominamos, revelou-se como um dos mais eficientes agentes de descarbonização da matriz energética que conhecemos. A boa notícia é que aquilo que parecia ser uma má notícia para ele – a eletrificação – configura-se, na verdade, em mais uma extraordinária oportunidade. Os primeiros passos para a eletrificação em larga escala foram dados pela Europa, que trabalhou com as ferramentas e circunstâncias que lhes são próprias, priorizando carros plug-in 100% a bateria.

Como dissemos, as rotas serão plurais, e os europeus aproveitaram a centralização das políticas públicas, fruto do bloco, e a alta disponibilidade de dinheiro público para fomentarem a aquisição de veículos e a mudança da infraestrutura, o que, para eles, pode realmente ser a melhor solução. Esse modelo, contudo, não deve ser replicável globalmente. 

O Brasil, que já tem uma mobilidade das mais sustentáveis do mundo para um País com nossas dimensões, chegou aonde os europeus dificilmente chegarão no médio prazo. O uso do etanol, produzido a partir da cana-de-açúcar, proporciona uma redução de até 90% na emissão de gases de efeito estufa (GEE) quando comparado com a gasolina (o carro brasileiro flex abastecido com etanol tem emissões na ordem de 34 gCO2/km). Modelos híbrido-flex utilizando o biocombustível chegam ao padrão de emissão de 25 gCO2/km, dos mais baixos do mundo; um ganho significativo quando comparado, por exemplo, ao carro elétrico europeu (54 gCO2/km). 

Essa posição de vantagem absoluta do Brasil não pode, entretanto, nos levar a uma indesejável zona de conforto. Justamente por isso olhamos com atenção e com senso de oportunidade o movimento de eletrificação, do qual o setor sucroenergético já faz parte com os modelos híbrido-flex, e temos trabalhado forte para construir um plano tático para levarmos ao mundo outros patamares de eficiência ambiental e energética, necessários para a descarbonização.

O Brasil e as nações menos desenvolvidas não terão dinheiro para substituir toda a infraestrutura de abastecimento dos postos de combustíveis para atender aos carros elétricos plug-in. O custo dessa transformação, entre nós, ultrapassaria R$ 1 trilhão (entre US$ 220 e 300 bilhões), segundo cálculos da Empresa de Pesquisa Energética (EPE). 

A resposta para o futuro é a geração de energia elétrica dentro dos veículos a partir de biocombustíveis, o que podemos chamar de bioeletrificação, um conceito certamente revolucionário quando pensado em larga escala. Os motores elétricos célula a combustível alcançam rendimento de 26 a 30 km/litro, com emissões próximas de zero. Esse tipo de veículo possui um reformador que extrai hidrogênio do etanol. A eletricidade é gerada no próprio carro por meio de uma reação química que transforma o hidrogênio em energia elétrica. Assim, o carro fica mais sustentável, pois não há o processo de produção e descarte das grandes baterias, nem a necessidade de longas paradas de recarga. E o melhor: aproveitando a infraestrutura de postos já existente. Basta encher o tanque com o etanol como é feito hoje e desfrutar do veículo elétrico.
 
Assim, o etanol continuará sendo crucial, não só para abastecer os carros flex e híbrido-flex, como também para mover novas tecnologias. Esse pode ser o caminho de eletrificação adotado em países como Brasil e Índia. A Índia, aliás, passará a adotar mistura de etanol à sua gasolina em 10% até 2022 e de 20% até 2025, em busca de uma melhoria na qualidade do ar e da redução de emissões de CO2. O país lançou, recentemente, uma motocicleta movida a etanol hidratado, também em busca de sustentabilidade. Exemplo recente também vem do Reino Unido que, a partir de setembro, duplicará seu consumo de etanol, reduzindo 750 mil toneladas de CO2 ao ano.
 
E o que a indústria do etanol brasileiro propõe que seja feito? Diversificar as tecnologias e rotas de eletrificação, trazendo variedade de opções para o consumidor, como híbridos, plug-in híbrido, plug-in 100% a bateria e fomentar a tecnologia disruptiva da célula a combustível. 

Com isso, temos a oportunidade de fortalecer e desenvolver soluções locais que podem ser exportadas para outros países com perfil similar. Assim, aumentamos as opções disponíveis aos motoristas, que poderão optar conforme seu padrão de uso, todos, porém, com o objetivo final de reduzir as emissões e combater o aquecimento global, preservando o ambiente em que vivemos.  

Em linha com esses objetivos, o Brasil estabeleceu políticas públicas com metas ambiciosas para a redução de emissões. Um exemplo é a Política Nacional de Biocombustíveis – RenovaBio, que foi desenhada para atingir as diretrizes definidas pelo País em resposta ao Acordo de Paris, com patamares para a descarbonização da matriz de transportes por meio do aumento do uso de biocombustíveis. E estamos trabalhando para reduzir ainda mais a pegada de carbono do etanol. 

O etanol, portanto, que já melhorou a qualidade do ar de São Paulo, deve se consolidar como uma opção viável para a eletrificação da indústria automobilística do País e de uma relevantíssima parte do mundo. O uso do biocombustível apresenta resultados imediatos já na sua adição à gasolina e pode prolongar a vida útil dos combustíveis fósseis nesses países, ao mesmo tempo que reduz as emissões: o etanol é presente. Não bastasse isso, é solução viável para veículos elétricos: o etanol é combustível do futuro.