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Eduardo Pereira de Carvalho

Diretor da Expressão

Op-AA-23

A internacionalização dos meios de produção de açúcar e etanol no Brasil

Há, hoje, uma presença crescente de capitais estrangeiros no setor. Nada de novo. Nos 478 anos da história da cana no País, isso já ocorreu muitas vezes. Não indo longe, lembro a presença da Dreyfus desde 2000, seguida pela entrada da Tereos, os passos iniciais da Cargill, as iniciativas importantes da ADM, da Bunge, da BP, da Nobel, da Abengoa, de George Soros, de indianos e outros, em passado mais recente.

E o sistema financeiro internacional, no período pré-crise, identificando e apoiando quase uma dúzia de projetos de investimentos no setor, nem todos, por enquanto, histórias de sucesso. Paralelamente, capitais nacionais de monta também decidiram aí investir. A presença relevante da Cosan (e seu espetacular lance com a chegada da Shell), São Martinho e Guarani, no mercado de capitais, completa o presente quadro, em adição à preanunciada nacionalização da Brenco pela ETH.

Tal discussão envolve, além de razões de ordem econômica, muitas de natureza política. Não entro nessa seara. O País é, reconhecidamente, um dos grandes receptores de investimentos diretos de capitais estrangeiros, presentes em praticamente todos os campos e setores de nossa economia, com benefícios das mais variadas ordens.

Por que não no álcool e açúcar? Construímos, nos últimos 30 anos – dos cem milhões de toneladas de cana esmagadas, no final dos anos 70, aos práticos 600 milhões de toneladas dessa última safra –, a mais eficiente, dinâmica e inovadora máquina de cultivo e transformação industrial de açúcar e álcool de que se tem notícia em todo o mundo. 

Até alguns anos atrás, a união do empreendedorismo caboclo (por vezes com sotaque italiano) com o decisivo apoio governamental foi capaz de criar toda essa riqueza. Hoje, não mais. Por quê? Insuficiência de EBITDA, de geração de caixa, de criação de excedente. Os volumes dos investimentos e a natureza da operação tornaram-se extremamente intensivos em capital, tanto no campo quanto na indústria.

Os volumes de recursos necessários para sua continuada expansão – no mundo das commodities, fator indispensável de sobrevivência – cresceram de forma antes inimaginável. E o fluxo de caixa normal da atividade, mesmo em anos conjunturalmente favoráveis, não permite mais o autofinanciamento de seu crescimento, mesmo com o uso alavancado dos modernos instrumentos creditícios, financeiros e comerciais.

É necessário injeção de novos capitais de fora, uma vez que grande número dos atuais proprietários de usinas está com praticamente todo seu patrimônio (e, por vezes, muito mais) comprometido com as operações existentes. Vem daí fortíssima razão econômica para a entrada de recursos externos. Entendamos bem: dinheiro externo ao setor, seja estrangeiro, seja do mercado nacional de capitais, seja de outras áreas de nossa economia. Não é o único motivo.

Tais capitais trazem consigo, muitas vezes, novas tecnologias, novos modelos de governança, novos métodos de gestão, novos mercados. Provocam fertilização cruzada. Todos reconhecemos seus fantásticos resultados potenciais. Melhorias contínuas de performance, de eficiência, de inovação e as consequentes ondas de renovações resultantes.

Não se trata de substituição dos atuais empresários. Continuam eles a ter papel relevante. O setor continuará pulverizado, por maior e mais acelerado que seja o processo de concentração. Há algo inerente à atividade que permite a sobrevivência de unidades isoladas e de menor tamanho relativo. Onde o nível de excelência da gestão prepondere.

Onde a qualidade das terras seja excepcional. Onde a dificílima integração campo-indústria seja modelar. Onde o nível tecnológico, especialmente no campo – muito mais difícil de ser gerido do que na indústria –, seja de primeira. E onde o nível de capitalização – ponto essencial – seja adequado. Nada impedirá, no entanto, a continuidade do processo de concentração, por todas as razões mencionadas. 

Os investimentos estrangeiros são parte integrante desse quadro. Como Darwin nos dizia, com enorme sabedoria, sobreviverão os mais aptos, ou melhor, aqueles mais capazes de se adaptar às novas condições. O setor é exemplo de enorme resiliência. Vale apontar, porém, que capital estrangeiro por si só não é apólice de seguro contra soberba, quebras, pobre gestão e fraco desempenho. Basta olhar nosso entorno. Sem essa consolidação, a péssima comercialização interna do etanol – um de nossos grandes problemas, dada a grande pulverização da produção – permanecerá como um importante obstáculo ao pleno desenvolvimento do setor.