O mundo passa por profundas transformações e, com o setor sucroenergético, não é diferente. As mudanças significativas refletiram diretamente em todos os segmentos da cadeia produtiva. O cenário perfeito para um resultado de produtividade positivo – custo menor do que a receita final – também está atrelado às questões políticas e econômicas favoráveis. Manter esse cenário, diante de tamanha intempestividade política e econômica, é uma tarefa complicada e desafiadora.
Se a crise é necessária para com ela surgir o crescimento e o amadurecimento, esperamos que assim seja. Nunca esteve tão claro na mente de nós brasileiros esse “momento de reconstrução”. Brasileiros tornaram-se mais politizados, discutem medidas políticas, vão às ruas; a justiça, ora digna, ora indigna, também se faz notícia; a sociedade nunca esteve tão presente sob esses aspectos como nos dias de hoje.
Interligar interesses empresariais, setoriais e nacionais é, com certeza, um dos principais desafios do governo e das organizações. Mas como estão as organizações representativas para atuar nesse contexto? Embora falemos de uma sociedade que se organiza, falamos também de parte dela estagnada, sustentada por comportamentos individualistas, que pouco se envolve nas lutas e age com um certo conforto em aproveitar-se das conquistas do esforço coletivo.
Infelizmente, essa postura não dialoga mais com as atuais demandas de diversos setores da economia e da vida social do País. É nesse contexto que trago a importância da valorização das organizações de classe, peça-chave na interlocução desses objetivos. O cenário está mudado. Assistimos a multinacionais de insumos agrícolas passarem por fusões e aquisições.
Conglomerados econômicos de usinas reorganizando-se, desativando plantas industriais, comprando plantas com o intuito de agregar matéria-prima e racionalizar os recursos para otimizar estrutura, sempre no sentido de agregar potencial para enfrentar a vulnerabilidade política e econômica − o que passamos nos últimos três anos.
Nunca se falou tanto sobre a importância da profissionalização. Essa é uma das questões-chave para enfrentar o momento pelo qual estamos passando. Nós, produtores de cana e associações representativas, deparamo-nos com uma emergência: entendermos o caminho da racionalização como estratégia competitiva, estarmos prontos para fazer frente ao cenário descrito.
Enquanto produtores de cana e presidente da Canaoeste – Associação dos Plantadores de Cana do Oeste do Estado de São Paulo, percebemos a importância dessa estruturação e investimos em gestão profissionalizada, com o propósito de organizar a associação para o futuro. Ainda assim, mantivemos o conservadorismo necessário de uma associação sólida que cresce há mais de 70 anos. Essa oxigenação permitiu novos horizontes, principalmente nas áreas tecnológica e de racionalização de recursos.
As organizações, além de sólidas, precisam estar preparadas para dialogar com o governo; precisamos de direção, de maneira que a ação proposta em conjunto torna o projeto exequível, partindo da premissa de que todos tomaram ciência das responsabilidades durante a formatação e as estratégias do programa. A exemplo do que passamos com a restruturação da Orplana – Organização de Plantadores de Cana da Região Centro-Sul do Brasil, com a premissa básica de estruturar a organização para contemplar os anseios da classe na esfera política e institucional.
A reconstrução do Brasil, sem dúvida, dar-se-á através da Parceria Público-Privada, contudo é necessário alinhar a comunicação e propor soluções em conjunto. Vamos a um exemplo: se o foco será o cumprimento da meta de descarbonização proposta no Acordo de Paris, acordo que prevê percentual mínimo de 23% para o uso de energias renováveis até o ano de 2030, significa incrementarmos a produção de 30 para 50 bilhões de litros de etanol, necessariamente um incremento significativo na produção de matéria-prima, situação oposta das últimas três safras no que se refere à produtividade agrícola.
Por vezes, a interdependência das ações dificulta o pontapé inicial para que a reconstrução aconteça. Para haver produto, é necessário haver matéria-prima. Nosso ciclo canavieiro é de 6 a 7 anos, com a implantação. Nesse caso, não teremos ao menos dois ciclos completos. Para nós, setor produtivo, 2030 é amanhã.
Passando pela área industrial, como a produção será alcançada? Quanto terá de investimento? Quais as políticas que garantirão que o investimento não será um tiro no escuro? Todo o investimento é amortizado a longo prazo. Quando falamos sobre as responsabilidades de cada um dos atores nessa construção, precisamos alinhar antes qual a segurança de cada um de que o combinado será cumprido.
Nós já mostramos que conseguimos aumentar a produção, mas, para isso, é necessário que essa engrenagem inicial (a segurança a longo prazo) coloque todas as outras em movimento. Esta é a hora de nos unirmos para exercitarmos toda a sabedoria acumulada ao longo desses anos e vivermos o que realmente aprendemos. A situação crítica está a nos testar para mostrarmos que o que defendemos não é apenas teoria, e sim que há uma construção sólida que nos permitirá a reconstrução que o setor merece.