Embaixador dos Países Baixos no Brasil
Op-AA-12
No momento, os biocombustíveis são populares por várias razões: são renováveis; limpos e emitem menos CO2 para a atmosfera que os combustíveis fósseis; podem diminuir a pressão sobre a demanda de combustíveis fósseis, e podem diminuir os custos da importação de petróleo e gás e até mesmo gerar rendas provenientes de exportação.
A União Européia (UE) e os Estados Unidos (EUA) têm planos ambiciosos. A UE adotou diretrizes, obrigando a adição de 2% de biocombustíveis na gasolina em 2007, de 5,75% em 2010, atingindo, em 2020, a mistura de 10%. Alguns países membros querem ir mais longe, ou mais rapidamente. Os EUA querem dobrar o seu consumo de biocombustível de 17,5 bilhões de litros ao ano e almejam uma adição de 15%, em 2017.
Os EUA e o Brasil são os maiores produtores de etanol combustível. Na atual situação da tecnologia, a cana-de-açúcar é, sem dúvida, a melhor matéria-prima para isso. A produção de etanol a partir de milho, feita pelos EUA, é menos eficiente, tanto no volume de etanol obtido, quanto na energia gasta em sua produção.
A situação da produção do biodiesel é um pouco diferente, pois pode ser produzido, com a tecnologia atual, em grande escala, a partir de uma grande variedade de vegetais, como a colza e a soja. A produção a partir de colza, muito cultivada na UE, é mais eficiente que a partir da soja. O Brasil estaria em desvantagem se a UE não tivesse a limitação de terras agrícolas disponíveis.
Por enquanto, o mercado mundial ainda está sujeito a taxas de importação de, nomeadamente, UE e EUA. Os EUA cobram uma taxa de U$ 0,54 por galão, ou seja, U$ 0,14 por litro de etanol. A UE cobra, aproximadamente, a mesma taxa: 0,10 Euros por litro, (ou seja, US$ 0,13 por litro). A diferença é que quase não há produção de etanol na UE e que devido às porcentagens crescentes e obrigatórias da mistura do combustível fóssil com etanol, a UE será, portanto, obrigada a importar etanol, independente do valor da taxa.
Isto oferece boas chances para o Brasil. De seu lado, o porto de Roterdã, está preparado para importar grandes quantidades de etanol. Uma indagação interessante é se as taxas de importação serão mantidas por muito tempo, já que se parte do ponto de vista de que os biocombustíveis são produtos agrícolas para os quais muitos países, além da UE e EUA, protegem os seus mercados.
Porém, se os biocombustíveis forem vistos como combustíveis, da mesma forma que o petróleo e o gás, a taxa de importação perde o sentido, ainda mais se os governos quiserem estimular o seu uso. No mercado de biocombustíveis há um número muito maior de produtores, comerciantes e importadores, do que no caso dos combustíveis fósseis, produzidos, comercializados e vendidos, por algumas dezenas de grandes empresas.
Pelas normas da UE, as grandes empresas de petróleo estão livres para adquirir o biocombustível a ser misturado no combustível fóssil, no mercado local, do Brasil ou de qualquer outro país. O resultado disso não pode ser previsto. O desenvolvimento da tecnologia e os mercados estão em grande movimento. Muito dependerá dos preços do petróleo, dos biocombustíveis no mercado mundial e também das taxas de importação, cobradas por grandes países consumidores, como os EUA, UE, Japão e, em breve, China e Índia.
Mesmo assim, devem ser feitas algumas observações preocupantes, tanto em escala mundial, quanto em relação ao Brasil. A produção de biocombustíveis exige enormes extensões de terra. Um economista neerlandes calculou que toda a terra adequada para a agricultura no mundo não seria capaz de produzir nem um quarto das necessidades energéticas do planeta.
Os biocombustíveis, portanto, não são uma solução milagrosa para atender à necessidade mundial de energia. E uma produção em larga escala de biocombustíveis traz consigo certos riscos. Biocombustíveis e alimentos são concorrentes, pois demandam grande superfície de terra. Conseqüentemente, uma grande demanda de biocombustíveis poderá aumentar os preços dos alimentos, como aconteceu com o milho, nos Estados Unidos.
A América Latina exporta muita soja para a Europa e os EUA, onde é usada como ração animal, e também para a China, onde é usada para o consumo humano. Uma produção em grande escala de biodiesel a partir da soja poderia aumentar o preço mundial deste produto. No Brasil, podemos aumentar a produção da cana, da soja, e outros, porque há ainda muita terra nova a ser usada para a produção dessas culturas, especialmente no Centro-Oeste. São terras onde ainda resta cerrado, onde é praticada uma pecuária extensiva. Além disso, há partes da Amazônia adequadas para a produção de soja.
A questão é se ficará nisso. Provavelmente não. Não pode ser esquecido que o Brasil está produzindo, anualmente, 17,5 bilhões de litros de biocombustíveis e que somente 3 bilhões de litros são exportados. Uma grande demanda do exterior levará, portanto, a uma enorme pressão, no sentido de aumentar ainda mais a produção. Se a pecuária extensiva no Brasil Central for suplantada pela agricultura em grande escala, essa pecuária provavelmente não acabará, mas poderá se mudar para a Amazônia, onde a terra talvez não seja tão adequada para a agricultura, mas é para a pecuária.
A tese de que os biocombustíveis sejam tão benéficos para o meio ambiente, por serem renováveis e limpos, deve ser revista neste aspecto. Entendimentos sobre uma produção sustentável de soja e biocombustíveis são de grande importância. Nos Países Baixos há muita pesquisa sobre a produção de biocombustíveis, a partir de resíduos de trigo, milho, etc., não adequados para o consumo. São os chamados biocombustíveis da segunda geração. Isso não gera concorrência com a produção de alimentos e diminui a necessidade de aumento das terras agrícolas para a produção de biocombustíveis.
De qualquer modo, para mim está claro que, apesar dos biocombustíveis poderem contribuir para a diversificação do fornecimento de energia e diminuir a demanda por combustíveis fósseis, ainda não são a solução definitiva para a necessidade de energia no futuro. Para isso, teremos de pesquisar fontes energéticas completamente diferentes, como a energia solar, a fusão nuclear, e isto já vem acontecendo. Temos que ter cuidado para que no período de transição, a demanda por biocombustíveis não provoque concorrência com a provisão mundial de alimentos e não sacrifique valiosas extensões da natureza.