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Paulo Alexandre Monteiro de Figueiredo

Professor da Faculdade de Ciências Agrárias e Tecnológicas da Unesp de Dracena

OpAA71

Efeitos do estresse hídrico na cana-de-açúcar
Nos últimos anos, o setor sucroenergético tem exibido uma competente expansão territorial por todo o País, o que tem propiciado o cultivo da cana-de-açúcar em ambientes mais restritivos, que, além de apresentarem baixa fertilidade natural, exibem chuvas irregulares, muitas vezes inferiores à necessidade mínima da cultura, que gravita em torno de 1200 milímetros anuais bem distribuídos.
 
A água é considerada um solvente universal, que atua como veículo para as constantes trocas de solutos que ocorrem de maneira contínua nos organismos vivos. Também participa ativamente das reações de fotossíntese, respiração, divisão celular, dentre muitos outros processos metabólicos vitais. Porém, quando as plantas, principalmente as mais jovens, são expostas ao estresse hídrico, inúmeras reações são desencadeadas, provocando diferentes respostas fisiológicas nos tecidos e órgãos vegetais, conforme demonstrado na figura em destaque. 

A espessura das setas ilustra a magnitude dos processos. À medida que o potencial hídrico diminui, a planta se desidrata ainda mais, levando ao acúmulo de ácido abscísico e a demais solutos na planta, o que prejudica a abertura dos estômatos, poros que funcionam como local de entrada de gás carbônico, diminuindo a fotossíntese. A condutância, que representa a passagem de gás carbônico pelas fendas estomáticas, também diminui, impactando a formação de carboidratos pela planta. Enfim, sob déficit hídrico, principalmente acentuado, fenômenos como fotossíntese e expansão celular são duramente prejudicados.  

Na cana-de-açúcar, é importante destacar que, após o plantio das mudas ou o corte dos colmos por ocasião da colheita, é iniciado o crescimento e o desenvolvimento das raízes e da parte aérea das plantas, a partir do intumescimento das gemas presentes nos segmentos do caule. Essas brotações são alimentadas pelas reservas nutritivas encontradas no material de origem, até que ocorra a 
autossuficiência nutricional do complexo vegetativo. 

Dessa maneira, é fundamental que a planta emita uma quantidade de folhas capaz de garantir um adequado suporte fotossintético para a produção de fotoassimilados, fundamentais no decorrer do ciclo de vida vegetal. Sendo assim, havendo umidade, mais gemas presentes abaixo do solo, e que estão contidas no rizoma, também brotarão. Por outro lado, havendo falta de umidade, essas touceiras passam a exibir um menor perfilhamento, quando comparadas com aquelas plantadas no período de maior disponibilidade de água no sistema solo-planta.

Ainda, sob restrição hídrica, as raízes têm menores condições de formação e expansão, o que vai ser refletido na absorção de nutrientes, peças fundamentais para o cumprimento das incontáveis atividades funcionais. Nesse sentido, por muitas vezes, as unidades sucroenergéticas e os fornecedores da matéria-prima são obrigados a irrigar as lavouras; caso contrário, correm o risco de ter que renovar precocemente os canaviais.

Na cana-de-açúcar, a transpiração tende a aumentar gradativamente nos seis primeiros meses de desenvolvimento, pois as plantas vão formando folhas cada vez mais largas e compridas. Então, quanto maior a superfície de exposição, maior a perda de umidade e, consequentemente, maior a necessidade de reposição da mesma. Contudo, lavouras cultivadas em boas condições de umidade têm maior possibilidade de aproveitamento dos insumos disponíveis, permitindo uma melhor produtividade agroindustrial.

Em meados da safra, com o avanço do ciclo fenológico, déficits hídricos mais pronunciados podem levar as plantas à isoporização, representada pela desidratação intensa e irreversível dos parênquimas, principal local responsável pelo armazenamento da sacarose nos colmos. A isoporização, também conhecida como “chochamento”, geralmente ocorre mais intensamente em ambientes menos favoráveis, que apresentam solos mais arenosos e que possuem menor capacidade de armazenamento de água. A isoporização pode ser agravada pela incidência de ventos, que desidratam ainda mais os tecidos vegetais e intensificam a evapotranspiração, que representa a evaporação da água do solo mais a transpiração das plantas. 

No entanto, algumas estratégias podem minimizar os efeitos do estresse hídrico e das injúrias por dessecação das plantas. Uma delas é o fornecimento de etileno às plantas, por meio da aplicação foliar de etefon, ou ácido fosfônico, em lavouras com idade aproximada entre oito a dez meses. O resultado é uma menor incidência da isoporização dos colmos, pois o etileno estimula a atuação de genes que levam ao aparecimento de pelos radiculares.

Esses pelos possuem maior capacidade de absorção de água e nutrientes, pois apresentam uma menor espessura de parede celular. Além disso, plantas de cana-de-açúcar tratadas com etefon desenvolvem maior número e dimensão de células buliformes, fundamentais na retenção de água nos tecidos foliares. Esse é um fato determinante para a cana-de-açúcar, pois folhas abastecidas adequadamente com água sintetizam aproximadamente dez vezes mais sacarose, quando comparadas com aquelas afetadas pelo déficit hídrico.

Outra importante alternativa quanto à proteção das plantas contra o estresse hídrico é o fornecimento de solutos protetores, como é o caso de prolina e glicinabetaína. Esses compostos protegem as plantas contra subprodutos tóxicos formados durante os períodos de escassez de água. 
 
Estudos têm demonstrado que produtos fungicidas à base de estrobilurinas, quando aplicados no início do período de grande crescimento e desenvolvimento da cana-de-açúcar, reduzem temporariamente o gasto de energia e promovem diversas alterações positivas quanto ao metabolismo, resultando em maior acúmulo de matéria seca, expressa em toneladas de colmos por hectare no canaviais.

Na retomada do canavial após a ocorrência do estresse hídrico, é interessante o fornecimento de hormônios vegetais, como forma de estímulo para a formação de novas células. Também conhecidos como reguladores de crescimento, os hormônios vegetais mais utilizados são: auxinas, citocininas e giberelinas. Essa prática, ainda, não é tão presente nas lavouras canavieiras, mas tem aumentado cada vez mais, pois a presença dos hormônios em momentos adequados pode significar uma grande possibilidade de incremento para as plantas. 

Por fim, após um período de estresse hídrico e por ocasião da retomada de crescimento, de maneira geral, é importante que as plantas recebam uma nutrição foliar complementar, baseada principalmente em micronutrientes, pois muitos atuam como ativadores enzimáticos ou componentes celulares. Para isso, é fundamental o conhecimento das condições nutricionais das lavouras especificamente, e em todas as suas fases fenológicas. Dentre os muitos nutrientes importantes, devem ser destacadas as presenças do nitrogênio, essencial para a formação das proteínas, e do magnésio, elemento constituinte da clorofila, pigmento essencial para a fotossíntese.

Mas é importante lembrar que o fornecimento de produtos às lavouras sempre deve ser realizado quando as plantas se encontram hidratadas e em condições mínimas de metabolização.