Diretor do Instituto Totum de Sustentabilidade
Op-AA-13
O setor produtivo de açúcar e álcool no Brasil, sempre eivado de preconceitos, está passando por um relevante processo de transformação econômica e social. Com o crescente aumento da demanda pelo etanol no mundo, o álcool, vendido, hoje, no mercado de curto prazo, tende a ser comercializado, num futuro não muito distante, por meio de contratos de longo prazo.
Se essa previsão se confirmar, a relação entre o comprador e o vendedor deve se tornar mais constante e duradoura, o que fatalmente exigirá dos produtores mais cuidados, especialmente quanto aos aspectos ambientais e sociais do agronegócio da cana-de-açúcar. A nova perspectiva de relação comercial traz consigo a demanda por um grau de profissionalização muito maior que o estabelecido atualmente.
O comprador exigirá mais do vendedor, por conta da instituição de relacionamentos comerciais, apoiados em bases como parceria, confiança e segurança, já que os contratos serão mais duráveis. Assim, aspectos relacionados à sustentabilidade, que abarcam não apenas as cifras, mas também os âmbitos sociais e ambientais, deixarão de ser artigo de luxo. Deverão se tornar, de parte a parte, uma obrigação.
O Brasil, no papel de maior produtor e exportador de açúcar e de álcool no mundo, observa atento às movimentações desse segmento e deve começar a se preparar para o futuro, acompanhando as demandas desse mercado. A preocupação é legítima. Afinal, os próximos anos serão decisivos para o êxito da cana-de-açúcar. Como será o mercado mundial desses produtos nos próximos anos?
Com o estabelecimento de relações comerciais mais estáveis e duráveis, o comprador terá formas de requerer das empresas produtoras, sistemas de gestão com mais qualidade e eficiência, e exigir estudos de sustentabilidade, no que diz respeito à manutenção e à melhoria na produção de etanol, na área agrícola e industrial.
Podem ser contempladas ainda preocupações como emprego e renda nas regiões carentes, boas condições de trabalho e funcionários regularizados, assim como requisitos de excelência no uso do solo, diminuição e controle de água, tratamento dos sistemas, entre outros. Está na hora dos empresários da indústria do açúcar e do álcool apagarem a sombra da exploração da mão-de-obra infantil e do subemprego, que rondam esse setor da economia.
Os agentes precisam, ainda, jogar luz ao desenvolvimento das comunidades locais, com melhor educação e saúde para seus funcionários, prevendo um sistema de produção sustentável. Pois, nesse cenário que se avizinha, sobressairão as empresas que atenderem ao mercado mais desenvolvido, o qual estará mais presente no dia-a-dia das usinas e das indústrias e, mais exigente.
A questão que se levanta, entretanto, é se será necessária a atuação do Estado, como órgão coordenador desse movimento. Antevendo a existência de um mercado de longo prazo para a comercialização do álcool e as possíveis exigências dessa classe, é fundamental que as empresas do setor organizem-se e se auto-regulem, a fim de mostrar essa capacitação ao mundo, sem esperar por iniciativas governamentais.
Tomada esta decisão, o passo seguinte é a busca por indicadores de sustentabilidade globais, para a adoção e certificação de processos transparentes e eficientes, que estejam comprometidos com as responsabilidades social e ambiental, não só na produção, mas também no processamento e na comercialização da cana-de-açúcar.
As práticas de gestão empresarial relacionadas à sustentabilidade, que aliam o desempenho financeiro aodesenvolvimento social e à preservação do meio ambiente, transformaram-se em sinônimo de competitividade nos negócios. Sem a adoção de políticas consistentes nesse campo, as empresas arriscam-se a perder grandes negócios, além de comprometerem sua imagem e seu acesso ao crédito e investimentos, principalmente em mercados globais.
O reflexo dessa nova ordem no mundo corporativo é a necessidade de se atribuir aos programas de adequação de processos produtivos, as certificações de qualidade, meio ambiente, requisitos de segurança, gestão de riscos e responsabilidade social, e às normas relativas à sustentabilidade, a importância que merecem. É o que aconteceu com a indústria do café no Brasil. Esse setor, um dos que mais tem contribuído para a sustentabilidade das próprias atividades, é um exemplo de auto-regulamentação no País.
A Associação Brasileira da Indústria do Café, ABIC, lançou, recentemente, o Programa Cafés Sustentáveis do Brasil, PCS, que visa, por meio de parcerias entre a indústria e os cafeicultores e suas cooperativas, promover a sustentabilidade e a qualidade em toda a cadeia produtiva da Indústria do café, desde o processo agrícola, até o processo industrial na torrefação.
Sustentabilidade é, indubitavelmente, o termo que definirá a nova situação do setor de açúcar e álcool. Temas intrínsecos a esse conceito, como consumo consciente, preservação do meio ambiente, redução do uso de recursos naturais e de agentes poluidores, valorização social e econômica, garantia de melhores condições de vida, de trabalho, de escolarização e de cidadania aos funcionários devem constar na agenda dos players desse setor, sob o risco de perderem espaço no novo mercado sucroalcooleiro.