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Oliver Henniges

Professor do Departamento de Agricultura Econômica da Universidade de Hohenheim, Stuttgart, Alemanha

Op-AA-11

A competitividade internacional do bioetanol na Alemanha

Na União Européia e na Alemanha, a produção e utilização do bioetanol como combustível alternativo vem sendo discutida somente há poucos anos. Em contrapartida, outros países já produzem bioetanol em grande escala e a baixos custos. O levantamento dos custos de produção, em regiões selecionadas, foi o tema de uma pesquisa feita pela Universidade de Hohenheim, em Stuttgart, na Alemanha.

Para isso, foram comparados os tamanhos das instalações e as atribuições de custos dos processos produtivos na União Européia, Brasil, EUA, Austrália, Tailândia e China. A título de exemplo, comparamos a competitividade da produção na Alemanha com a do Brasil, maior exportador de bioetanol do mundo.

Custos de produção: Se comparada mundialmente, a produção de bioetanol na Europa é a de maior custo de todas, conforme demonstra o gráfico em destaque.

Com o preço de produção do trigo a 100 EUR/ton e o da beterraba a 28 EUR/ton, os custos líquidos de produção na União Européia são de aproximadamente 45 Euros por hectolitro, após a dedução de todos os créditos referentes a subprodutos. Supondo-se o trigo ao preço de 150 EUR/ton, os custos aumentam em mais 13 EUR/hl. Devido a condições climáticas e econômicas favoráveis, o Brasil está em condições de produzir a um custo de aproximadamente 17 EUR/hl, ou seja, ao custo mais baixo do mundo.

O preço de 11 EUR/hl de bioetanol, pago pela cana-de-açúcar, matéria-prima utilizada na produção, é bastante baixo. Em adição, os custos de produção são mantidos baixos, visto que se utiliza o bagaço da cana para a geração da energia necessária para o processo. Além disso, o Brasil conta com uma experiência de mais de 30 anos na produção de bioetanol.

Certamente, o Brasil manterá, também, a longo prazo, a sua posição de competidor dominante no mercado internacional de açúcar e de bioetanol, dado que ainda detém um grande potencial de expansão de sua capacidade produtiva de cana-de-açúcar, mesmo que os custos marginais subam nestas áreas de expansão. Devido a uma variedade de subsídios governamentais em todas as etapas da cadeia de produção e de processamento, os EUA superaram o Brasil como o maior produtor de bioetanol do mundo, em 2005.

Ao contrário do Brasil, a produção de bioetanol dos EUA deriva do milho e não está voltada para a exportação. No momento, ela é utilizada para substituir os aditivos combustíveis convencionais no aumento da octanagem. A 26 EUR/hl, o custo de produção de bioetanol está bem abaixo do custo europeu, fato este que, basicamente, resulta da taxa de câmbio de 1,20 USD/EUR e do preço do milho a 66 EUR/ton.

Tanto a Tailândia como a Austrália dispõem de cana-de-açúcar, matéria-prima barata para a produção de bioetanol. Contudo, sua capacidade de produção atual é destinada, principalmente, à exportação para os mercados dos países do sudeste asiático. O aumento do preço do açúcar, ocorrido no final de 2005, reduziu a disposição destes dois países expor-tadores de açúcar de se aventurarem na produção de bioetanol. Porém, a 21 EUR/hl, os custos de produção na Tailândia são bem mais reduzidos do que na Austrália, a 27 EUR/hl.


E o maior grau de competiti-vidade, em relação aos combustíveis fósseis, torna a produção de bioetanol na Tailândia bastante provável. A China, que dispõe das maiores usinas de processamento do mundo, somente é capaz de produzir o bioetanol pelo alto preço de 31 EUR/hl, resultante do preço comparativamente alto do milho. O aumento da demanda por alimentos neste país leva a crer que a produção não será competitiva, a longo prazo.

Preços de importação: Na Alemanha, tanto a isenção do imposto sobre combustíveis, em vigor até 2006, bem como a incorporação obrigatória de bioetanol nos combustíveis de origem fóssil, prevista por lei e acoplada a altas multas em caso de infração, garantem a utilização do produto no país, apesar dos custos de produção comparativamente altos, em relação aos combustíveis fósseis.

Isso também se aplica à importação de bioetanol mais barato, cuja competitividade tem sido limitada, até então, pelas taxas de importação da UE e pelos altos preços do produto no mercado internacional.

O preço mínimo do etanol hidratado brasileiro é estabelecido da seguinte forma, para o ano de 2006: Como base de cálculo, supõe-se 2 EUR/hl como custo médio de transporte no estado de São Paulo - uma das maiores regiões produtoras de cana-de-açúcar no sudeste do país, até o porto de Santos.

Visto se tratar de uma carga líquida e explosiva, acrescentam-se os custos de transporte, comparativamente altos de 8 EUR/hl, taxas portuárias inclusas. O resultado é um preço de importação europeu de 27,5 EUR/hl. A tarifa aduaneira de 19,2 EUR/hl, para o bioetanol não-desnaturado, eleva os custos para 46,7 EUR/hl até a refinaria em Hamburgo, onde o produto, eventualmente, teria de passar por mais um processo de desidratação, para torná-lo anidro.

Do ponto de vista técnico, não é necessário dar somente a aprovação ao bioetanol não-desnaturado como combustível alternativo. Esta aprovação nada mais é do que uma medida de segurança, para que se aplique a taxa de importação mais alta de 19,2EUR/hl, em detrimento da taxa mais reduzida de 10,2 EUR/hl, pelo bioetanol desnaturado, que, teoricamente, também poderia ser utilizado. Este cálculo baseia-se apenas nos custos incidentes e ainda não contém a margem de lucro dos produtores brasileiros.

Tomando-se por base o preço de mercado do bioetanol hidratado, no valor de 55 USD/hl, valor este pago em meados de 2006, no Brasil, o custo até a chegada na refinaria européia subiria para 75 EUR/hl. Este preço corresponde ao preço mínimo de importação do bioetanol brasileiro em meados de 2006, pois, além dos vínculos contratuais, não há nenhum incentivo para os produtores nacionais de bioetanol para que vendam o combustível alternativo por um preço menor, uma vez que a demanda pelo produto no mercado interno é bastante alta e a não utilização do mesmo neste mercado acarreta a sua substituição por combustíveis fósseis importados.

O cálculo mostra que a pressão competitiva sobre os produtores de bioetanol alemães, causada pela importação de bioetanol oriundo do Brasil, foi relativamente amena em 2006. Mas, nem sempre este será o caso. Há, por exemplo, cálculos relativos ao início do ano de 2004. Naquela época, o preço de mercado do bioetanol no Brasil atingiu, 12 EUR/hl, um nível abaixo dos custos de produção. Além disso, os preços de transporte marítimo também eram bem inferiores aos de 2006.

Nestas condições, o preço mínimo de importação era de 37 EUR/hl, incluindo tarifas de importação, e, portanto, estava abaixo dos custos do bioetanol produzido na Alemanha (incluindo o transporte), de 48 EUR/hl, em 2005. A tarifa de importação incidente sobre o etanol não-desnaturado, no valor de 19,2 EUR/hl, foi incluída nos presentes cálculos, visto ser este tipo de etanol o único aprovado como combustível alternativo na Alemanha.

A aprovação do etanol desnaturado teria, por conseqüência, uma tarifa de importação européia de apenas 10,2 EUR/hl. Sob as condições vigentes em meados de 2004, isto significaria que o preço de importação seria de apenas 28 EUR/hl. Se, teoricamente, a tarifa de importação fosse extinta por completo, seria possível, supondo-se o cenário extremo e pouco provável de baixos preços de mercado, fornecer o produto brasileiro para a Alemanha, ao preço de, aproximadamente, 18 EUR/hl.

Mesmo assumindo o preço do trigo a 100 EUR/ton, como ocorreu em 2005, os custos de produção na Alemanha são basicamente o dobro. Se o preço do trigo subir para 150 EUR/ton, como ocorreu no outono do ano de 2006, a produção de bioetanol alemã triplicaria, em comparação à brasileira. Contudo, os preços calculados são mais de caráter hipotético, pois devido à concorrência do Brasil, o preço do bioetanol permanecerá relativamente baixo, apesar das boas perspectivas de mercado.

Além do mais, os produtores de bioetanol, que, por sua vez, têm um grande interesse em amortizar seus investimentos em curto prazo de tempo, dado o alto risco do mercado, obviamente pagarão o mínimo possível pela matéria-prima. Portanto, um aumento do preço da matéria-prima agrícola não será viável, se não houver um aumento generalizado na demanda pelo produto. No mercado energético, a agricultura também é um mero aceitador de preço, sem influência sobre o mesmo.

Perspectiva: A demanda de bioetanol na Alemanha está assegurada, devido à incorporação obrigatória de biocombustíveis, prevista por lei. Porém, a competitividade da produção de bioetanol na Alemanha também dependerá, no futuro, entre outros fatores, consideravelmente, do preço de importação do bioetanol, e, por fim, do preço do petróleo.

Isso significa, que além da necessidade de aumentar o rendimento e a qualidade das plantações de matéria-prima para a produção de bioetanol, serão necessários métodos mais eficientes de processamento e de transporte, ao custo mais baixo possível. Para cumprir a exigência de utilizar biocombustíveis, como está ocorrendo na Alemanha, desde o início deste ano, a indústria petrolífera adquirirá o bioetanol pelo preço mais baixo possível. Se o preço do bioetanol no Brasil for mais baixo, como ocorreu em 2004, o bioetanol importado terá uma vantagem competitiva dominante, em relação ao bioetanol europeu.

Se a produção de bioetanol na Alemanha e na Europa tiver de competir no mercado interno e contribuir para o valor adicionado do país, mesmo estando o preço do petróleo mais baixo do que em 2005 e 2006, quando atingiu preços recordes, os mecanismos de proteção teriam de ser mantidos. Contudo, se a razão para a utilização dos biocombustíveis for de ordem político-ambietal ou energética, não há como justificar as barreiras protecionistas européias.