Me chame no WhatsApp Agora!

Guilherme Rossi Machado Junior

Consultor da G. Rossi Consultoria e Representações

Op-AA-48

A tecnologia provavelmente ajudará
A indústria sucroenergética brasileira enfrenta uma crise de fundo político-financeiro oriunda de falsos incentivos, ganância, má gestão, falta de credibilidade e impunidade que se alastra pelo nosso país, mas, por outro lado, detém uma tecnologia que provavelmente a ajudará a superá-la. No final dos anos 1990, houve uma reestruturação do setor sucroenergético com o uso de tecnologia que trouxe melhorias e aumento no teor de açúcar recuperável e tonelagens acima de três dígitos, em algumas unidades, como vemos hoje. 
 
Nos anos 1970, não se atingiam essas produtividades, e, para um projeto ser viável, elas deveriam estar acima de 70 toneladas de cana por hectare e 95 kg de açúcar por tonelada. O emprego de vinhaça nos canaviais das Usinas Tamoio e Da Pedra era novidade tecnológica na época. As variedades IAC - Instituto Agronômico de Campinas, gerenciadas pelo Dr. Antonio Segalla, e as variedades CB (Campos-Brasil), desenvolvidas na região de Campos-RJ, pelo Dr. Frederico Menezes Veiga, predominavam na época, após um ciclo de variedades importadas da Índia e de outros centros produtores.

No Nordeste, alguns programas de desenvolvimento de cultivares surgiram sem lograr resultados. Em Dumont-SP, a Copereste, tendo à frente o Dr. Franz Brieger, foi uma das primeiras instituições privadas de pesquisa canavieira, encampada, a partir de 1970, pelo Programa de Melhoramento Copersucar, gerenciado pelo Dr. Hermindo Antunes Filho, contando, na época, com 90 usinas filiadas. Foi uma escola de tecnologia da cana-de-açúcar que formou dezenas de consultores, técnicos e diretores de usinas e que, em 2004, converteu-se no atual Centro de Tecnologia Canavieira, com a adesão de novas usinas e cooperativas.

 
O Programa Nacional de Melhoramento de Cana – Planalsucar, também dessa época e liderado pelo Dr. Gilberto Miller Azzi, desenvolveu muita tecnologia e encerrou-se em 1990, sendo encampado pela, hoje, Rede Interuniversitária para o Desenvolvimento do Setor Sucroalcooleiro – Ridesa, integrada por 10 universidades federais que, atualmente, dominam o benchmarking através das variedades RB, no Brasil. O programa de pesquisa mais antigo de cana-de-açúcar, do Instituto Agronômico de Campinas – IAC, sobreviveu por muitos anos estático, mas renasceu e mantém-se em marcha acelerada na pesquisa canavieira.

Na década de 1990, a empresa Canavialis-Allelyx, fundada por melhoristas egressos do ex-Planalsucar, com investimentos do Grupo Votorantim, desenvolveu as variedades CV e foi, depois, adquirida pela Monsanto de Tecnologia, tornando-se a Canavialis Monsanto, com tecnologia de ponta na área de biotecnologia e melhoramento de cana-de-açúcar. Porém não resistiu à falta de perspectivas futuras para ganhos imediatos e retirou seus investimentos do mercado de pesquisa de cana-de-açúcar no Brasil. No auge da entrada de multinacionais na área de pesquisa canavieira, outras empresas visaram à introdução de distintos genes oriundos da biotecnologia em variedades próprias. 

 
Assim, as empresas DuPont, Bayer, Syngenta, Basf e até a estatal Embrapa cogitaram criar seus próprios programas de melhoramento vegetal de cana-de-açúcar, mas, quando o boom de investimento de novas usinas e destilarias (de 2006 a 2008) desacelerou, elas se desestimularam. Além disso, com os novos requisitos da cana-de-açúcar, como o programa de etanol de segunda geração e cogeração para produção de energia elétrica através da biomassa, outras empresas, como GranBio,  Vignis e AgnBio, surgiram com foco em novas tecnologias, por exemplo, para o desenvolvimento de variedades de biomassa.

Os primeiros dez anos do Programa de Melhoramento da Copersucar foram marcados por constantes cobranças das usinas envolvidas e resultaram em 7 novas variedades SP70 e 5 variedades SP71. Também o Planalsucar liberou 5 variedades no Nordeste, ainda naquela década. A variedade NA56-79, introduzida da Argentina pelos cientistas Dr. Paranhos e Dr. Azzi, havia superado as outras por sua precocidade e teor de sacarose, sendo a mais plantada no Brasil, com 45% de área comercial, apesar de suscetível ao carvão. As usinas resistiam em substituí-la, mas, quando saiu de seu ambiente de produção, o carvão aumentou e teve que ser trocada pela série de variedades SP e RB, após um período de divulgação e mostra de resultados. 

 
A recém-liberada SP70-1143, por sua agressividade em solos ácidos e menor fertilidade, começou a tomar lugar desse cultivar argentino nas áreas ocupadas pela cana-de-açúcar, com o Programa Nacional do Álcool  – Proálcool, que possibilitou a implantação de mais de uma centena de novas destilarias para produção de álcool carburante. As variedades SP70-1005 e SP70-1078 a seguiram. Já nos solos mais férteis, a SP70-1284 encontrou seu nicho, assim como as da série 71, principalmente a SP71-1406 e SP71-6163, tendo essa última a vida encurtada pelo aparecimento da Síndrome do Amarelecimento, apesar de produções fantásticas e alto teor de sacarose quando sã.

Algumas outras foram plantadas em locais específicos e produziram bem, como a SP70-3370, SP71-799, SP71-1081 e SP71-3146. O Planalsucar trouxe do Nordeste a RB72454, que se adaptou muito bem ao clima do Centro-Sul e expandiu-se rapidamente por falta de opções, chegando a ser a mais cultivada no Brasil. As do IAC, predominantes antes dos dois novos Programas de Melhoramento, foram a IAC48-65, IAC52-150, IAC51-205 e IAC 58-480, gradualmente substituídas. No Nordeste, por muitos anos, predominou a CB45-3 em áreas de encosta, sendo suplantada pela SP70-1011 e, depois, pela RB92579.

 
Nos anos 1970, o panorama era bem distinto, com problemas diferentes. Alastrava-se a doença do mosaico da cana-de-açúcar, e as variedades, como a CB46-47 e CB40-13, comerciais na época, eram altamente suscetíveis a essa doença, porém aceitas por falta de opção. A variedade CB41-76, resistente à doença, tornou-se predominante, apesar de sua maturação ocorrer somente no meio de safra (julho a setembro). Nessa década, os programas de Melhoramento Copersucar e Planalsucar iniciaram seus trabalhos e conseguiram, com o tempo, substituir as variedades predominantes, como a NA56-79, no Centro-Sul, e a CB45-3, no Norte-Nordeste.

Nos anos 1980, com a abertura de novas fronteiras canavieiras, a variedade SP70-1143 tomou a liderança, por sua capacidade de adaptar-se a solos ácidos e pobres, nas novas áreas ocupadas pela cana-de-açúcar. Atualmente, o panorama varietal é mais voltado aos ambientes de produção, levando-se em conta o solo, o clima e a adaptação para a otimização de produtividade em seus respectivos nichos ecológicos. Embora as opções de variedades sejam amplas, o aumento e a diminuição de pragas e o surgimento de doenças requerem novas exigências do mercado. 

Exemplos concretos foram o de infestações de broca da cana-de-açúcar, controladas pela liberação do parasita Cotesia flavipes, que reapresentaram novas altas infestações quando descuidadas, e o da produção de mudas sadias isentas do raquitismo das soqueiras, por meio do tratamento térmico que, em muitos casos, foi abandonado, aumentando essa bactéria, principalmente com a contaminação pela mecanização de corte. Houve época em que as unidades produtoras montavam seus próprios laboratórios de cultura de tecidos, conhecidos como laboratórios de meristemas, para produção de viveiros mais sadios e vigorosos. 

 
Essa atividade, na maioria dos casos, foi delegada aos produtores particulares de mudas, e, atualmente, é mais utilizada a tecnologia de mudas pré-brotadas (MPB), adquiridas pelas usinas para execução de viveiros primários. Dado o bom resultado, já existem máquinas de plantio dessas mudas, facilitando a execução e condução desses viveiros. Embora a produtividade cresça, os custos também, por conta de novas leis trabalhistas, exigências do meio ambiente e mecanização de corte, fator implantado devido às leis de proibição de queima de canaviais. A colheita é quase totalmente mecanizada, mas o plantio mecanizado, por não ser uma exigência de lei, caminha lentamente nas melhorias e modificações dos equipamentos.

Com a mecanização, há uma diminuição na produtividade pelo espaçamento inadequado e pisoteio das soqueiras, mas novas máquinas e técnicas vêm surgindo para adequar essa realidade. A adesão das usinas ao pagamento por teor de sacarose resultou na substituição de variedades pobres por outras com maior teor, e a implantação dos ambientes de produção, com o mapeamento de todas as usinas brasileiras, proporcionou aos Programas de Melhoramento da cana-de-açúcar recomendar os novos cultivares aos ambientes específicos. Tecnologias de agricultura de precisão, como o GPS e plant pilot, desenvolvidas para outras culturas (exemplo: milho e soja)  e introduzidas na cana-de-açúcar, têm proporcionado bons resultados.

O uso de imagens de satélites para medição da biomassa e previsão de produtividade possibilita correções durante o desenvolvimento do canavial. Algumas técnicas tornam-se moda, são abandonadas e ressurgem depois de algum tempo, como o preparo de solo (mais raso ou mais fundo), a sulcação (linhas duplas, base larga), espaçamento (desde 1,10m até 2,40m), conservação dos solos (com e sem terraços), etc. Na administração das unidades, a gestão de equipe possibilita resultados positivos, utilizando vários indicadores de desempenho que auxiliam nas diferentes atividades desse setor.

O uso de softwares para a área agrícola simplifica e agiliza a correção de problemas. No panorama atual, custos altos e endividamento colocaram em risco dezenas de unidades com ativos em insolvência e regime pré-falimentar (recuperação judicial), e a cana plantada foi transferida para as unidades atuantes, o que fez com que não se diminuísse a produção total. Assim, em 2016, há novas esperanças na recuperação dos preços de mercado. No jargão do campo, ocorrem os anos açucareiros e os anos de produção agrícola, e, pelos prognósticos, a conjuntura atual de fatores é positiva para ambos os aspectos.