Me chame no WhatsApp Agora!

Ana Paula Malvestio

Sócia da PricewaterhouseCoopers

Op-AA-34

Sob o olhar de diferentes desafios e interesses, resta-nos inovar

O setor sucroenergético passa, hoje, por mais um de seus momentos delicados na história, daqueles que, certamente, será lembrado quando tudo tiver passado... e, com certeza, passará. Uma situação que começou nos meados da crise financeira mundial em 2009 e se delonga pelos dias de hoje, parecendo não ter uma solução próxima à vista.

Iniciado por problemas financeiros advindos da crise, como falta de crédito, associada com alto índice de alavancagem nas usinas, com consequente paralisação dos investimentos, esse ciclo tem mostrado seus efeitos nas safras atuais, nas quais, pela primeira vez em 10 anos, tivemos uma quebra na produção de cana-de-açúcar.

Esse fenômeno, causado não só por fatores climáticos, mas, principalmente, pela falta de investimentos voltados ao incremento da produtividade, resultou em aumento dos custos de produção. Aproximamo-nos do fim da safra 2012/2013, e muito se discute o que precisa ser feito para a retomada do crescimento do setor e qual seria a participação de cada stakeholder nesse processo, especialmente, governo, fornecedores de cana e produtores.

O último relatório de safras da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) apontou um aumento de apenas 4% da produtividade nos canaviais em relação à safra passada. Colhemos, hoje, 70 toneladas de cana por hectare, número bem aquém do considerado razoável por especialistas que apontam 85 toneladas/hectare como uma quantidade plausível.


Por outro lado, dados de bancos de investimentos e consultorias apontam uma ligeira retomada de investimentos no setor, especialmente na renovação de canaviais e expansão de área. Atualmente, plantamos cana em 8,5 milhões de hectares, cerca de 200 mil hectares a mais do que na última safra.

Vemos, nessa conjuntura, as usinas, gradativamente, fazendo a sua parte, ainda que fatores climáticos continuem interferindo na produtividade. Os fornecedores de cana, assim como parceiros e arrendatários, por sua vez, também demonstram forte engajamento com o setor na busca pelo aumento da produtividade.

No âmbito governamental, vimos que a redução da adição de etanol à gasolina, em outubro do ano passado, interferiu não somente na demanda nacional por etanol, mas também na gestão da produção das usinas como um todo, e a demora no anúncio da retomada da proporção dos 25% pode trazer ainda mais dificuldades, vista a necessidade de definição do planejamento da próxima safra.

Segundo analistas, a volta do nível de adição do etanol à gasolina, além da tão almejada mudança na política de congelamento de preços do petróleo, estimularia todos os elos envolvidos na cadeia para a retomada do crescimento do setor, que, comprometidos com tal missão de recuperar a confiança e a credibilidade depositada, não mediriam esforços para isso.

Uma sinalização dessas, além de garantir o melhor planejamento da produção, fato gerador da estabilidade de preços para os produtos da cana que tanto se é almejada, garantiria a previsibilidade e a estabilidade do ambiente produtivo, abrindo-se as portas para novos investimentos que poderão movimentar o setor, que almeja chegar a 1,2 bilhão de toneladas de cana-de-açúcar em 2020. O fato é que se trata de temas estratégicos, que têm sido colocados no centro de várias discussões entre o setor e o governo e, talvez, tenham se tornado o marco desse ciclo, assim como os temas da desoneração tributária do etanol frente à gasolina e a estabilidade (e viabilidade) de preços, com políticas de incentivos à formação de estoques, leilões diferenciados para energia de biomassa, entre outros.

Contudo, ambos os lados encontram dificuldade para lidar com as demandas de seus interessados. De um lado, o setor sucroenergético busca construir uma opinião em comum entre fornecedores de cana, empresas de insumos, associações de trabalhadores, indústria de base e usinas.

De outro, o governo tenta encontrar possíveis soluções que atendam ao setor e mantenham a estabilidade política e econômica. Esse cenário de aparentes divergências e múltiplos interesses, porém, não nos impede de encontrar uma opinião e uma ação comum entre todos os envolvidos nessa empreitada, valendo destacar:

• Adoção de medidas para equacionar o endividamento, que chega a R$ 42 bilhões, tendo aumentado na última safra para 3,7%, segundo o banco Itaú BBA, se fazem necessárias;

• Resgate do potencial produtivo da indústria de base;

• Preparo da indústria de insumos para suprir a demanda de fertilizantes, defensivos e maquinários; e

• Busca pela eficiência e produtividade.

Para tanto, inovar se faz necessário. Muito já se fala em etanol de segunda geração, plástico de cana e cana transgênica, mas vale a pena destacar outras inovações que as empresas têm em suas mãos. Sob a forma de gestão, podemos inovar na área agrícola, fazendo um efetivo acompanhamento de custos, produtividade, expansão de área.

Já na área industrial, a melhoria de processos e a adoção das melhores práticas de governança corporativa garantem confiabilidade no processo, otimização da produção e gestão mais transparente. E, na área comercial, a tão necessária melhoria na logística, no setor de compras e estoques estratégicos, citando aqui os mais relevantes.

A inovação pode vir pela formalização de parcerias estratégicas entre os elos dessa cadeia, podendo ser, inclusive, o caminho para atingir os demais desafios mencionados, com a obtenção certa de ganhos mútuos. Essas são apenas algumas reflexões para aqueles que acreditam na indústria da cana-de-açúcar no Brasil e que creem que o crescimento do País está baseado também no crescimento desse setor.
Enfim, a palavra de ordem é inovação!