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Décio Michellis Junior

Assessor da Vice-presidência de Meio Ambiente da Rede Energia

Op-AA-22

Bioeletricidade: a fusão de dois mundos

Os núcleos de duas galáxias em processo de fusão podem ser vistos na imagem em destaque. A brilhante cauda azulada, que surge no meio das duas, é composta de várias estrelas recém-nascidas. Essa é a imagem que se tem atualmente da ARP-274, do grupo de galáxias NGC 5679, cujas forças gravitacionais estão levando uma de encontro às outras. As galáxias estão começando a interagir.

A maior parte de suas espirais ainda está intacta, mas há evidência de que nuvens de gás dentro de cada uma formam um enorme número de novas estrelas e de agrupamentos de estrelas, além de muita poeira.
Similarmente, na matriz energética brasileira, dois mundos estão próximos de um processo de fusão:

a. o setor de açúcar e álcool: 16,4% da matriz energética, em 2008, consolidou a segunda posição entre as principais fontes de energia primária no Brasil, atrás apenas do petróleo e seus derivados;
b. o setor elétrico nacional: 13,8% da matriz energética em 2008. A estrela recém-nascida é a bioeletricidade da cana: menos de 4,8% da matriz elétrica nacional em 2008, com promessa de ativar forças gravitacionais que estão levando esses dois mundos um de encontro ao outro.


O primeiro (biomassa), focado no mercado nacional e internacional; o segundo, majoritariamente no nacional. São negócios diferentes: commodities versus infraestrutura. Têm clientes e riscos diferentes. Seus processos produtivos têm forte relação entre açúcar e álcool e cogeração. Os níveis de investimento e respectivas receitas são heterogêneos.

A cada dia que passa, novas oportunidades são abertas, com projetos competitivos e com tecnologia nacional que tendem a avançar em eficiência. Novos negócios são desenvolvidos na indústria da cogeração de energia - em toda a cadeia, com introdução de novas tecnologias. A questão de segurança energética (ampliando o uso de fontes renováveis, menos poluente e menos suscetível às crises internacionais) e a agroenergia se transformaram em um novo paradigma agrícola mundial.

Incentivos regulatórios e benefícios fiscais proporcionam tarifas competitivas para a bioeletricidade. A procura por projetos está mais aquecida com investimentos de longo prazo e capital estrangeiro vinculador a TIR adequadas. Estabilidade econômica, regulatória e política garantindo as metas suporta investidores de diferentes tamanhos.
Cresce a confiança na comercialização nos dois ambientes de comercialização no Brasil:

a. ACL - Ambiente de Contratação Livre: venda no mercado livre, incentivado ou autoprodução, e
b. ACR - Ambiente de Contratação Regulada: venda nos leilões públicos do mercado regulado.

Porém, além das novas estrelas no cenário energético, sobra muita poeira: demandam novas políticas públicas que garantam que a atual tendência de matriz limpa não vai mudar em função do Pré-Sal, com estímulo para maior uso do gás natural, deixando o setor sucroenergético em uma posição desconfortável.

Permanecem os desafios ambientais de aumento de eficiência de produtividade, tecnologias poupadoras de insumos e de eliminação ou mitigação de impacto ambiental, com aproveitamento integral da energia da planta de cana-de-açúcar, com a mesma área plantada.
O desenvolvimento da geração da biomassa depende das políticas do governo: programa de leilões periódicos, conexões, incentivos, financiamentos. Novas estrelas estão surgindo, com elevado potencial remanescente para geração de eletricidade, principalmente decorrente da utilização de novas tecnologias - resíduos agrícolas, florestais e madeireiros, pínus, eucalipto, capim elefante, etc.

A geração elétrica com biomassa residual requer criterioso gerenciamento dos riscos de indisponibilidade do combustível. Maior credibilidade por parte da classe industrial deverá carrear investimentos de longa maturação na bioeletricidade. O crescimento do uso energético da cana, associado à energia hidráulica na matriz energética brasileira, sustenta, no longo prazo, uma proporção de fontes renováveis que a coloca entre as mais limpas do mundo. Mais do que uma união estável entre o setor de açúcar e álcool com o setor de energia elétrica, a bioeletricidade da cana molda um novo cenário na matriz energética nacional.