A mudança constante é um fato inevitável, não há como ignorá-la. A única certeza que podemos ter é a de que tudo vai mudar e, portanto, em nossa empresa, em nossa comunidade e em nossa família, temos que estar preparados para ela. A mudança ocorre em nossa sociedade de forma cada vez mais rápida.
Entramos no século I andando a cavalo e terminamos o século XIX da mesma forma. Entretanto, 69 anos depois estávamos pisando na lua. De lá para cá, a velocidade das mudanças só aumentou. Internet, telefonia celular, big data e inteligência artificial são coisas que só eram imaginadas nos melhores filmes de ficção cientifica. Esse fato, por si só, faz com que as decisões estratégicas se tornem cada vez mais difíceis. Tendências globais podem mudar, repentinamente, e novas tecnologias podem impactar, violentamente, os negócios.
A solução para sobreviver nesse mundo VICA (volátil, incerto, complexo e ambíguo) é a qualidade das tomadas de decisão. Boas tomadas de decisão, como veremos, só são possíveis quando analisamos corretamente os riscos e oportunidades, de forma ampla e plural, no contexto de cada empresa. O setor sucroenergético, de forma geral, tende a se beneficiar das macrotendências globais.
O mundo tende a acelerar compromissos climáticos, visando à redução da emissão de gases do efeito estufa, o que, obviamente, beneficia os biocombustíveis, em especial, o etanol. Pelas informações disponíveis, o etanol é a melhor matéria-prima para novas rotas energéticas, como o SAF, combustível sustentável de aviação, e a célula de hidrogênio, como propulsora de veículos leves urbanos. Segundo projeções, a população mundial deve continuar crescendo até 2100, o que, aliado à forte urbanização (estima-se que, em 2050, 70% da população do mundo viva em cidades), aumenta a demanda por alimentos, entre os quais o açúcar. Tal crescimento, também puxa a demanda de energia, para qual tanto o etanol quanto a biomassa podem ser parte da solução.
Por outro lado, algumas ameaças se fazem, também, presentes, entre as quais estão: o eterno dilema da competição entre uso da terra para produção de alimentos e outros fins; o surgimento de tecnologias disruptivas concorrentes; um possível retrocesso na globalização devido ao aumento do protecionismo; e uma tendência do consumidor de beneficiar produtos locais.
Tudo isso, sem considerar mudanças geopolíticas relevantes, as quais podem alterar a cadeia de suprimentos e priorizar interesses estratégicos domésticos em detrimento de soluções tecnicamente mais viáveis.
Soma-se a essas ameaças, a vontade do consumidor. Esse sujeito, nem sempre, opta pelo melhor produto comprovado. As decisões individuais nem sempre são racionais. As pessoas, na maioria das vezes, não consomem com o cérebro, mas com o coração. Por que comprar uma bolsa Louis Vuitton, se outra mais barata cumpre a mesma função? Por que comprar um carro elétrico?
Recentemente, em um evento, ouvi um palestrante declarar que “quem compra um carro elétrico não o troca mais por veículo a combustão”. Não importa provarmos que o etanol é mais sustentável, que é a solução para o Brasil devido as suas dimensões continentais, etc.
O que importa é a percepção de valor por parte do consumidor, seja pela maior potência do motor, pelo silêncio ou por outra característica qualquer. Quando questionado sobre a infraestrutura necessária, o palestrante nos lembrou que no início da telefonia celular, também, não tínhamos infraestrutura alguma, e que a demanda forçou o rápido investimento. Fiquei chocado. Me toquei que talvez não tivesse olhado a situação por todos os ângulos possíveis.
Sem juízo de valor, ou seja, sem entrar no mérito se o palestrante estivesse certo ou não, esse é apenas um exemplo que mostra que, quando tomamos decisões, temos que olhar a questão por todos os ângulos.
O problema é que, em geral, todos temos vieses, fruto de nossas crenças ou mesmo vontades. Sem perceber, tendemos a buscar aqueles argumentos que reforçam e dão um aspecto racional aos nossos pontos de vista, ignorando os argumentos em contrário. Não raro, nos expomos a um ambiente que também tende a reforçar essas visões. No mundo VICA, essa pode ser a diferença entre sobreviver ou morrer.
Outro aspecto curioso nas tomadas de decisão é que tendemos a superestimar o retorno e subestimar os riscos. Em um investimento, por exemplo, podemos acertar o valor do capex, mas é um erro comum subestimar a necessidade de capital de giro de um projeto, assim como o timing do fluxo de caixa. E timing, às vezes, é tudo. Quem não se lembra da primeira década do século, quando atrasos na liberação dos financiamentos do BNDES e atraso na entrega de equipamentos por parte das indústrias de bens de capital obrigaram usinas a atrasarem o início de sua geração de caixa em mais de um ano? Quantas dessas empresas ficaram pelo caminho por causa disso?
Portanto, a qualidade da tomada de decisões em uma instituição é fundamental para garantir sua performance e perpetuidade. Uma empresa com governança robusta, que tenha um conselho de administração atuante, com atribuições bem definidas e diversidade entre seus membros, tende a tomar decisões melhores do que aquelas em que a decisão é monocrática. No passado, uma só pessoa podia armazenar conhecimento suficiente para tomar decisões vitoriosas.
Em um mundo como o de hoje, isso é praticamente impossível. É preciso ter nas corporações pessoas que pensem diferente, que tenham formação diferente e que tragam o contraditório. É preciso ouvir o contraditório, mesmo que isso nos incomode.
Uma forma eficiente de obter isso é contratar conselheiros independentes, profissionais cuja experiência em outras áreas possa contribuir de forma relevante para a organização. Note que há uma diferença entre conselheiro independente e conselheiro externo. O conselheiro externo, embora venha de fora, pode representar um sócio ou um grupo de sócios. O conselheiro independente é aquele que representa os interesses da empresa (performance e perpetuidade) e, portanto, não deve ter nenhum conflito de interesse para exercer seu papel.
Outra boa prática é a existência de comitês que possam assessorar a direção da empresa e o conselho, em especial: comitê de auditoria, comitê de recursos humanos e comitê financeiro. A existência de comitês permite que seus membros se debrucem sobre assuntos mais específicos. Esses comitês também podem contar com especialistas externos.
Como vimos, o setor sucroenergético tende a se beneficiar das macrotendências globais, no entanto, o futuro nunca é garantido. É fundamental que as instituições, sejam elas governo, associações ou empresas, exercitem constantemente o trabalho de análise, não só das oportunidades geradas por essas tendências, mas também dos riscos, bem como de seus mitigantes. A boa governança permite que as decisões tomadas com base nessas análises sejam mais exitosas.