Diretor da Bioagência de Fomento de Energia de Biomassa
Op-AA-39
A infraestrutura é, certamente, um dos mais importantes ativos de um País. Sua importância é estratégica em um mundo globalizado, onde os fluxos de capitais se movem em megabytes, produzindo deslocamentos de mercados e de produção em velocidades nunca vistas. Aqueles que priorizaram investimentos em infraestrutura, não apenas atendendo às demandas atuais, mas estando capacitados à absorver significativos incrementos de fluxos comerciais, saem na frente.
Estamos vivendo esse momento com a impressionante recuperação econômica dos Estados Unidos. A utilização em larga escala do shale gas trouxe de volta aos Estados Unidos boa parte dos investimentos em formação bruta de capital, que de lá saíram, nas última décadas, atraídos por menores custos além de suas fronteiras. Algumas empresas foram atraídas por mão de obra farta e barata, incentivos governamentais, proximidade de mercados emergentes, mas poucas foram atraídas, principalmente para os países em desenvolvimento, por terem uma grande infraestrutura, exceção feita à China, que priorizou investimentos nessa área.
Neste momento em que a atratividade dos Estados Unidos começa a se reverter, impulsionada pela drástica redução dos custos de energia, a existência de uma infraestrutura complexa e diversificada, capaz de absorver esse crescimento de forma segura, eficiente e econômica, que, somada a outras vantagens, como mão de obra qualificada e centros de pesquisas de excelência privados e em Universidades por todo o país, atrai de volta vários importantes segmentos industriais.
Olhando para a nossa precária infraestrutura é que vemos o quanto estamos despreparados e suscetíveis aos humores da economia mundial. Nossa atratividade se limita a poucos setores em que ainda somos competitivos. É inadmissível que um país com vocação para o agronegócio se surpreenda com uma safra de mais de 100 milhões de toneladas de grãos e não tenha a capacidade de escoá-la de forma minimamente racional, sem deixar pelo caminho parte dos ganhos que poderiam ser revertidos para toda a sociedade.
A irracionalidade desse processo, que, aliada às concessões desastrosas da malha ferroviária deste País, que segmenta trechos, que não exige investimentos mínimos, que concede direitos sem contrapartidas, em que algumas concessionárias praticam o extrativismo, escolhendo cargas mais rentáveis em detrimento de outras, com uma agência reguladora inoperante, levando a disputas jurídicas intermináveis no curso de seus processos, não resolve os problemas dos embarcadores e traz ganhos espetaculares aos seus operadores.
O impacto dessa infraestrutura inadequada faz a crescente produção de grãos e, consequentemente, a sua necessidade de escoamento atingirem o setor sucroalcooleiro, principalmente o açúcar, ao concorrerem com terminais, vagões e caminhões que transportam os grãos, pagando fretes e tarifas muito mais vantajosas para os operadores.
Há pouco tempo, os diferentes períodos de produção ajustavam essas diferenças. O aumento impressionante da produção, associado à infraestrutura precária, provoca o alongamento da safra de grãos, sobrepondo-se à safra de cana-de-açúcar. As condições econômico-financeiras do setor sucroalcooleiro, sem nos estendermos às razões que levaram a isso, associadas a uma anomalia climática sem precedentes na história recente, fatalmente levarão a uma redução da oferta de açúcar e etanol na próxima safra que se inicia em abril. Não fossem esses fatores, certamente estaríamos colhendo uma safra recorde de produtos e problemas.
Aumentaríamos drasticamente a demanda por transporte rodoviário, decorrente da saturação do modal ferroviário, elevando os valores de fretes, comprometendo as já combalidas margens dos produtos. Infelizmente, em outubro de 2013, um acidente de grandes proporções retirou da cadeia logística um dos mais importantes terminais privados de exportação de açúcar, com uma infraestrutura moderna e eficiente, com grande capacidade de elevação. A reativação desse sistema por completo se dará somente em 2015 e, certamente, trará maiores desafios ao escoamento da nossa produção.
A cadeia logística de exportação de açúcar trabalhará no limite durante esse período, e não haverá folga no sistema. Qualquer imprevisto climático ou operacional, no porto ou na área de produção, provocará interrupção dos fluxos, gerando custos adicionais a todos os agentes da cadeia de suprimento. O etanol, por compartilhar a infraestrutura de combustíveis líquidos, cujo crescimento, nos últimos anos, está muito acima do crescimento do País, e associado à sua enorme extensão territorial, já apresenta problemas bastante complexos. Da mesma forma que boa parte das cargas de nosso País, o modal preferencial para o transporte de combustíveis é o rodoviário.
Os investimentos em obras de grande porte, como terminais de transbordo, ferrovias e dutos, estão estagnados. No passado, em um esforço gigantesco da Petrobras, foi construída uma malha dutoviária para o abastecimento das refinarias e dos grandes centros consumidores. Atualmente, somente o setor privado está construindo um etanolduto, que carece de uma política definitiva para os biocombustíveis na matriz energética brasileira, para poder viabilizar os vultosos investimentos.
A política de combustíveis do País, ou a falta dela, nos levará a um caos no abastecimento de combustíveis. Não temos novos projetos de usinas capazes de aumentar a oferta no curto e no médio prazo. Não temos mais capacidade de refino de gasolina, razão pela qual estamos importando gasolina a preços internacionais e vendendo a preços gerenciados pelo governo, trazendo enormes prejuízos à Petrobras, que foi eleita pelo governo para fazer esse serviço.
As novas refinarias a serem inauguradas nos próximos anos serão destinadas ao refino de óleo diesel, para cobrir o crescente aumento do consumo, que também importamos em larga escala. Com a mudança do perfil da frota nacional de veículos leves, em sua maioria flexíveis, e como a oferta de etanol estará limitada nos próximos anos, a demanda que não é freada por preços realistas da gasolina só tende a crescer, e, como não temos capacidade de refino para atendê-la, seremos cada vez mais importadores de gasolina, fato que as refinarias com capacidade ociosa ao redor do planeta agradecem imensamente.
E com uma infraestrutura inadequada para importar quantidades crescentes de derivados de petróleo, a consequência natural serão os aumentos dos custos e a desotimização de toda a cadeia. No Brasil, os combustíveis derivados de petróleo são produzidos em grandes refinarias, espalhadas pelo País, próximas aos centros de consumos, e distribuídas através de uma complexa cadeia logística, que inclui bases primárias, polidutos, terminais ferrovias, bases secundárias, terminais terrestres, marítimos e fluviais. A importação sistemática de derivados exigirá investimentos em portos e terminais marítimos, que ainda não estão interligados ao sistema atual.
A cadeia de suprimentos do etanol é totalmente diferente da gasolina. A sua produção é pulverizada em diversos estados e municípios do País. Está distante dos grandes centros consumidores. É quase uma logística reversa da gasolina. Por essa razão é que o fomento ao produto, seja ele etanol ou gasolina, não pode ser feito de forma dissociada, deve ser feito de forma coordenada com os investimentos em logística de cada produto.
Se começarmos a investir em logística para importação de derivados, em quase nada esses investimentos serão úteis ao escoamento do etanol, caso haja uma mudança posterior ao incentivo do uso do biocombustível. Da mesma forma que investimentos em logística para o escoamento do etanol, poderão tornar-se elefantes brancos se a decisão for a prioridade para os combustíveis fósseis. Eis uma grande questão de planejamento para os formuladores de políticas públicas de nossa tão malfalada infraestrutura logística.