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Antonio de Padua Rodrigues

Diretor Técnico da Unica

Op-AA-44

O desafio da gestão

Coautor: Luciano Rodrigues, Gerente de economia e análise setorial da Unica

Nos últimos quinze anos, o setor sucroenergético vivenciou momentos bastante distintos. Após o longo processo de desregulamentação e a completa liberação dos preços do etanol, do açúcar e da cana-de-açúcar, observou-se, em meados dos anos 2000, um impressionante ciclo de crescimento da produção canavieira no País, a qual chegou a dobrar de tamanho em menos de uma década.

Essa expansão da produção estava calcada essencialmente na consolidação dos veículos flex no Brasil, nos baixos custos de produção do etanol, na perspectiva de aumento do preço internacional do petróleo e no maior interesse mundial pelos biocombustíveis, como forma de combater os efeitos do aquecimento global. Nesse contexto, se observavam previsões extremamente promissoras, e investimentos expressivos foram realizados para a construção de mais de cem novas unidades industriais, além da expansão das empresas tradicionais em operação.

Porém, a partir de 2009, esse cenário promissor começou a ser drasticamente alterado, e, hoje, o setor sucroenergético vivencia a maior crise de sua história, com o fechamento de dezenas de usinas e a perda de milhares de empregos em diversos municípios no interior do País. Uma análise cuidadosa sobre o assunto mostra que a atual crise é fruto de uma série de elementos e evidencia a complexidade vivenciada pelos gestores das empresas dessa indústria. Já em 2008, o setor foi severamente atingido pela crise econômica global, com elevação dos custos financeiros em toda a cadeia produtiva.

Informações extraídas dos demonstrativos contábeis das principais companhias produtoras de açúcar, etanol e bioeletricidade mostram que o nível de endividamento, calculado a partir da relação entre a dívida líquida e o faturamento anual, saltou de 30% antes do ciclo de investimento para mais de 100% após a crise mundial. Além disso, nesse período, passou a ser mais evidente o efeito da política de precificação da gasolina sobre a receita dos produtores de etanol.

O uso do valor do derivado para o controle da inflação promoveu um congelamento de preços do produto por cerca de sete anos, com enormes prejuízos aos agentes do setor sucroenergético. Internamente, também foram observadas alterações importantes na estrutura de produção da indústria canavieira. O crescimento acelerado da moagem ampliou o plantio de cana-de-açúcar em áreas de fronteira, criou dificuldades para a obtenção de mão de obra especializada, elevou os custos de arrendamento de terras e promoveu impacto sobre a eficiência produtiva, especialmente na produtividade agrícola da lavoura.

Em uma situação normal, essa seria uma condição passageira, e a curva de aprendizado levaria ao retorno gradual dos patamares de eficiência e produtividade verificados antes do ciclo de expansão. Entretanto a complicada situação financeira da maior parte das empresas dificultou esse processo. Os baixos preços do etanol, a elevação dos custos financeiros, a ampliação das exigências ambientais, com destaque para o avanço da colheita mecanizada, e o aumento dos gastos trabalhistas impediram a correta aplicação da tecnologia disponível.

Especificamente na área agrícola, a produção eficiente, hoje, passa pelo uso de variedades mais adaptadas ao sistema produtivo, pelo emprego de equipamentos e de máquinas mais modernos, pela adoção de ferramentas de agricultura de precisão com eletrônica embarcada, entre outros.  Adicionalmente, temos observado novas tecnologias de plantio, como a utilização de mudas pré-brotadas e a sinalização de possível mudança tecnológica a partir do desenvolvimento de semente artificial de cana-de-açúcar.

Para os próximos anos, a cana-de-açúcar transgênica resistente a insetos deverá ser uma realidade comercial, e materiais com maior resistência à seca, maior produção de açúcares e maior eficiência fotossintética também poderão surgir. Apesar desse enorme potencial, a situação atual impõe um ambiente desafiador ao setor. Os gestores dessa indústria precisarão equacionar a busca por maior eficiência em um contexto de crise, com a falta de recursos para investimentos, a necessidade de cortes de mão de obra, a presença de um canavial envelhecido, a disponibilidade de frota com idade avançada, entre outros aspectos.

Vivenciamos, portanto, um cenário em que as tecnologias disponíveis e em desenvolvimento indicam a possibilidade de novos ganhos de produtividade e eficiência, mas o caminho a ser percorrido para superar a crise terá grandes obstáculos, introduzidos pela situação financeira e econômica de parcela significativa das empresas. Na maior parte dos casos, o emprego de técnicas e tecnologia adequadas não é limitado pela falta de conhecimento ou capacidade, mas pela carência de recursos. Infelizmente, não existe uma receita única e universal para superar a crise. Assim como já ocorrera no passado, as empresas terão que se reinventar, e isso deve exigir um esforço de todos os agentes envolvidos nessa cadeia.