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Ricardo Busato Carvalho

Diretor Comercial da BP Bunge Bioenergia

OpAA68

Otimismo de um lado e seca do outro: o que esperar da safra 2021/2022?
Iniciamos, em abril, uma nova safra de cana-de-açúcar no Centro-Sul do Brasil, região protagonista global no mercado de açúcar e chave para a matriz energética brasileira. Se, por um lado, temos sinais positivos, que acalentam os produtores brasileiros a seguirem investindo nesse setor desafiador – como é o caso de preços externos e internos atrativos para o açúcar, cotação do dólar em nível interessante para premiar de maneira mais equilibrada os exportadores, valor do etanol em patamares recordes para um período de fim de entressafra –, na outra mão, enfrentamos fatores desafiadores, que podem mexer significativamente com nosso mercado e desequilibrar as vantagens inicialmente descritas.
 
Estamos falando das ameaças da Covid-19 e das adversidades climáticas enfrentadas pelo setor em 2020. Os graves efeitos da pandemia em nossa sociedade demandam uma solução de curto e médio prazos. O temor de que o consumo de combustíveis seja afetado por uma redução abrupta da circulação de pessoas ainda pode ter efeitos consideráveis sobre os preços do etanol, por exemplo. Outro ponto que tem afetado nosso mercado vem dos reflexos do severo período de seca na região Centro-Sul do País em 2020, que afetou não só a cana-de-açúcar, que terá uma safra menor em 2021/2022, mas também outras importantes culturas, como a de soja, o que pode provocar disputas por ativos logísticos e consequente encarecimento no fluxo de exportação de açúcar.

Açúcar:
Falando nas perspectivas do mercado de açúcar, os preços devem continuar sustentados em patamar relativamente alto, como no ano passado, considerando a conversão em reais, de forma a incentivar o Brasil a produzir o máximo do produto e cobrir os déficits produtivos existentes, especialmente ainda como reflexo de quebras de safra recentes, principalmente na Tailândia, mas também em países da América Central, Europa e outros. Após o encerramento da safra da Índia, outro grande player, no primeiro trimestre de 2021,
 
o açúcar tenderá a acompanhar mais diretamente os preços do petróleo, fator-chave para a determinação do mix de produção no Brasil.

Outro fator muito importante para se observar no mercado global de açúcar é o crescimento do programa de etanol na Índia, país que, recentemente, tem produzido superavits relevantes de açúcar, que acabam escoando para o mercado internacional e pressionando os preços da commodity. Apesar de ainda ser um programa pequeno em relação à sua produção local de cana-de-açúcar, o incremento, ano a ano, chama a atenção, e é um caso exemplar de “ganha-ganha” para a sociedade e para os mercados: ganha a população indiana por ter acesso a um combustível mais limpo, ganha o mercado de açúcar global ao reduzir seu 
superavit e ganha o governo indiano por reduzir seu auxílio às exportações.
 
Por outro lado, temos um fator de pressão sobre os custos do açúcar para exportação. Diante do atraso na colheita da soja devido à seca no Centro-Sul, pode haver disputa por ativos logísticos assim que a produção de açúcar brasileira começar a ser enviada para o exterior, agora em 2021, especialmente no principal porto de embarques da oleaginosa e do açúcar, que é o de Santos.
 
Diante desse desafio, estarão mais bem posicionadas as empresas que tenham planejado e contratado, com antecedência e adequadamente, a logística de embarques de suas exportações, pois os custos mais altos ou com eventuais atrasos podem consumir os ganhos com remunerações em patamares mais elevados. Como costuma ser tradicional nesse mercado, quem estiver mais bem preparado para este momento vai acabar obtendo os melhores retornos.
 
Há, ainda, o fato de que a safra 2021/2022, em razão da seca do ano passado, será menor do que a anterior no Centro-Sul, que chegou a 605 milhões de toneladas processadas de cana-de-açúcar, segundo a Unica – União da Indústria da Cana-de-Açúcar. De acordo com projeções de nossa área de inteligência de mercado, a produção na região na atual safra deve ser cerca de 6% menor na comparação com a de 2020/2021, ficando em torno de 570 milhões de toneladas no período, a depender do desenvolvimento do clima ao longo dos próximos meses.
 
Etanol:
Para além do fator pandemia, sabemos que o etanol sofre influência de fatores de grande volatilidade sobre a composição de sua base de preços. Mesmo tomando como referência o valor recorde para um período de final de entressafra, como já pontuamos, projetar a trajetória do comportamento do mercado do biocombustível ao longo de um único ano é um exercício bastante desafiador.

Um fator que tem sustentado os preços do etanol é a retração da produção no Centro-Sul. Após uma redução em 2020/2021, causada pela virada de mix em direção ao açúcar, em 2021/2022, a produção deve sofrer novo revés, desta vez causada pela menor disponibilidade de cana e a permanência de mix voltado ao açúcar.

Some-se a isso uma recuperação na demanda por combustíveis no Brasil, após forte impacto negativo em 2020 pela pandemia, e podemos concluir que os preços de etanol devem permanecer sustentados nesta safra que se inicia – mantidas as paridades internacionais de gasolina, convertidas à nossa moeda local, e mantida a atual política de preços da Petrobras. Em suma, com menor produção e maior demanda, o etanol deve se precificar mais próximo à gasolina em relação a outras safras.

O mercado internacional de etanol também deverá permanecer aquecido, após um ano de incremento de volumes em 2020/2021. Seja por adversidades climáticas na Europa, seja por redução na área plantada de milho nos Estados Unidos, o preço internacional de etanol também passou por forte recuperação ao longo dos últimos meses e deverá permanecer atrativo durante a safra. Apesar disso, a menor disponibilidade de etanol no Brasil pode impedir que o Centro-Sul capture essa oportunidade adicional de exportação.

Temos, ainda, em 2021, boas perspectivas para a contínua evolução do RenovaBio, que teve um primeiro ano bem-sucedido. Nesse sentido, contando com metas crescentes para as distribuidoras de combustíveis, as produtoras de biocombustíveis são desafiadas a otimizar suas operações agroindustriais, investindo em tecnologias de gestão agrícola, logística, indústria e produção para reduzir cada vez mais suas emissões de gases de efeito estufa, tendo direito, assim, a um número maior de CBios, os papéis previstos no programa, cuja unidade negociada equivale à captura de uma tonelada de CO2 da atmosfera, estimulando a produção e uso dos combustíveis mais limpos e renováveis.

Contribuindo para a transição energética rumo a um mundo com mais energia limpa e renovável, e mesmo diante de tantos desafios, o setor sucroenergético tende a ter um grande ano à frente e deve, mais uma vez, cooperar significativamente para o desenvolvimento sustentado do nosso País.