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Dib Nunes Junior

Diretor do Grupo IDEA

OpAA76

Solo vivo: o segredo da alta produtividade
Quer melhorar sua produtividade agrícola? 
 
Então, comece mudando os procedimentos em relação ao seu solo. Cuide dele com muito carinho, pense em todas as práticas de preparo e conservação que for realizar e sempre adote procedimentos que devolvam ou preservem a sua  vida existente nele. Solo vivo é solo produtivo.
 
Como podemos transformar o solo num organismo vivo onde as plantas se desenvolvem melhor? O que fazer para que as raízes aproveitem melhor os nutrientes e a água do solo? 

Nossos solos, há décadas vem sendo castigados por sucessivas colheitas e movimento de máquinas pesadas, desde o seu preparo até a colheita, além de uso de diversos produtos químicos sem a mínima preocupação com a sua fração biológica. Os solos tropicais perdem a matéria orgânica rapidamente. Quanto mais se trabalha com arações, gradagens, equipamentos destruidores de soqueiras, queimadas, entre outros, mais rápidas são as perdas. Solo sem matéria orgânica é pobre em microrganismos e em trocas de nutrientes entre a planta e as micelas de argila; solos assim são pouco produtivos.

Para iniciar, vou lhes contar uma passagem inesquecível que marcou minha carreira: No início da década de 90, recebi um chamado de um proprietário de uma grande usina, que após ler uma reportagem sobre as pesquisas da Dra. Joana Döhbereiner sobre a identificação e o isolamento de bactérias fixadoras de nitrogênio diretamente pela cana-de-açúcar, publicada no antigo Suplemento Agrícola do jornal O Estado de São Paulo, demonstrou interesse em adquirir essa tecnologia. A intenção era montar uma produção em grande escala desses microrganismos, visando alcançar o mercado de cana, milho, arroz, sorgo e outras gramíneas produtoras de grãos (uma visão futurista que se concretiza agora). 

Esse empresário vislumbrou esse novo mercado e uma nova agricultura com extraordinários resultados econômicos e ambientais, pretendendo a substituição de grande parte do N das fontes químicas por bactérias fixadoras de nitrogênio do gênero Azotobacter, dentre outros gêneros, diretamente nas raízes das gramíneas em geral. 
 
Ele solicitou que fizéssemos contato com a pesquisadora e lhe apresentasse uma tentadora proposta para adquirir a nova tecnologia com exclusividade. E lá fui eu ao encontro da Dra. Joana no Rio de Janeiro, onde ela realizava suas pesquisas. Sabem qual foi a resposta que recebi?

Foi algo como: “Meu filho, não é necessário montar nenhum laboratório nem isolar estes microrganismos porque eles já existem em seu solo e já se encontram presentes na natureza. Você pode ativá-los, bastando apenas realizar algumas práticas simples, como por exemplo, evitar a compactação dos solos e estimular os microrganismos com aplicações de fósforo e cálcio – o que você já faz –, além de enriquecer a terra com materiais orgânicos oriundos de restos de cultura, resíduos da usina ou dejetos de animais, mas tudo isso só será possível se houver o arejamento do solo e a umidade suficiente. Agradeça seu patrão e diga a ele que me senti honrada com o convite, mas não posso aceitar a proposta, pois a descoberta que fizemos pertence à humanidade” - disse-me ao encerrar a conversa.
 
Voltei para casa tão animado quanto fui,  porém, com mil ideias novas na cabeça para fazer um correto manejo dos solos. As palavras daquela sábia senhora mexeram comigo e fiquei por muito tempo meditando nelas e no desconhecido mundo de um solo vivo. 
 
Passei, desde então, a tentar entender um pouco mais sobre qual seria o papel dos microrganismos na reconstrução da fertilidade do solo e nas suas interações com a planta. Como tudo isso poderia melhorar a produtividade das culturas em geral? 
 
Foi o início de minha transformação profissional como engenheiro agrônomo. Percebi que meus mestres ensinaram, e muito bem, diga-se de passagem, o fundamental sobre a química e a física dos solos, mas me faltava mais informações sobre a biologia do solo. 
 
Depois disso, os trabalhos realizados por nossa consultoria agronômica renderam ótimos resultados na reconstrução da fertilidade natural dos solos, elevando sua potencialidade produtiva, principalmente, em solos mais pobres em nutrientes ou depauperados, levando em consideração o conjunto desses três componentes. 
 
Nos últimos 30 anos, tudo isso tomou grande proporção e deu origem ao que chamamos de Manejo Biológico do Solo, o qual se tornou tecnologia obrigatória da nova agricultura e  fez surgir um promissor mercado de insumos agrícolas, cujo crescimento é superior a 30% ao ano. 

Os agricultores, atualmente, têm à disposição dezenas de microrganismos, como fungos e bactérias isoladas e testadas em laboratório, além de produtos ativadores de desenvolvimento radicular e substratos orgânicos prontos para melhorar a fertilidade do solo, como os ácidos húmicos e fulgicos. 

Um casamento perfeito de produtos orgânicos e microrganismos pode contribuir significativamente para o desenvolvimento das plantas. Com mais atividade biológica, o solo se tornará mais bem estruturado, favorecendo a formação de raízes, a absorção e a retenção de água e de nutrientes.  

Em solos bem estruturados e até grumosos, esses microrganismos se multiplicam e se fixam ao redor das raízes da cana, formando as conhecidas micorrizas, em uma perfeita relação de simbiose. Nessas condições, as raízes se desenvolvem bem melhor e liberam exsudatos importantes para a vida desses micro seres, que por sua vez, devolvem o “favor”, aumentando a absorção de nutrientes. A intensidade desses efeitos depende das condições ambientais e de nutrientes pré-existentes ou aplicados ao solo.
 
Para ativar esse mundo extremamente complexo, formado de milhões de microrganismos que vivem na terra e criar uma perfeita associação entre esses seres e as plantas, é necessário realizar um manejo adequado ao nosso clima e pensar em reposição da vida no solo.
 
Existem no solo inúmeras espécies de microrganismos benéficos que têm importante atuação no controle de pragas e na decomposição de restos vegetais deixados no campo. Os mais conhecidos e que já estão sendo utilizados em grande escala são: bacillus subtilis, azospirillum brasiliense, bacillus megaterion, além dos já familiares bacillus thurigiensis, beauveria bassiana e o metarhizium anisopliae.
 
Muitos bioinsumos (produtos biológicos usados na agricultura) surgiram ultimamente, e hoje são aplicados em vários estágios da cultura. Na produção canavieira, essa nova tecnologia está sendo cada vez mais utilizada, juntamente com fosfatagens, calagens em profundidade, uso de resíduos industriais e da criação de animais. Aos poucos, os produtos organominerais estão sendo redescobertos pelos agricultores para substituir  parte da tradicional adubação química. 
 
Como ilustração, vale a pena citar que no início da década de 80, estudei, praticamente de forma pioneira, em minha tese de mestrado, os efeitos da torta de filtro (que até então era descartada pela maioria das usinas) sobre vinte variedades e os resultados foram fantásticos.  
 
Com 25 toneladas de torta de filtro úmida in natura por hectare (fonte de material orgânico), aplicados no sulco de plantio, em solo do tipo areias quartzosas – classificação da época – hoje neossolos, observamos ganhos médios de 12 toneladas por hectare, por corte, em três cortes consecutivos, quando comparado ao tratamento sem torta de filtro, só com adubos químicos. Dezenas de ensaios surgiram depois disso e o seu uso está cada vez mais aprimorado, com várias novas tecnologias agregadas.
 
Nunca foi tão importante o uso de matéria orgânica junto com os bioinsumos para devolver a vida ao solo. A torta de filtro, por exemplo, colocada no sulco de plantio, aumenta a atividade microbiana e traz resultados melhores do que quando colocada sobre a linha da soqueira, onde grande parte se decompõe rapidamente, liberando gás carbônico para a atmosfera. 
 
Portanto, no início dos anos 80, mesmo que de forma tímida, esses trabalhos sinalizaram que estavam surgindo uma nova agricultura e um novo manejo para elevação da fertilidade do solo e da produtividade agrícola. Atualmente, essa  tecnologia está se consolidando e deve crescer muito ainda. E anotem aí: não tem volta.