A demanda mundial por energia é maior do que nunca. Oscilações no preço do petróleo, recursos naturais limitados e a preocupação com a preservação do meio ambiente têm feito com que governos e consumidores optem por fontes de energias renováveis que atendam a suas necessidades, porém com o mínimo de impacto ambiental.
A bioenergia, que, em termos gerais, se refere a qualquer forma de energia produzida a partir de materiais derivados de fontes biológicas – e que engloba o etanol de cana, de amido ou celulósico, além de biodiesel e biogás –, está no centro dessa escolha sustentável. Sabemos que, atualmente, na cadeia de bioenergia, os biocombustíveis são a opção mais promissora, por exemplo, para a mitigação de emissões de CO2, tendo, ainda, um papel importante no crescimento econômico, na geração de empregos e nas questões de segurança energética.
É exatamente nesse contexto que se insere a indústria sucroalcooleira do Brasil, um segmento que vem, nos últimos anos, enfrentando desafios de ordem política, econômica e ambiental. Contudo esse é um setor conhecido por sua resiliência e capacidade de superação de dificuldades e que pode, em minha opinião, contar com o etanol celulósico para voltar a crescer. Sabemos que o etanol celulósico está em fase de validação e maturação, globalmente e no Brasil.
Por aqui, empresas como GranBio e Raízen já deram início à produção de etanol celulósico em escala comercial, liderando essa primeira onda de investimentos. Não é segredo que o etanol celulósico mobiliza inciativas para o aproveitamento sustentável e lucrativo da cana e seus resíduos, que se traduzem em bons negócios para as usinas de primeira geração. Bagaço, palha e vinhaça, por exemplo, são usados para produzir combustível e outros bioprodutos, colocando a indústria sucroalcooleira em um caminho competitivo.
O etanol celulósico dá às usinas de primeira geração a oportunidade de aumento de produção e maximização do retorno no capital investido, para os ativos existentes de plantas, bem como hectares de cana plantados. As usinas de etanol celulósico em operação têm que provar que podem funcionar de maneira consistente e na capacidade nominal total. O que vem depois são questões relacionadas à sua viabilidade econômica na comparação com a produção de outros biocombustíveis e com o petróleo. Vai levar um tempo para a indústria assimilar e validar tudo isso, e não veremos centenas de projetos, mas os poucos que estão aí são bastante sólidos e em fase de maturação.
Tirar esses projetos do papel e torná-los realidade é um grande passo. Há muito aprendizado nesse processo, e muitos desafios já foram superados. Temos visto empresas investindo e encontrando desafios, mas elas estão ganhando corpo, crescendo lentamente, porém com segurança. Sabemos que outras companhias e provedores de tecnologia logo optarão pelo etanol celulósico e que, em breve, se juntarão ao grupo de seis ou sete pioneiros que já têm unidades em funcionamento.
Nesse momento, os principais desafios são relacionados a ajustes de máquinas e equipamentos. E estamos cem por cento comprometidos em desatar esses nós da indústria juntamente com nossos parceiros. Eu acho que uma das coisas que mais precisamos com relação ao etanol celulósico é avaliar como a indústria sucroalcooleira tem trabalhado em conjunto. A Novozymes tem encorajado a união de todos os integrantes dessa indústria para a geração de impactos cada vez mais positivos.
Para isso, precisamos de uma base forte, precisamos do engajamento de cada um, para acabarmos com os gargalos e vencermos os desafios. Adicione-se a isso a necessidade de a indústria produzir uma comunicação mais consistente em torno do etanol celulósico. Para muito além das dificuldades técnicas, precisamos lembrar aos investidores, governo, imprensa e outros públicos de interesse que o etanol celulósico é pensado em longo prazo, em termos econômicos e ambientais bastante robustos, independente da oscilação do preço do petróleo.
É importante lembrar-lhes, por exemplo, que, de acordo com estimativas da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico, da Agência Internacional de Energia e FMI, em 2013, o planeta atingiu a marca de 760 milhões de carros e que essa cifra dobraria para 1,4 bilhão de veículos em 2030, chegando a 2,9 bilhões de carros em 2050. Imaginem uma parcela desses veículos rodando com biocombustíveis e redução na quantidade de CO2 emitida.
As empresas apostam no etanol celulósico com segurança e visão de longo prazo. Reflexo disso é que continuamos a ver bancos e consórcios financiando projetos, e empresas fazendo investimentos. Na comparação com outras novas tecnologias de indústrias tão jovens quanto a do etanol celulósico, podemos dizer que estamos seguindo um padrão de desenvolvimento completamente normal.
A Novozymes e seus parceiros têm trabalhado para o desenvolvimento do etanol celulósico há quase quinze anos e já testemunharam as variações e mudanças causadas pela flutuação do preço do petróleo. Independente disso, a Novozymes reafirma seu compromisso de longo prazo, que está alinhado com a demanda global de um combustível limpo, renovável e sustentável para uso no transporte. Afinal de contas, quem pode prever como se comportará o petróleo em 2025, por exemplo?
A produção de etanol celulósico é uma tecnologia que está evoluindo para além da tendência de mercado e da venda do produto em si. Se analisarmos o histórico de capacidade instalada de diversas indústrias de tecnologia limpa desde os anos 1990, veremos claramente que há um padrão de desenvolvimento: essas indústrias incluem produção de etanol a partir de amidos, gás de xisto, energia solar e eólica.
Todas elas começaram com um desenvolvimento tímido e gradual por um período de cinco a dez anos, com redução de Capex em torno de 60-80, para depois experimentarem uma fase de rápido crescimento, que, visto em retrospectiva, é bastante claro. O que temos que considerar é que vários fatores devem estar reunidos, e, então, a indústria cresce. Analistas da Gartner Consultores, empresa especializada em pesquisas de tecnologias, publicaram um estudo onde criaram um modelo que chamaram de hype cycle, ou ciclo de tendências, que demonstra como tecnologias evoluem e saem da categoria tendência para se tornarem prioridade, ou projeto real na indústria. E adivinhem? A evolução de tecnologias limpas segue esse padrão.
Tendo isso em mente, você pode se perguntar em qual estágio de desenvolvimento está o etanol celulósico. A nosso ver, o gatilho tecnológico na corrida pelo etanol celulósico foi disparado entre 2007 e 2010, com o desenvolvimento e o lançamento de novas enzimas e leveduras, com as primeiras plantas piloto que demonstraram resultados promissores. Ao mesmo tempo, a alta nos preços do petróleo e as recentes crises financeiras também acentuaram a necessidade do estabelecimento de uma indústria de biocombustíveis sustentável, capaz de gerar empregos e em sintonia com as demandas de preservação ambiental e metas climáticas.
A fase pós 2010, até o primeiro semestre de 2014, foi seguida pelo que chamamos de “pico de expectativas exageradas”, caracterizado por um forte fluxo de capital, que permitiu a construção das primeiras usinas de etanol celulósico e que incentivou diversos programas de pesquisa e desenvolvimento. Essa fase também foi marcada por um número crescente de parcerias entre empresas, debates nacionais e internacionais sobre o clima, como parte da estratégia política visando à mitigação nas emissões de carbono e à entrada em operação das primeiras unidades de etanol celulósico.
Já o segundo semestre de 2014 foi marcado por um período de desilusão face ao ceticismo com relação à tecnologia, às dificuldades de operação, às intempéries climáticas e às incertezas sobre o apoio político para os biocombustíveis, além, é claro, às turbulências macroeconômicas com oscilações dramáticas no preço do petróleo. Contudo, ao olharmos para o futuro, e considerando que o etanol celulósico saiu da categoria “tendência” para a categoria “realidade”, conforme raciocínio dos consultores da Gartner, é plausível dizer que podemos esperar uma onda de usinas de segunda geração operando de maneira consistente, em diversas regiões, e utilizando diferentes matérias-primas.
Essa fase incluirá o lançamento de biotecnologias melhoradas, que darão ganho ainda maior de produtividade e maior economia às unidades. Também veremos um ambiente político-regulatório mais estável, além do interesse revitalizado na internacionalização de fontes de energia renovável. Finalmente, em algum lugar distante no futuro, provavelmente pós 2025, alcançaremos o modelo que a consultoria Gartner chama de "platô de produtividade", em que os combustíveis de base biológica e bioprodutos alcançarão competividade e paridade de custo com o combustível e os produtos de origem fóssil, substituindo-os, cada vez mais, na matriz produtiva de combustíveis e químicos.
Em função de todos esses argumentos, o importante é que o mercado não se prenda às fases mais difíceis da indústria de segunda geração – como descrito anteriormente –, pois o platô de produtividade está próximo. O importante é termos em mente que o atual momento do etanol celulósico faz parte de um ciclo de desenvolvimento absolutamente normal de uma indústria de tecnologia limpa e disruptiva.