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José Antonio Sorge

Diretor de Regulação, Comercialização e Juridico da Bertin Energia

Op-AA-37

Produção e comercialização de bioeletricidade

Quando recebi o honroso convite para ser um dos articulistas desta edição da Revista Opiniões, em companhia dos principais expoentes e formadores de opinião do setor, tive a curiosidade e o cuidado de reler outros dois artigos que havia escrito sobre assunto similar (comercialização de energia) publicados em edições anteriores, em 2007 e em 2011. Especialmente interessante foi essa releitura, pois tais artigos abrangeram períodos distintos, separados pela grave crise econômico-financeira que se abateu sobre todos os países a partir de 2008.

No ano de 2007, interrogávamos, com alguma surpresa, as razões da ausência das usinas nos leilões regulados realizados naquele ano, quando apenas 140 MW médios foram vendidos pelo setor naqueles certames, apesar da grande expectativa de que a oferta da bioenergia pudesse ser bastante superior. Já no ano de 2011, uma realidade oposta se impunha, e procurávamos discutir saídas para a superação da crise, que fez refluir os investimentos em bioenergia e, consequentemente, a inibição da expansão da oferta dessa energia no sistema elétrico brasileiro.

Infelizmente, a realidade em 2013 não é diferente daquela constatada há cerca de 2 anos, mas com alguns fatores adicionais e, infelizmente, mais desmotivadores, que se juntaram à já combalida disposição dos empresários do setor em investir na bioenergia, os quais tentaremos discorrer neste reduzido espaço.

Em nossa opinião, o principal fator desmotivador para novos investimentos não está relacionado ao setor elétrico brasileiro, mas à política de preços de combustíveis praticada pelo Governo Federal e, consequentemente, pela Petrobrás.

Como investir em expansão da produção de etanol e de bioenergia, se não há uma política de longo prazo de expansão do etanol e, ainda, se os preços da gasolina estão artificialmente represados, influenciados pela política de controle da inflação?

Se não há planejamento de longo prazo e previsibilidade de política de preços, o investimento não é realizado. É a lei de mercado. Apenas com retrofit de usinas existentes não haverá expansão da bioenergia no País, em volumes e com competitividade necessários para se constituir uma das alternativas energéticas para atender ao crescimento do mercado de energia.

Relativamente ao setor elétrico, diversos são os fatores que inibem a expansão da bioenergia. Primeiramente, podemos citar que os últimos leilões regulados apresentaram ofertas de preços surpreendentemente baixos, incentivando a participação e a preponderância da fonte eólica perante as demais fontes, entre as quais a bioenergia não existiu como alternativa.

A geração eólica é altamente positiva e benéfica para o País e deve ser sempre incentivada, mas é um risco realizar a expansão do sistema energético apenas com essa fonte, complementando as poucas grandes hidrelétricas que estão sendo licitadas, face à sua sazonalidade e à indefinição da quantidade de ocorrência média de seu combustível, que é a força dos ventos.

Os incentivos obtidos pelos geradores eólicos e a queda da demanda internacional por equipamentos para essa fonte após a crise de 2008 permitiram a sua enorme competitividade e os lances vencedores nos leilões realizados desde 2010, em detrimento de outras fontes, como a bioenergia, que não foram contempladas com os mesmos incentivos e conjuntura favoráveis.

Felizmente, o governo e a EPE reconheceram essa realidade e restringiram a participação das eólicas apenas aos leilões de reserva em 2013, o que deverá propiciar lances vencedores de outras fontes nos leilões A-3 e A-5, que serão realizados neste ano. Entendemos como correta essa decisão, pois se continua a incentivar a expansão da fonte eólica, mas, em contrapartida, permite-se a participação vencedora de outras fontes nos demais leilões.

No entanto, como estamos tratando do assunto bioenergia, resta responder à questão se essa fonte estará devidamente incentivada para proporcionar lances vencedores, em especial nos leilões A-5 e A-3 a serem realizados em 2013, ou se essa possibilidade de diversificação proporcionará oportunidades apenas para a expansão das usinas que utilizarão outros combustíveis, por exemplo o carvão e o gás natural. Em nossa opinião, dificilmente as usinas do setor sucroalcooleiro apresentarão competitividade para apresentar ofertas vencedoras nesses leilões. Não se podem descartar alguns bons projetos de biomassa, mais eficientes e que poderão vencer em preços ofertados, mas, certamente, serão uma minoria perante o potencial do setor.

Uma alternativa que o governo ainda reluta em implantar são os leilões por fonte, como tem sido muito discutido e debatido na mídia e em ambientes especializados. Nesse caso, poderia haver maiores oportunidades para a diversificação das fontes de geração em maior escala, não somente visando à bioenergia, mas também à contratação de energia proveniente de Pequenas Centrais Hidrelétricas – PCH´s, outra fonte que está absolutamente ausente dos leilões e do planejamento do setor elétrico brasileiro. Não me parece que essa alternativa, de leilões por fontes, deverá ser implementada no curto prazo no País, face às regras já publicadas e definidas pelo Ministério de Minas e Energia para a contratação regulada de energia em 2013.

Outro fator inibidor à expansão da bioenergia foi a publicação e os efeitos da lei 12.873/2013 e do Decreto 7.805/2013, que implementou as regras para a prorrogação das concessões de geração que venceriam entre 2015 e 2017. Essa decisão unilateral do Governo Federal, associada ao critério de definição dos novos preços das usinas que aderiram à prorrogação de suas concessões, permitiu um fato positivo, que foi o rebaixamento, em cerca de 20%, nas tarifas para os consumidores finais. O que não foi possível atingir em redução tarifária com a prorrogação das concessões, visto que nem todas as usinas elegíveis aderiram à proposta, o Governo determinou a utilização de recursos da Conta de Desenvolvimento Energético - CDE, para garantir a redução pretendida.

No entanto essa redução tarifária no mercado de consumidores cativos das distribuidoras de energia provocará maiores dificuldades para a comercialização da Bioenergia no mercado livre, hoje uma importante alternativa de alocação de excedentes, já consolidado no Brasil, com a adesão de cerca de 2.000 consumidores, principalmente no setor industrial e comercial. No entanto, para a adesão desses consumidores elegíveis a adquirir energia diretamente de usinas no setor sucroalcooleiro ou mesmo com a intermediação de comercializadoras de energia, o parâmetro de referência é a tarifa regulada da concessionária de distribuição a cuja rede elétrica o consumidor está conectado.

Se o preço no mercado livre permitir redução de custos com energia, é possível a migração do consumidor para o ambiente livre, caso contrário, com raríssimas exceções, nenhuma negociação é realizada. Portanto, com essa redução de 20% nas tarifas, o setor sucroalcooleiro terá que reduzir suas margens e ser mais competitivo com as demais fontes concorrentes nesse mercado, de forma a conquistar e fidelizar tais clientes. Há incentivos para propiciar essa competitividade, como a redução de tarifas de uso da rede de distribuição em 50% para os geradores e consumidores, mas tal incentivo é dependente do perfil de utilização da energia do consumidor e das tarifas reguladas praticadas pela distribuidora local.

Como conclusão, percebemos que, gradativamente, nos últimos anos, as condições objetivas para expansão da oferta de energia vinda da biomassa se deterioraram a ponto de, no momento, não haver perspectivas que permitam competitividade para sua expansão em larga escala no Brasil perante o potencial existente dessa fonte energética. Esperemos que a proposição e a implantação de uma política de longo prazo para o setor permitam uma retomada dos investimentos para essa importante alternativa energética e que, em alguns anos, possamos estar frente a uma realidade bastante diferente da observada atualmente.